Falar de Património Cultural é muito mais que falar de um conjunto de pedras e paredes que por aí andam espalhadas à espera de receber visitas. Podia ser só isto, mas não é. Podia até ser só entretenimento, mas não é. Podia ser só arquivo e memória, mas, também não é. O património é espaço da humanidade. Precisamos, talvez mais que nunca, de habitar este espaço comum. Um castelo, uma ruína, uma ermida, um palácio, uma citânia, uma casa, uma igreja, um jardim, uma praça, um simples pórtico.
Falar de património, estar no património, conhecê-lo e vivê-lo: estou certa de que isto nos compromete enquanto sociedade, nos liga, nos faz mais irmãos. Pode a relação com o património cultural ser um espaço de encontro, onde da beleza nasce mais vida para viver? Tal como acontece com a música, com a literatura, com a pintura ou com qualquer outra forma de arte. Na relação com o património há esta beleza de um encontro com um lugar que é profundo e que nos transcende.
A arte e as histórias que estão presentes nestes espaços são fontes de bem-estar. Bem-estar individual, mas, essencialmente, bem-estar colectivo. O património, esta herança de todos, é, segundo a UNESCO, “fonte de identidade e coesão”. É preciso trabalhar esta relação com o património cultural, aprofundar a relação com o espaço e a sua importância na nossa vida. O espaço importa. Tanto quanto o tempo. O espaço é memória e é esta que justifica a nossa identidade. Tudo isto me faz acreditar convictamente no extraordinário poder que o património cultural pode ter na nossa vida e no seu papel importante para o desenvolvimento do país e da sociedade.
A ausência de estratégia para o sector em Portugal é gritante. Os dados do estudo “Património Cultural em Portugal: Avaliação do Valor Económico e Social”, de 2020, não deixam dúvidas. Dos 4575 bens de património classificados, em 2020, apenas 250 estavam abertos ao público. Um dado que nos revela um grande desconhecimento e ignorância acerca do potencial que este sector tem para o desenvolvimento do país e das pessoas. Na Educação, há também muito a fazer. Despertar os corações para a cultura desde cedo, trazê-los para os espaços e permitir que os habitem. Que o património cultural possa ser mais que um museu, que possa ser parte da nossa realidade enquanto comunidade. Por mais visitas ao maravilhoso património cultural em Portugal, distribuído de norte a sul do continente e ilhas. Por mais património nas escolas e nas famílias, por mais bens de património cultural abertos ao público, por mais estratégias que aproximem o património cultural da sociedade e que evidenciem a fonte de bem-estar que é para as pessoas.
Dos 4575 bens de património classificados, em 2020, apenas 250 estavam abertos ao público. Um dado que nos revela um grande desconhecimento e ignorância acerca do potencial que este sector tem para o desenvolvimento do país e das pessoas.
O património cultural faz-nos sair de nós, faz-nos olhar para o mundo e, mais importante que tudo, faz-nos olhar para o outro. Não o podemos mais ignorar, porque o património transporta-nos para um lugar diferente do nosso, onde há o outro para conhecer, para estar atento, para ser parte da sua história. O património dá-nos pistas para o futuro, o património conta-nos histórias, oferece-nos tempo de qualidade, contemplação e descoberta. O património cultural é memória e, fundado nela, apela à partilha, à convivência em sociedade, ao espaço comum, à comunhão e à pertença. O património cultural é a herança comum que não nos deixa esquecer que somos verdadeiramente irmãos.
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.