Uma parede contra os extremismos

Garantir segurança pública sem comprometer os direitos humanos é de facto um desafio, mas também uma oportunidade para construir uma sociedade mais justa e coesa.

A propósito de uma operação policial gerou-se mais uma esdrúxula discussão em torno do tema da segurança, ordem pública, migrações e percepções. Foram horas de comentariado, manifestações e contra-manifestações com mais ou menos oportunismo político à mistura, tudo à boleia de uma imagem de pessoas encostadas à parede de mãos no ar para serem revistadas pela polícia.

Contudo, esta discussão reflete uma preocupação crescente no que diz respeito à segurança e à ordem pública. Vivemos num mundo globalizado, onde ameaças à segurança se tornam cada vez mais evidentes. Conflitos armados ativos, inclusive às portas da Europa, ajudam a criar um clima de instabilidade e incerteza.

O desafio está em encontrar um ponto de equilíbrio entre duas necessidades igualmente fundamentais: garantir a paz e a ordem pública, sem abrir mão do respeito inalienável pelos direitos humanos. Ambos são pilares essenciais de uma sociedade justa, coesa e pacífica.

O desafio está em encontrar um ponto de equilíbrio entre duas necessidades igualmente fundamentais: garantir a paz e a ordem pública, sem abrir mão do respeito inalienável pelos direitos humanos. Ambos são pilares essenciais de uma sociedade justa, coesa e pacífica.

A chave está no reforço da dignidade humana como princípio fundamental sobre o qual devem assentar todas as políticas. A segurança, no seu sentido mais amplo, é um bem comum essencial ao funcionamento da sociedade e contribui para a promoção da justiça social, sendo especialmente vital para a proteção das comunidades mais vulneráveis, frequentemente as primeiras a sofrer com a ausência de ordem e estabilidade.

Certo é que uma política de imigração desregulada protagonizada pelo anterior governo, assente no regime de manifestações de interesse, criou situações muito pouco dignas que favoreceram um crescimento, porventura demasiado rápido, de uma população migrante colocada num limbo administrativo sem memória.

Ao mesmo tempo, vemos emergir, tanto em Portugal quanto noutros contextos, um caminho perigoso que é uma tendência crescente para estigmatizar certos grupos sociais, muitas vezes minorias étnicas, em nome de uma suposta garantia de segurança. Este tipo de abordagem tende a gerar uma instabilidade social cada vez maior que alimenta ressentimentos e divisões.

Um ponto incontornável desta discussão é o de que a segurança só é legítima quando respeita a dignidade humana de todas as pessoas, incluindo aquelas que cometem crimes. Sejamos claros, o combate à criminalidade deve ser firme e assertivo, mas se for apenas repressivo, sem diálogo e sem incluir estratégias de inclusão social, corre o risco de aprofundar desigualdades e perpetuar ciclos de reincidência e violência.

As políticas de segurança precisam de ir além do ataque dos sintomas, devem também abordar as causas estruturais. O papel da solidariedade e da justiça social é central nesse esforço. Promover oportunidades reais de inclusão, fortalecer as comunidades e combater a exclusão são estratégias que não apenas previnem o crime, mas fomentam a coesão social e criam ambientes mais seguros.

Estratégias como a justiça restaurativa e a reintegração social têm-se mostrado eficazes para reduzir a reincidência criminal. Estas abordagens não apenas promovem a reabilitação, mas também priorizam o apoio e a proteção às vítimas. É igualmente crucial implementar iniciativas locais preventivas que envolvam os diversos agentes da sociedade civil, criando soluções que respeitem as necessidades específicas de cada comunidade.

Garantir segurança pública sem comprometer os direitos humanos é de facto um desafio, mas também uma oportunidade para construir uma sociedade mais justa e coesa. Como nos lembra a Doutrina Social da Igreja, o respeito pela dignidade humana deve estar no centro de todas as ações.

Promover assim uma abordagem equilibrada, humanista e que combine ordem pública e justiça social é essencial para construir um sentimento de segurança sustentável. Uma sociedade verdadeiramente segura não é aquela que exclui e estigmatiza, mas sim aquela que se compromete com a inclusão e com a solidariedade, permitindo que todos vivam com dignidade em harmonia.

Basta olhar para o contexto europeu para perceber que onde este equilíbrio não é alcançado cresce o ódio e a divisão, criando terreno fértil para o surgimento de todo o tipo de extremismos. Temos a oportunidade de seguir outro caminho e demonstrar que segurança, inclusão e direitos humanos não têm de ser opostos mas antes aliados na construção de uma sociedade mais justa e inclusiva.

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.