A favor dos filhos da mãe

Neste tempo de Páscoa, uma homenagem às mães e à sua superabundância de amor.

Neste tempo de Páscoa, uma homenagem às mães e à sua superabundância de amor.

Cada artigo tem um limite de caracteres, o que limita o louvor que cada mãe merece. Mas que não falte carácter aqui, e recordemos o extraordinário que cada mãe é:

1. Mãe é multifunções.

Não há mãe que desempenhe apenas uma função. Reparemos como numa tarde uma mãe assume uma variedade de ofícios: cozinheira, contadora de histórias, médica, amiga e tanto mais. Para uma mãe não há falta de vocações.

Contudo, a um nível mais profundo, assistimos a um ataque a esta polivalência por parte de alguns legisladores modernos, filhos da mãe com certeza. Pretendem assim separar as várias funções de mãe por diferentes pessoas: a mãe genética (que cede o material genético), a mãe social (que educa) e a mãe gestante (que gera). Mas não se podem separar estas funções: “A maternidade é o conjunto vitalmente integrado das três funções e morre quando são dissociadas”(Luís Archer sj).

2. Mãe é uma virtude prática.

As mães não dão aulas teóricas. Mostram na prática como se faz. Num país de comentadores, olhemos antes para as mães. Deixemos as suas rugas falarem, as suas mãos contarem histórias, os seus olhos mostrarem quanto viram.

E como cada mãe exerce a sua vocação tantas vezes de forma invisível! Sem os filhos sequer imaginarem quanto se preocupam, quanto sofrem, quanto se dedicam. Pensemos agora por um minuto, num exercício raríssimo, no que a nossa mãe abdicou por nós. Pensemos no que se entregou, no que prescindiu para que tivéssemos vida. Fechemos os olhos e pensemos. Agora mesmo.

Ninguém ama uma mãe por ser irrepreensível, mas por ser uma superabundância de amor. E como há coisas que só o amor consegue fazer!

3. Não há mãe perfeita.

Ninguém ama uma mãe por ser irrepreensível, mas por ser uma superabundância de amor. E como há coisas que só o amor consegue fazer! Pensemos na nossa entrada no mundo: o parto. Tantas outras competências profissionais de nada valem: a determinação, a inteligência, a criatividade. Um parto faz-se, tolera-se e atravessa-se por amor. E todos tivemos essa estreia no mundo, com um acto de total sacrifício, entrega e amor. Uma mãe nunca é perfeita, mas isso já é perfeição que baste.

Contudo, se todos temos uma mãe, todos somos filhos da mãe. E isso tem dois aspectos a não esquecer:

Quer queiramos quer não, somos uns cretinos, uns filhos da mãe, uns pecadores.

E apenas assim nos podemos abrir à graça. Leonard Cohen cantava: there is a crack in everything, that’s how the light gets in. É precisamente naquela fraqueza da nossa personalidade, no nosso orgulho vaidoso, no nosso humilhante pecado, que Deus quer entrar e inundar da Sua luz.

Somos filhos de uma mãe que nos amou, e com quanto amor! Façamos uma humilde contabilidade: Imaginemos uma contagem de apenas três (!) gestos diários que uma mãe faz por amor. A um bebé (dar de mamar, mudar uma fralda, suportar um choro), a uma criança (preparar uma refeição, ajudar a estudar, dar banho), a um adolescente (tolerar uma birra, acarinhar, não enlouquecer), a um adulto (dar um mimo, aconselhar, dar dinheirinho)…

E por aí fora. 3×365 dias: mais de 1.000 gestos por ano. Tenho 40 anos? Contemos 40.000 gestos de amor. A conta real será muitíssimo mais generosa…

Podemos não nos lembrar de tudo, mas a única coisa que não se perde é o amor que demos. Só o amor permanece porque só ele é eterno. Outras coisas que tratamos como se fossem, não o são: o dinheiro, a beleza física, o poder que temos, o cargo que ocupamos, os bens que possuímos. Apenas o amor permanece.

Somos uns filhos da mãe:
Somos pecadores, deixemo-nos salvar.
Somos amados, amemos também.

Que nos guie a mãe modelo, Nossa Senhora, que deu ao mundo o seu precioso filho, e o viu ser trucidado por uns filhos da mãe. E mesmo com o seu coração partido, onde tudo guardava, cumpriu a maior missão de uma mãe: acompanhou o seu filho até ao Céu.

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.