O que esperar de Katowice?

De 2 a 14 de dezembro decorre em Katowice, na Polónia, a 24ª Cimeira das Nações Unidas para o Clima - COP 24. Neste tempo de espera que é o Advento, o que se espera de Katowice?

Está a decorrer em Katowice – Polónia a COP 24. Até 14 de dezembro, cerca de 30 mil pessoas vindas de todo o mundo encontram-se neste lugar, entre os quais quase 13 mil delegados dos diferentes estados membro das Nações Unidas (intitulados “Partes”), cientistas, organizações da sociedade civil, jornalistas, empresas.  Todos em busca de mudanças que permitam fazer frente à crise ambiental que se agrava.

No enquadramento da minha colaboração com a Fundação Fé e Cooperação (FEC), coube-me a sorte e a responsabilidade de ser por alguns dias parte desta multidão, em representação da Plataforma Portuguesa das Organizações Não Governamentais para o desenvolvimento (ONGD’s). É a partir desta experiência que partilho o que, a título pessoal e não enquanto representante de um conjunto organizações da sociedade civil Portuguesa, me sugeriram estes dias.

Encontro cinco razões para ter esperança em Katowice, cinco pontos que nos responsabilizam e implicam neste Advento Climático.

Conhecimento ao serviço da Humanidade

No início da COP, o painel de cientistas responsáveis pelo recente relatório especial do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC)  justificou a necessidade de ir mais além nas metas acordadas no Acordo de Paris. Trata-se de um relatório que resulta de um esforço inimaginável ao longo de 3 anos, de recolha de dados por todos os países envolvidos (nas diferentes áreas setoriais), cálculos integradores e simulação de diferentes cenários. O relatório consegue ainda a proeza de traduzir em linguagem acessível os impactos do aquecimento global de 1,5ºC ou 2ºC acima da era pré-industrial, meta em discussão em Paris. Acordar em conseguir travar o aumento de temperatura em meio valor, tem um peso gigante quer nas medidas necessárias para o conseguir (na indústria, transportes, energia, agricultura) quer nos impactos minimizados (vidas, ecossistemas). Ao longo da apresentação, repetem quase exaustivamente a mensagem: every action matters, every bit of warming matters, every year maters, every choice matters.

Ao longo da apresentação, repetem quase exaustivamente a mensagem: every action matters, every bit of warming matters, every year maters, every choice matters.

História – o que já se alcançou

Já muito foi alcançado nos esforços para minimizar as alterações climáticas. Os passos decisivos a dar hoje estão enraizados em conquistas anteriores em nome do bem comum, ainda que com muitos avanços e recuos, com muitos interesses das Partes a bloquear o interesse do Todo. A COP 21 em 2015 alcançou o histórico Acordo de Paris, um compromisso ambicioso de 196 países no sentido de garantir a redução de gases com efeito de estufa e assim controlar o aumento da temperatura e impactos que daí advêm. O espírito de compromisso e solidariedade entre países permitiu alcançar o primeiro acordo universal e juridicamente vinculativo na matéria. Trata-se agora de não deixar que este espírito desapareça.

Encontro – Talanoa

No contexto do Acordo de Paris, a contribuição dos Estados Nacionais para a ação climática global é chamada de NDC (Contribuições Nacionais Determinadas) e determina os objetivos que os países devem realizar para atingir as metas determinadas. Os NDC serão postos em prática a partir de 2020, altura em que o acordo entra em vigor. Para conseguir mobilizar todos os contributos para planos verdadeiramente transformadores, teve início em 2017 o chamado “Diálogo de Talanoa”, uma Plataforma de partilha e articulação com vista a aumentar as expectativas dos planos nacionais para o clima. Talanoa é uma tradição do Pacífico, profundamente enraizada nas ilhas Fiji, e que representa um diálogo inclusivo, participativo, assente na partilha de narrativas e criação de pontes. Este processo tem por base três questões: Onde estamos? Para onde queremos ir? Como lá chegar? Perguntas simples que têm sido a base de articulação aos mais diversos níveis.

Este processo tem por base três questões: Onde estamos? Para onde queremos ir? Como lá chegar? Perguntas simples que têm sido a base de articulação aos mais diversos níveis.

Tensão – a complexidade da mudança

Se pensarmos que uma das medidas mais necessárias para enfrentar as alterações climáticas é a transição da utilização de combustíveis fósseis (como o carvão, petróleo, gás) para fontes renováveis de energia, percebemos como a escolha de Katowice para a realização da COP 24 foi desde logo lugar de contradição. Katowice é a capital de uma região marcada pela exploração do carvão. A conferência acontece dentro de uma mina de carvão desativada e tem como um de seus patrocinadores oficiais uma companhia estatal de carvão. No reverso da medalha, num país onde o carvão é responsável por 80% da produção de energia elétrica, as metas climáticas e energéticas da União Europeia, que incluem a eliminação gradual dos combustíveis fósseis, não são bem aceites. Para além de uma questão económica, trata-se de uma grande questão social. A mudança é de facto complexa e cheia de tensões. Talvez por isso possamos também acreditar que a COP 24 em Katowice contribui como sinal realista, e ao mesmo tempo profético, para esta mudança necessária.

Compromisso comum

No discurso que fez na sessão de abertura, António Guterres, Secretário Geral das Nações Unidas, foi muito mobilizador, não aceitando que as negociações sejam limitadas. “Alguns podem dizer que será uma negociação difícil. Eu sei que não é fácil. Requer uma firme vontade política de compromisso. Mas, para mim, o que é realmente difícil é ser um pescador em Kiribati vendo o seu país em risco de desaparecer ou um fazendeiro ou pastor no Sahel perdendo a subsistência e perdendo a paz. Ou ser uma mulher em Dominica ou qualquer outra nação das Caraíbas que sofra furacão após furacão destruindo tudo em seu caminho.” De alguma forma reconheci com alegria a perspetiva desafiadora de Elena Lasida sobre a pobreza e os pobres, recentemente publicada no Ponto Sj.

Onde estamos? Onde queremos chegar? Como lá chegaremos? Três perguntas existenciais que encontram eco no relato da Criação, no diálogo de Deus com Adão, o Criador com a criatura, num jardim do Éden que é chamado a cuidar, onde se vai desequilibrando e recriando. Onde estás? Onde estou? Sejam quais forem os passos dados em Katowice, são necessárias as nossas respostas.

Foto de capa: do site oficial: https://www.flickr.com/people/cop24official/

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.