Querido Aluno,
Sim, tu. Tu, que viveste um ano letivo exigente. Tu, que foste desafiado a aprender longe da escola. Tu, que tiveste de adaptar a novas circunstâncias e que não controlaste. Tu, que, no fundo, tiveste de aprender a aprender de uma maneira diferente. Tenha tudo isto sido mais ou menos difícil, é mesmo para ti. Sei que não sou tua professora. Ainda assim, atrevi-me a escrever-te a ti.
Começas a ver vários anúncios que falam das melhores promoções de material escolar e, quando entras nos supermercados, és recebido por faixas que anunciam o regresso às aulas – quase como se não soubesses que isso acontece sempre em setembro. Não sei se já te tinhas apercebido disso. Não sei se isso mexe contigo. Não sei se isso te faz ficar preocupado.
Gostava de te poder dizer exatamente como vai ser o próximo ano. Gostava de te poder falar sobre o que vamos fazer. Gostava de te poder esclarecer já sobre as dúvidas todas que tens. No entanto, a situação que vivemos impede-me de te falar sobre como tudo vai acontecer.
Por isso, prefiro falar daquilo que é certo, seguro e garantido. Prefiro dizer-te que nós, professores, também não sabemos, com pormenor, como o próximo ano vai decorrer. Mas isso não tem sido impedimento para que já tenhamos trabalhado para o preparar e para que o continuemos a fazer. Prefiro relembrar-te de que o fazemos com tudo o que aprendemos depois de termos tido que nos adaptar, em tão pouco tempo, a uma nova forma de acompanhar os nossos alunos, como tu. Prefiro assegurar-te que também a nós nos faz falta estar na escola, contigo e com todos os teus colegas. Sabes porque é que isso acontece? Porque, ainda que tenhamos estudado muito para o ser, só passámos a ser verdadeiramente professores quando nos foram confiados alunos, como tu, para podermos acompanhar. Acredito que a grande beleza de ser professor está em ser-se professor de alguém. Afinal, gostamos muito das disciplinas que ensinamos, mas não é isso que nos apaixona: são vocês, alunos!
Acima de tudo, prefiro garantir-te que contamos contigo e com tudo o que trazes. Contamos com tudo aquilo que aprendeste, seja pequenino ou grande, durante estes meses em que estivemos fisicamente mais distantes. E aquilo que foi mais difícil? Aquilo que tiveste de deixar para trás? Aquilo que não percebeste mas que era demasiado complicado de perguntar à distância? Aquilo que, cansado e farto de estar em casa, deixaste por fazer? Traz também, sem dúvida. Precisamos e contamos com tudo isso para aquilo que vamos construir.
Há muitos anos, a construção mais antiga e bonita da História começou quando Jesus desafiou um dos Seus melhores amigos, Pedro, a ser Pedra da Sua Igreja. Disse-lhe que seria sobre essa Pedra – sobre ele – que construiria a Sua Igreja. Isto significa que contava com Pedro para ser ponto de partida; para ser alicerce. Significa que contava com Pedro não só para fazer parte da Igreja, mas também para ajudar a que outros fizessem.
É preciso construir Escola depois deste tempo à distância. Hoje, são os professores que te dizem que és Pedra. Isto não significa só que fazes parte da tua escola ou que és mais um ingrediente para esta receita. Significa qu. e ser Aluno não é um papel passivo
Este ano, mais do que nunca, é tempo de perceber como este desafio ganha sentido na Escola: é o desafio que te é feito a ti. É preciso construir Escola depois deste tempo à distância. Hoje, são os professores que te dizem que és Pedra. Isto não significa só que fazes parte da tua escola ou que és mais um ingrediente para esta receita. Significa que ser Aluno não é um papel passivo: não se trata de alguém a quem tudo é dado de bandeja e pronto. Significa que ser Aluno é um papel essencial naquilo que se faz numa escola. Na verdade, ser Aluno é o que está no centro daquilo que se faz numa escola.
Foi por isso que foi tão difícil para os professores poder acompanhar-te durante o tempo de confinamento. À distância, é mais difícil perceber como estás a fazer o teu trabalho, identificar aquilo em que estás a ter dificuldades, ajudar a esclarecer as tuas dúvidas e, acima de tudo, estar presente para celebrar contigo as conquistas que vais fazendo. Se vires bem, são estas coisas que te distinguem de qualquer outro aluno. Sem isto, os professores ficam sem verdadeiro acesso ao que é mais importante: tu e a forma como estás a aprender e a crescer.
Assim, acho que consegues ver porque é que não estamos só a construir a Escola para ti. Temos de a construir contigo. Na verdade, a Escola é e será feita de ti, assim como és: da forma como aprendes; dos passos que dás entre aquilo que te é difícil e as conquistas que fazes para o superares.
Por tudo isto, para já, e porque o que te escrevo já vai longo, desejo e espero que descanses. Espero que recuperes as forças e, principalmente, o ânimo. Desejo-o porque, depois dos desafios que este ano trouxe, mereces e, principalmente, porque, para construirmos o próximo ano, precisamos de ti.
Lembra-te de que, independentemente de como for, o próximo ano será construído contigo e de ti. É assim mesmo que a Escola deve ser. Tu és Pedra desta Escola: é feita contigo e de ti.
Não te preocupes: vamos fazer isto juntos.
Nessa altura, tudo ficará mais claro.
Até lá!
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.