Nos últimos 7 anos, terão chegado a Portugal mais de 500 mil estrangeiros com a intenção de aqui permanecer. A esmagadora maioria destes imigrantes veio para trabalhar, melhorar a sua qualidade de vida individual e ajudar as suas famílias, numa trilogia de ambição, esperança e coragem. A economia portuguesa, apresentando sinais de crescimento sustentado após 2014 (com o intervalo da queda provocada pela crise pandémica, Covid-19), necessita, a cada ano, de mais e mais trabalhadores, para novas áreas de serviços (hotelaria, restauração, turismo, etc.), para uma agricultura intensiva baseada na exploração do sol, do solo e de trabalho barato, ou como mão de obra de substituição para os portugueses que emigram ou que migram para a reforma. O número crescente de novos imigrantes não se tem refletido no aumento do desemprego no país, mas, ao contrário, num aumento sustentado da população ativa total, mitigando o envelhecimento (também ele sustentado) da população portuguesa. Pela via de uma legalização migratória (que todos buscam, mas alguns tardam em conseguir), o seu contributo fiscal e para a segurança social tem sido, igualmente, assinalável.
Nos últimos 7 anos, terão chegado a Portugal mais de 500 mil estrangeiros com a intenção de aqui permanecer. A esmagadora maioria destes imigrantes veio para trabalhar, melhorar a sua qualidade de vida individual e ajudar as suas famílias, numa trilogia de ambição, esperança e coragem.
Porém, com a imigração sustentada e consistente há, também, um padrão de crescente substituição da mão de obra nacional mais jovem – hoje muito mais qualificada do que há umas décadas – que, após terminar os seus estudos, seja com o 12.º ano ou com um diploma de ensino superior, reage às ofertas do mercado de trabalho (público e privado) português votando com os pés e partem para outras profissões, remunerações ou carreiras (fora daqui). Não é por acaso que setores como o da construção civil e obras públicas, agricultura intensiva ou turismo, comércio e serviços (e cada vez mais a indústria), vêm recrutando imigrantes para as suas fileiras. Não há outra oferta de trabalho disponível para as condições salariais e de trabalho oferecidas no país. E é aqui que se joga o nosso futuro coletivo num país envelhecido e depauperado de parte do capital humano em que o país tanto investiu nas últimas décadas. Sem a imigração atual o país estagnaria economicamente. Sem imigração no futuro e sem estancar a emigração jovem, é a própria sociedade portuguesa que estará em causa. Sem mudanças estruturais, o futuro tende a ser dramático.
Sem a imigração atual o país estagnaria economicamente. Sem imigração no futuro e sem estancar a emigração jovem, é a própria sociedade portuguesa que estará em causa. Sem mudanças estruturais, o futuro tende a ser dramático.
Este paradoxo português contemporâneo, receber imigrantes pouco qualificados e exportar jovens mais qualificados, não é de todo, nem aceitável nem sustentável socialmente. Por um lado, hipoteca o futuro coletivo do país exportando capital humano insubstituível e, por outro, – como se alimenta de uma política coletiva de precariedade, salários baixos e imobilidade social para quem chega ao mercado de trabalho – condena os imigrantes (que hoje vivem aqui) a uma vida sem avanço social e com uma imobilidade económica e profissional que os condena a nova migração ou ao peso da pobreza futura.
Numa época de inflação, especulação na habitação e estagnação salarial, os pobres do futuro já se adivinham ao virar da esquina do tempo: são os tradicionais pobres por herança (para quem o elevador social teima em não funcionar), a classe média (agora totalmente descapitalizada por via de políticas macroeconómicas que não controla); a que acrescem os imigrantes que agora acolhemos (pela erosão dos salários e da qualidade de vida local). O número de pobres aumenta e o prognóstico é de que vai aumentar ainda mais. Sem segurança laboral, carreiras profissionais e salários dignos, hipotecamos o nosso futuro exportando jovens qualificados e desprezamos o presente iludindo os jovens imigrantes com amanhãs que não cantam. A pobreza no (ou com) trabalho é um ónus que agora exportamos para os imigrantes que recebemos e isso é inaceitável. Os nossos salários baixos são agora deles, a habitação escassa a custos não controlados e a precariedade laboral são agora, também, deles. Ser imigrante laboral em Portugal não pode ser escolher entre a camarata coletiva, a barraca ou a tenda num terreno baldio. Trabalhar e não ganhar o suficiente para uma vida digna não é digno de uma sociedade no século XXI. O salário mínimo não é um salário digno e o parco salário médio um indicador de um país sem ambição nem futuro.
Sem segurança laboral, carreiras profissionais e salários dignos, hipotecamos o nosso futuro exportando jovens qualificados e desprezamos o presente iludindo os jovens imigrantes com amanhãs que não cantam.
Prevenir a pobreza do futuro passa por alterar as condições do presente, rápida e radicalmente, alterando as condições de trabalho e as remunerações de quem agora acolhemos e, também, as que oferecemos aos mais jovens compatriotas, para evitar a sua partida. Infelizmente este é um projeto coletivo que tardamos em abraçar. A ideia de que na nossa sociedade cabem, “todos, todos, todos”, obriga-nos a repensar a forma como nos organizamos coletivamente. Tenho para mim que esta não é uma tarefa do Estado, mas um empreendimento de cada um de nós. Precisamos de um movimento social, de um movimento coletivo, que junte ideias, projetos, programas, que permita voltar ao pensamento básico que nos une: o da construção de uma irmandade social, justa e inclusiva. De um movimento social que garanta que terminar com a pobreza futura é um projeto do presente de cada um de nós.
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.