Hoje quero falar-vos sobre dois projetos

Entender o silêncio na escuta… onde se alcança o sentido da vida e a revelação do Amor. Maravilharmo-nos com a promessa de um nascimento revelado.

O primeiro decorreu no mês de outubro.

Ao iniciar um processo que desafia a participação das pessoas, é preciso aceitar o inesperado, quer no trajeto quer no lugar a que se chega.

Na última crónica de outubro, referi ter-me arriscado a lançar um projeto criativo entre vizinhos e amigos integrado na Jornada da Memória e da Esperança. A Jornada foi proposta como um momento de recordação das vítimas da covid-19, memória de tudo o que de difícil e de bom vivemos durante os tempos mais excecionais da pandemia e de afirmação da esperança numa sociedade mais justa e mais solidária. A iniciativa teve lugar no fim-de-semana 22, 23 e 24 de outubro e nesses dias realizaram-se comoventes ações em escolas, coletividades, instituições e em espaços públicos.

O meu/nosso projeto consistiu na realização, por um conjunto de amigos e vizinhos, da pintura de uma grande faixa sobre pano de lençol antigo que reutilizámos para esta iniciativa.

A pintura a diferentes cores lembra simbolicamente os que morreram, mas também tantos a quem gostaríamos de agradecer a dedicação no cuidar e no modo como nos ajudaram a voltar aos abraços.

Mais de 50 pessoas participaram neste projeto. Uns doaram materiais, outros pintaram, uns inscreveram nomes, outros divulgaram a iniciativa e convidaram amigos a nela participarem.

A Faixa esteve exposta em iniciativas apoiadas pela Freguesia de Campo de Ourique e também noutras de âmbito mais alargado.

As imagens mostram melhor o resultado do projeto.

Este foi um projeto que envolveu o coração de quem participou e tocou o de quem olhou a faixa com atenção.

Na ausência de Luz, são os mais humildes que vêm. E com eles o anúncio, a promessa torna-se realidade.

O outro projeto é uma promessa, um tempo de Advento.

A espera ativa abre-nos à esperança de novos tempos

Soube muito recentemente que uma proposta de desenvolvimento de atividades criativas e de formação para a autonomia, numa comunidade com o estigma da exclusão, obteve, finalmente, apoio financeiro para o podermos concretizar. Vou fazer parte de uma larga equipa, mas já sinto o coração cheio de esperança pelo que posso dar e receber.

A área criativa que vou trabalhar é a pintura em azulejo, na qual trabalho há mais de 25 anos. O desafio é tornar o bairro mais bonito através de várias intervenções baseadas em azulejos realizados pelos seus moradores e de acordo com as suas escolhas.

Ainda sem data de nascimento marcada, é já o anúncio de um compromisso maior.

Em diálogo com este estado de alma vi o recente filme Pathos, Ethos, Logos de Joaquim Pinto e Nuno Leonel.

O filme, apresentado em três tempos, dialoga connosco sem nos dar respostas fáceis. Oferece-nos a possibilidade de contemplar.

Comtemplar a humanidade, o papel da Virgem Mãe e caminhos de procura onde encontrarmos Deus.

Aconselho a que, se puderem, o vejam. Mas como, por diversas razões, nem todos o poderão fazer, deixo-vos algumas notas que ficaram comigo.

Somos convidados a ver, procurar entender e não julgar. A revelação da transcendência não se esgota na nossa compreensão da vida.

É um caminho.

Na ausência de Luz, são os mais humildes que vêm. E com eles o anúncio, a promessa torna-se realidade.

Na solidão descobrimos o próprio eu como rugas íntimas das nossas profundezas. Sentir o vazio. Aprender a morrer.

Entender o silêncio na escuta… onde se alcança o sentido da vida e a revelação do Amor.

Maravilharmo-nos com a promessa de um nascimento revelado.

São palavras que me vão ajudar a viver este tempo de Advento no qual sei que devo preparar todo o meu ser para novos tempos de compromisso.

 

 

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.