Quem é o autor do livro de Isaías?

Os Jogos Olímpicos, Miguel Ângelo e Rafael mergulham-nos na beleza do livro de Isaías… Mas quem é o seu autor?

Os Jogos Olímpicos, Miguel Ângelo e Rafael mergulham-nos na beleza do livro de Isaías… Mas quem é o seu autor?

1. Como mel para a boca

O filme Momentos de glória (Chariots of Fire), de 1981 e que recebeu vários Óscares em 1982, coloca um texto de Isaías no centro do seu argumento:

Para além de ser pastor, Eric Liddel é um atleta inigualável. Ele participa nos Jogos Olímpicos de 1924. Quando a corrida dos 100 metros calha a um Domingo, este campeão recusa-se a participar nela e dirige-se à igreja escocesa de Paris, onde proclama um texto de Isaías (40,15), que esclarece o seu próprio destino.

 


2. Um texto bíblico

Esta semana apresentamo-vos dois textos do livro do profeta Isaías:

Visão de Isaías, filho de Amós, acerca dos habitantes de Judá e Jerusalém no tempo de Uzias, de Jotam, de Acaz e de Ezequias, reis de Judá.

Ouvi, ó céus, e escuta, ó terra, porque é o SENHOR quem te fala: «Criei filhos e fi-los crescer,
mas eles revoltaram-se contra mim.»

Isaías 1,1-2

Eis o que diz o SENHOR a Ciro, seu ungido, a quem tomei pela mão direita: «Vou derrubar as nações diante de ti, desatar o cinturão dos reis, abrir-te as portas da cidade, sem que nenhuma te seja fechada. (…)

Eu é que o suscitei para a justiça e aplanarei todos os seus caminhos. Ele reconstruirá a minha cidade e libertará os meus desterrados, sem nada exigir como recompensa ou suborno.» É o SENHOR do universo que o declara.

Isaías 45,1.13


3. O esclarecimento

Há umas semanas falámos da possibilidade de traduzir a Bíblia. Este Domingo continuamos o nosso making-of da Bíblia, procurando responder a uma nova questão: como é que a Bíblia foi escrita?

 

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Marc Chagall (1887-1985), O profeta Isaías (1968), Museu da Mensagem Bíblica, Nice, França.

Tornemos ao livro de Isaías. Espontaneamente pensamos que, se se chama «livro de Isaías», é porque foi escrito pelo profeta que tem esse nome.

Isaías viveu em Jerusalém no oitavo século antes de Cristo e foi contemporâneo de Uzias, rei de Judá, como o testemunha o nosso primeiro texto. Já o segundo texto, retirado também do livro de Isaías, relata acontecimentos que tiveram lugar dois séculos mais tarde, na época do regresso do exílio de Babilónia sob o rei persa Ciro. Consequentemente:

  • ou o profeta viveu vários séculos;
  • ou então Isaías não é o único autor do livro que tem o seu nome!

 

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Miguel Ângelo (1475-1564), Isaías (1509), Capela Sistina, Vaticano.

Com estes dois excertos, encontramos um fenómeno bastante recorrente na Bíblia: um texto escrito uma primeira vez é relido pelas gerações seguintes, que o aprofundam e o reescrevem, integrando no texto acontecimentos históricos de que elas próprias são testemunhas. Esta pluralidade de escritores não fere a unidade do conjunto, manifestada, por exemplo, numa certa constância das imagens e dos temas principais ao longo de vários séculos. Dada esta unidade de inspiração, o conjunto é colocado sob a autoridade de um único autor: neste caso, Isaías.

Ao longo da História sagrada, cada geração fez eco da Palavra divina. Ao passo que os escribas inspirados preservam a pureza dos textos que repercutem estes ecos, o povo de Deus esforça-se por os perceber também na vida das pessoas, nos acontecimentos históricos. É por isto que os textos sagrados são transmitidos, não como “letra morta”, mas como “textos vivos”, que evoluem até à última etapa da revelação.

 

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Rafael (1598-1664), O profeta Isaías (1511-1512) Basílica de Santo Agostinho, Roma, Itália.

4. E ainda uma palavra final…

O processo de redacção da Bíblica, esta memória interrogada e renovada incessantemente, esta revelação de Deus na História, fala-nos da relação profunda entre o passado, o presente e o futuro. Ouçamos Hélie de Saint Marc:

«O passado ilumina o presente,
que contém em si mesmo o essencial do futuro.
No decorrer dos tempos e na sucessão dos homens,
não há actos isolados, destinos isolados.
Tudo se relaciona.
É preciso acreditar na força do passado,
no peso dos mortos, no sangue
e na memória dos homens.»

Hélie de Saint-Marc

Discurso na entrega das suas insígnias de Grande Oficial da ordem da Legião de Honra

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.


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