Estive na Prisão e Foste Visitar-me

A nossa missão é fazer sentir aos reclusos que são amados, têm amigos que optam por eles, semana após semana. Esse amor passa por gestos simples: ser constantes nas visitas, ter tempo para cada um, escutá-los, fazer a ponte com a família.

A Foste Visitar-me é uma associação de visitadores de reclusos e é um dos cinco grupos de voluntariado que integram a Comissão de Apostolado Social, a área social da Companhia de Jesus. Visitamos as pessoas que estão presas nos concelhos de Porto e Matosinhos, sempre inspirados em Mateus 25, 36: Estive na Prisão e Foste Visitar-me.

A nossa associação foi legalmente constituída em 2007, mas não foi aí que tudo começou: os primeiros passos foram dados em 1991, mas foi graças à perseverança do Carlos Coelho que, entre 1995 e 2000, visitou sozinho o Estabelecimento Prisional de Santa Cruz do Bispo, que este projeto frutificou. Hoje somos cerca de 30 voluntários que, todos os sábados, visitamos os estabelecimentos prisionais do Porto, Santa Cruz do Bispo Homens e Santa Cruz do Bispo Mulheres.

Não fazemos visitas com o objetivo de evangelizar pela palavra, mas, levando o exemplo de Jesus, que esteve sempre ao lado dos pobres e dos marginalizados, queremos mostrar a cada pessoa que está presa que é muito mais do que os crimes que cometeu e que não tem de ficar agarrado ao passado: o tempo de prisão pode ser tempo de recomeço. O Manel, dizia, no fim da sua pena, que a prisão tinha sido para ele como uma ressurreição, tinha descoberto uma nova vida.

Torna-se impossível não nos perguntarmos: se aquela história fosse a nossa, se durante toda a vida tivéssemos experimentado tal falta de Amor, onde estaríamos?

Segundo Santo Agostinho, “não há um pecado que um homem tenha cometido que outro não possa vir a cometer”, mas é, quando começamos a ser visitadores e a conhecer a história de cada uma daquelas pessoas, que essa certeza se torna real. Torna-se impossível não nos perguntarmos: se aquela história fosse a nossa, se durante toda a vida tivéssemos experimentado tal falta de Amor, onde estaríamos?

Consideramos, por isso, como nossa missão fazer sentir a estas pessoas que são amadas, que têm uns amigos que optam por eles, semana após semana. Esse amor passa por gestos simples: ser constantes nas visitas, ter tempo para cada um, escutá-los, fazer a ponte com as famílias ou mesmo, o mais simples de tudo, tratá-los pelo nome; dizem-nos os próprios que serem tratados pelo nome em vez de pelo número muda tudo: voltam a sentir-se pessoas.

Exemplo disto é a resposta do Carlos que, quando lhe perguntámos qual tinha sido a importância das nossas visitas, explicou: as pessoas cá fora ignoram os reclusos, desconfiam deles e nós sentimos isso, começamos a sentir que não temos valor…  O facto de os visitadores estarem sempre presentes, conversando com eles, escutando-os, encorajando-os, responsabilizando-os, não os tratando como coitadinhos, fez com que ele sentisse que afinal valia a pena e começasse a ganhar confiança nele próprio. Diz que foi este o primeiro passo para a sua reinserção….

No fundo, o que a Foste Visitar-me faz e o modo como faz está resumido no último parágrafo da nossa Carta do Visitador: Estive na prisão e foste visitar-me sempre sempre que me falaste de Deus pelo modo como estás e pela disponibilidade que me dás, por me fazeres sentir amado e não apenas mais um caso, por me fazeres experimentar que para quem confia nada é impossível.

Ao longo dos anos, temos procurado confirmar o caminho que estamos a percorrer mas a forma como o Papa Francisco tem desafiado os cristãos no sentido da construção de uma igreja que seja mãe e que seja capaz de estar atenta e cuidar das pessoas que estão nas periferias humanas e como a Companhia de Jesus  elegeu, depois de um processo de discernimento, que “caminhar com os excluídos” é uma das melhores maneiras de “colaborar com a missão do Senhor “ (segunda Preferência Apostólica da Companhia de Jesus para os anos 2019-2029), não nos deixam grande dúvidas.

Não serão, a maioria das pessoas que estão presas, um dos grupos mais vulneráveis e excluídos da nossa sociedade?

Fotografias de Rui Oliveira

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.