Berry Brazelton: Esperança, Amor e Fé (1918 – 2018)

O conhecido pediatra americano morreu no dia 13 de março. Teve um papel significativo na compreensão dos comportamentos de recém-nascidos. Aqui o testemunho de quem o conheceu de perto, Ana Teresa Brito, da Fundação Brazelton Gomes-Pedro.

O conhecido pediatra americano morreu no dia 13 de março. Teve um papel significativo na compreensão dos comportamentos de recém-nascidos. Aqui o testemunho de quem o conheceu de perto, Ana Teresa Brito, da Fundação Brazelton Gomes-Pedro.

Conheci Berry Brazelton em 2002, no Encontro Internacional “MAIS CRIANÇA”, organizado pelo Professor Gomes-Pedro, um verdadeiro mestre e maestro da nova Pediatria em Portugal. No Coliseu dos Recreios, em Lisboa, reuniram-se, então, 2500 profissionais das áreas da Saúde, Educação, Justiça, Solidariedade Social, Ciências Humanas, na esteira de um novo saber, saber-fazer e saber-ser que Gomes-Pedro, mais tarde, batizou como “Ciências do Bebé e da Família”.

O Professor Maestro trouxe, então, a Portugal os mais conceituados investigadores internacionais, que uniu a grandes investigadores e profissionais lusitanos, na construção e defesa de novos conceitos e práticas em Saúde e Educação. O grande desígnio era o de fundamentar, defender e promover um paradigma relacional de prevenção.

Neste Encontro, Berry Brazelton foi luz maior, a todos encantando com a sua forma única – profundamente generosa, envolvente, respeitosa e conhecedora – de iluminar Bebés e suas Famílias.

O Professor Gomes-Pedro – unido a Berry Brazelton desde os anos 80, num laço transatlântico de pessoas que se reconhecem no mais inteiro de si mesmas – reuniu, após o Encontro, um grupo de profissionais, que cuidadosamente elegeu, para realizar uma nova formação em Touchpoints, a primeira realizada fora dos Estados Unidos da América. Éramos duas dezenas de profissionais – pediatras, psicólogos, enfermeiros, pedopsiquiatras, terapeutas, médicos de família, educadores – a partilhar este privilégio único.

Profundamente grata e emocionada, o que mais me impressionou nesta formação foi a abertura, a simplicidade, a disponibilidade, a entrega e a vontade constante dos formadores – particularmente de Berry Brazelton – em conhecer cada criança e em ir ao encontro das famílias, em se centrar nelas intensamente, nas suas forças, construindo um olhar partilhado sobre a criança.

O respeito pelas famílias, convidadas a estar presentes na formação nos vários Touchpoints do desenvolvimento, foi uma constante – acolher, escutar, observar, valorizar foram atitudes transversais a todos os momentos vividos.

Foi, indiscutivelmente, forte, fundamental, comovente, desafiante o que vivemos.

Recebi esse tesouro com um imenso sentido de responsabilidade e compromisso. Alguns de nós, tornámo-nos formadores em Touchpoints, e desde então, 16 anos passados, fomos/somos conjuntamente responsáveis por dezenas de momentos de formação, em que procuramos abraçar os profissionais através desta nova forma de estar/ser, dizer/fazer.

Berry Brazelton, que manteve a sua presença e apoio ao longo de mais uma década de formação em Touchpoints em Portugal, levou-nos a descobrir o melhor que temos em nós – como pessoas e profissionais. Fomos sempre, simultaneamente, formadores e formandos, aprendendo, com cada família, com cada criança, com todos os profissionais, que é inesgotável o desafio que nos une – partilhar com as famílias o desenvolvimento dos seus filhos, o seu próprio desenvolvimento enquanto pais e o nosso enquanto profissionais e pessoas.

O Modelo Touchpoints representa, para mim, a melhor a síntese da vida de Berry Brazelton, profundamente atenta à criança, mas também à sua família. Recebê-lo e compreendê-lo é como pegar numa rede finíssima, persistentemente tecida ao longo de anos e, no entanto, com uma flexibilidade e resistência extraordinárias.

Berry Brazelton chamou aos Touchpoints o “mapa da infância”. Tal como o vejo, é o mapa para o tesouro que reside em cada um de nós, potenciando a descoberta e partilha de novos sentidos de autonomia que, desde crianças, construímos, e, de forma empática e positiva, encarar as regressões e as desorganizações que cada conquista implica como parte intrínseca do caminho que percorremos.

Na minha Fé, sinto o eco das palavras sábias de Madre Teresa de Calcutá – “Tudo o que não se dá, perde-se”. Com Brazelton, aprendi a viver a Fé, o Amor e a Esperança na minha profissão, na minha vida, no meu percurso como pessoa, em quem sou e tento ser – mais e melhor – a cada dia.

Hoje, chorando a sua morte, sinto, simultaneamente, a profunda alegria de ter o seu legado, em mim, em nós. Lembrar Brazelton é, por isso, acender a luz da Esperança, sentir o Amor, acordar a Fé – agradecer, agradecer, agradecer a Deus por este Pediatra, Pessoa e Amigo maior, que me faz querer ter a força e a coragem para lutar pelo que realmente vale a pena!

Assim eu esteja – com o nosso Mestre maior Professor Gomes-Pedro e a Equipa extraordinária que construiu na Fundação Brazelton Gomes-Pedro para as Ciências do Bebé e da Família – à altura deste grande e maravilhoso desafio!

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.