No passado dia 5 de dezembro, no Colégio das Caldinhas, onde trabalho, tivemos a honra de receber a visita do Superior Geral dos Jesuítas, P. Arturo Sosa, sj, para grande alegria dos alunos e dos educadores. Deste dia, para além das perguntas que os nossos alunos tiveram a oportunidade de colocar ao Padre Geral, num encontro com toda a comunidade educativa no pavilhão, gostava de destacar a conversa com os educadores. Depois de uma breves palavras de introdução, os educadores colocaram algumas perguntas ao Padre Geral sobre como educar hoje, diante de tantos desafios, através da pedagogia inaciana.
Desta conversa retenho três ideias inspiradoras: a) que no presente, a nível mundial, um dos maiores problemas/desafios está na dificuldade de promover um diálogo inter-geracional; b) que educar para a Cidadania Global, um dos dez identificadores da Tradição Viva, é educar para um bem comum e não para o mérito próprio, isto é, para o serviço; c) que educar para a felicidade é educar para a liberdade, uma liberdade que não vive apegada ao poder ou a ideias, mas que se sente livre para seguir o Espírito Santo e o desejo de Deus para o mundo.
A escola é um espaço social onde este encontro de expectativas e visões do mundo se pode dar, alargando o horizonte das relações sociais e promovendo um efetivo diálogo entre distintas gerações, sobretudo, sensibilizando para a construção de uma sociedade mais justa e integradora, lutando contra a lógica de descarte e promovendo uma cultura de escuta e de diálogo.
a) Educar para o diálogo. Vivemos num continente e num país com uma baixa taxa de natalidade e em progressivo envelhecimento, como comprovam os resultados estatísticos dos últimos sensos. Este nosso contexto não só levanta as frequentes questões de sustentabilidade do sistema de assistência social, como nos traz novas questões em relação à organização da sociedade e ao diálogo entre gerações. A escola é um espaço social onde este encontro de expectativas e visões do mundo se pode dar, alargando o horizonte das relações sociais e promovendo um efetivo diálogo entre distintas gerações, sobretudo, sensibilizando para a construção de uma sociedade mais justa e integradora, lutando contra a lógica de descarte e promovendo uma cultura de escuta e de diálogo.
b) Educar para o bem comum. É frequente avaliarmos o mérito dos alunos pelas notas, congelando todas as outras dimensões da pessoa. Num mundo cada vez mais global, com problemas e desafios que são de todos e que exigem o esforço de todos, estamos naturalmente formatados para o reconhecimento e incentivo do mérito individual. Todavia, as dimensões da Cidadania Global, objetivo recente da educação jesuítica, não só pretendem a consciencialização do cidadão para as grandes questões globais, como o seu compromisso com a justiça e com ações concretas de transformação do mundo, pela força criativa do serviço. A pandemia trouxe-nos a consciência que estamos todos juntos e que os problemas globais, como as alterações climáticas, exigem o compromisso de todos, por isso, mais do que educar indivíduos geniais, somos chamados a educar cidadão globais comprometidos com a construção do bem comum e a excelência humana.
c) Educar para a liberdade. O presépio, que neste tempo ocupa um lugar de destaque na nossa casa, é um grito de liberdade, que muda radicalmente a definição de felicidade. Para Maria e José, a liberdade está no compromisso e não no poder. Em Deus incarnado, a felicidade está no serviço e não no ser servido. Promover a autonomia do aluno e a sua responsabilidade, fazê-lo protagonista ativo do seu processo de aprendizagem não é apenas dar-lhe os meios digitais ou outros que lhe permitam aprender sozinho, mas ajudá-lo a aprender com os pares, desenvolvendo o sentido humano que o saber deve estar ao serviço da construção da felicidade de todos.
Os educadores, como pessoas humanas em construção, devem também voltar às origens da sua vocação de humanizadores para poderem ajudar os alunos de hoje a descobrir as suas origens e a criar um mundo novo, mais semelhante ao do presépio.
Quase no final da sua intervenção, o Padre Geral sintetizava estas ideias afirmando que o educador inaciano tem que ser como o salmão, nadar contra a corrente e não se deixar ir pelas correntes das modas.
Os salmões, para se poderem reproduzir, voltam, com muito esforço, nadando contra a corrente, ao lugar onde nasceram. Os educadores, como pessoas humanas em construção, devem também voltar às origens da sua vocação de humanizadores para poderem ajudar os alunos de hoje a descobrir as suas origens e a criar um mundo novo, mais semelhante ao do presépio. Nadar contra a corrente implica diálogo aberto com a diferença e confiança discernida da missão a que Deus nos chama como educadores inacianos e católicos, porque Deus não dorme, mas trabalha misteriosamente ajudando o mundo a caminhar para o bem. Nadar contra a corrente, mergulhar mais fundo no sentido das coisas e da vida, para dar uma resposta humana/divina às questões próprias de cada etapa de crescimento e para abrir novas portas de sentido.
Como referia o Padre Geral: “Para lograr este objetivo [educar hombres y mujeres para los demás], no contamos con milagros o intervenciones extraordinarias, sino que contamos con este tesoro aquí presente, que ya está en acción: contamos con el compromiso de cada persona, que da lo mejor de sí, que vive desde la verdad y la transparencia, en diálogo sincero y constructivo, con profesionalidad, busca el bien de toda la comunidad y se adhiere a una misión que no es sólo el desempeño de un oficio o el deseo de éxito, sino que es, desde ahora y en lo cotidiano, un compromiso con una humanidad reconciliada, esperanzada y feliz”.
Diante de Deus que incarna e assume a nossa humanidade, a nossa vocação de educadores adquire uma dimensão profunda e espiritual: educar não é apenas transmitir conhecimentos, mas voltar ao lugar de nascença para gerar uma nova humanidade. Para um educador inaciano, nadar contra a corrente, com ânimo e tenacidade, não significa estar fechado à novidade, em métodos antigos de ensino ou em pedagogias do passado, mas renovar o seu compromisso com o objetivo integral da educação jesuítica – letras e virtudes – no desejo de transformar o mundo através da educação dos seus alunos.
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.