A política em revista

As questões político partidárias foram incontornáveis num ano que contou com dois atos eleitorais e a dissolução do Parlamento. Mas nem só disso se falou na secção de política do Ponto SJ. A saúde da democracia foi outro tema recorrente.

Num ano com dois atos eleitorais e a dissolução da Assembleia da República, não é de estranhar que a política nacional tenha dominado os temas sobre os quais escreveram os cronistas da secção de política do Ponto SJ. Na antecipação das Presidenciais, que marcaram o arranque de 2021, contámos com a análise de Luís Osório e com uma reflexão do P. João Manuel Silva que, pegando na última encíclica do Papa, Fratelli Tutti, enumerou as características que considerou deverem constar num Presidente da República.

É no segundo semestre que podemos encontrar os outros dois marcos importantes na vida político partidária do nosso país. Em primeiro lugar, as eleições autárquicas e suas repercussões; em segundo lugar, o chumbo do Orçamento do Estado, acompanhado de dissolução do Parlamento e convocação de eleições antecipadas para dia 30 de janeiro do ano que está prestes a começar.

Na antevisão das autárquicas, Pedro Franco apelava a um voto construtivo e alertava para a relação distorcida entre eleições locais e leituras políticas nacionais, sublinhando como isso “desencoraja a participação cívica e eleitoral e contribui para o desaparecimento do objeto das eleições em causa: os problemas sentidos a nível local”. O rescaldo do ato eleitoral, e as consequências para a Direita nacional, foram depois analisadas pelo jesuíta Nelson Faria, no artigo Autárquicas’21: tiro de partida para legislativas ‘23, um título que 20 dias depois já perdera a sua atualidade, com a queda do Governo e a necessidade de antecipar as legislativas para o início de 2022. Pelo meio, ainda um artigo de André Rijo que comparava as negociações sobre o OE com a famosa série Squid Game, pois ninguém parecia querer viabilizar a sua aprovação, preferindo “empurrar o outro para quebrar o vidro (no caso, a contrario sensu, viabilizar o Orçamento) e assim poder “seguir a sua vida” com mais tranquilidade.”

Já com a queda do Governo consumada, o Ponto SJ ouviu Martinho Lucas Pires, que no seu artigo considerava que a política se fechou na sua “dimensão mais tática e procedimental. Em vez de uma luta pelo melhor, vive-se uma luta pelo possível; e, dentro deste, pelo mínimo dos mínimos possíveis”. Mais recentemente, ainda esta semana, Jaime Reis fazia a sua análise e antevisão do que pode acontecer na política partidária nas próximas semanas.

Ainda sobre política nacional, mais alguns artigos cuja releitura se recomenda: Instantâneos e O nome e a coisa, de Nuno Pereira, centrando-se este segundo na gestão política da situação pandémica. A forma como o governo foi restringindo as liberdades e direitos dos portugueses por motivos de saúde pública foi também questionada por outros autores, como Francisco Sarsfield Cabral, no seu artigo Vacinação e voto obrigatórios – entre a coação estatal e a liberdade privada.

Diretamente relacionada com esta questão da gestão da liberdade – até porque ela é a razão de ser da democracia – a reflexão sobre a vitalidade da nossa vida democrática foi também um tema que inspirou a escrita de vários colaboradores da secção de Política, por vezes associada também ao debate sobre o papel do Estado e sobre a participação dos cidadãos. E o sentimento subjacente a esta reflexão nem sempre foi animador. Sobre a participação cívica nos atos eleitorais, José Maria Montenegro oscilava entre a esperança e a desesperança, sublinhando que “uma democracia saudável depende, antes do mais, do nível com que se exibem os democratas.” E depende também do tom com que se desenvolve o debate político, acrescentaria Vasco Ressano Garcia, num texto em que defendeu a polarização e combate o tribalismo. O mesmo autor refletiu ainda sobre a vida democrática e o Estado de Direito, a propósito das questões de justiça, sublinhando que este “não se dá bem com a justiça-popular-imediato-intuitiva”. Ainda sobre o papel do Estado na gestão do pluralismo, a propósito do tema da eutanásia, Francisco Sarsfiedl Cabral escrevia: “a autonomia pessoal é um valor que deve ser preservado, limitando a intervenção estatal. Mas o Estado, qualquer Estado, tem forçosamente de tomar decisões substantivas e não pode limitar-se a regras instrumentais.

Vista de outro prisma, e mais relacionada com razões económicas, a questão dos limites da democracia foi abordada por Francisco Sarsfield Cabral, ao refletir sobre os bancos centrais e outras entidades reguladoras que são (e bem, considera o autor) independentes do poder político.

A um mês de novo ato eleitoral, que dará ao país um novo governo, podemos prever com segurança que, nesta secção, haverá muita política nacional.

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.