A Alegria é a marca forte e inconfundível deste tempo pascal, que de tão grande e profunda, se estende por 50 dias depois da Páscoa. Alegria que se pode traduzir em Paz, em Amor, Solidariedade e Justiça, valores intrínsecos à constituição europeia. A Alegria é também um tema muito sublinhado pelo Papa Francisco, o qual tem vindo a declinar nos principais documentos (A Alegria do Evangelho, do Amor). “O bem tende sempre a comunicar-se. Toda a experiência autêntica de verdade e de beleza procura, por si mesma, a sua expansão; e qualquer pessoa que viva uma libertação profunda adquire maior sensibilidade face às necessidades dos outros. E, uma vez comunicado, o bem radica-se e desenvolve-se. Por isso, quem deseja viver com dignidade e em plenitude, não tem outro caminho senão reconhecer o outro e buscar o seu bem.” (A Alegria do Evangelho, nº9, Papa Francisco).
A Alegria marca simbolicamente a União Europeia. O hino da União, extraído do «Hino à Alegria» da Nona Sinfonia de Ludwig van Beethoven, integra os Símbolos da União, juntamente com a bandeira, adotada a 26 de maio de 1986, pelas Comunidades Europeias. O lema da União é: «Unida na diversidade», base de uma Europa mais justa e interdependente, onde todos contam e têm lugar, onde a Alegria é uma marca identitária. Lema que nasce de um desejo profundo de construir a Paz, depois de uma guerra fratricida. O que nos diria hoje Robert Schuman, intitulado “Pai da Europa” pelo Parlamento Europeu, do qual foi primeiro Presidente? Como estamos a cuidar da Paz que herdamos e que damos por garantida?
Foi também em 1986 que se deu a adesão de Portugal e Espanha ao projeto europeu. Passados 33 anos, os europeus são chamados a participar nesta União na diversidade, votando no próximo dia 26 de maio uma nova constituição do Parlamento Europeu. Mais do que grandes considerações e argumentações, que bom seria que esta semana que antecipa este momento tão determinante para a nossa História comum, pudesse ser de mergulho mais fundo na fonte do projeto europeu, atalhando caminhos de descrença, desânimo, medo. Essa fonte pode-se resumir à palavra ALEGRIA, com tudo o que contém e abre, como princípio, fundamento e meta da Humanidade. Ficam três sugestões para este mergulho no Bem, que é sinónimo de Bom e de Belo, que nos conduz à Paz, à Verdade e ao Amor. Que no próximo domingo possamos juntos compor mais um andamento desta Boa Sinfonia, bem ajustada às pessoas e à realidade presente, deixando-nos alcançar por uma Europa chamada desde há muito a ser Terra Prometida, Casa, para todos, unidos na diversidade.
1ª Sugestão – Hino à Alegria de Beethoven
O Hino à Alegria integra a Nona Sinfonia de Ludwig van Beethoven, última sinfonia completa que compõe, em estado avançado de surdez. Incorpora parte do poema “À Alegria”, uma ode escrita por Friedrich Schiller, com o texto cantado por solistas e um coro no seu último movimento. A surdez de Beethoven deixa-nos ouvir bem fundo e alto uma Alegria contagiante, cheia de Beleza criadora e Justiça, que nos arrebata, nos põe no ponto justo de abertura à vida e aos outros. Fica como primeira sugestão deixarmo-nos contagiar por este hino e fazermos nosso o poema de Schiller:
Ó, amigos, não nesse tom!
Em vez disso, cantemos algo mais delicioso cantar e sons alegres.
Alegre! Alegre!…
Ó Alegria, sois Divina filha de Elísio, tornais ébria a Poesia, inspirais Dionísio.
Nem costumes ou tradição vos reduzem o Encanto,
Criais-nos um mundo irmão, insuflais o nosso Canto…
Alegria bebem todos os seres.
(Coro)
Abracem-se milhões!
Enviem este beijo para todo o mundo!
Irmãos, além do céu estrelado. Mora um Pai Amado.
Milhões, vocês estão ajoelhados diante Dele?
Mundo, percebes o teu Criador?
Procura-o mais acima do Céu estrelado!
Sobre as estrelas onde Ele mora!
Onde nos leva este movimento? Como é que entramos neste Coro? Como me sinto neste céu estrelado? Encandeado pelas estrelas ou abençoado e movido pela luz que as une e nos remete para uma história maior, de bem, destino e missão comum?
2ª Sugestão – City of Blinding Lights, U2
No ano passado tive a grande sorte de ir ao concerto dos U2 em Lisboa. Todo o concerto falava deste sonho europeu, pelo qual somos chamados a lutar. O hino da alegria surgiu a certa altura no início da música “City of blinding lights” (cidade das luzes ofuscantes), acompanhada nos ecrãs gigantes pela imagem da nossa bandeira azul com as estrelas amarelas. A memória do nascimento da Europa, como reação ao horror da segunda grande guerra, marcou desde logo o início do concerto, um alerta deveras importante para todos e em especial para as novas gerações, filhas da Paz e da União alcançadas. Eu vi-te andar sem medo, eu vi-te nas roupas que fizeste. Podes ver a beleza dentro de mim? O que aconteceu à beleza que eu tinha dentro de mim? E eu sinto a tua falta quando não estás por perto. Estou a preparar-me para sair do chão. Oh, estás tão linda hoje à noite, na cidade das luzes ofuscantes. Ao ler a letra, acabo por divagar numa interpretação livre no contexto Europa. O que nos pode acordar no sentido da Cidade que procuramos? Como temos Cuidado e queremos Cuidar da Beleza intrínseca da Europa? Como me sinto chamado a ser parte, a estar perto? Como podemos ir para lá das luzes que nos ofuscam, falsos caminhos e seguranças que querem encerrar a Europa em si mesma?
3ª Sugestão – Sonhar uma Europa + Justa
A FEC, – Fundação Fé e Cooperação em parceria com a Associação Casa Velha, integra a Campanha “Por uma Europa + Justa” (Fair Times). Um pequeno vídeo abre-nos a um exercício de imaginação, sobre o mundo. A campanha lançou a 9 de maio uma Edição Especial de um Jornal em 2024, que faz o balanço das principais concretizações da UE na promoção da produção e consumo sustentáveis durante a legislatura do Parlamento Europeu 2019-2024. Este jornal faz parte de uma campanha com vista às eleições para o Parlamento Europeu, que pretende ajudar a visualizar as ações que possam vir a ser apoiadas na próxima legislatura. O que me daria alegria ver neste filme/jornal?
Que a nossa alegria possa alimentar, reafirmar e renovar a Europa da Alegria, como Terra Prometida para todos os que a constituem e procuram, recriando e ampliando a Sinfonia da União na Diversidade.
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.