Recentemente, neste mês de setembro, ao receber uma nova missão, regressei à minha cidade natal, Lisboa, de onde parti há 28 anos! Estes dias têm sido uma experiência nostálgica, gozosa, por voltar a habitar os mesmos espaços, contemplar as mesmas paisagens, caminhar pelas mesmas ruas de uma cidade que sempre me encantou, e que outrora terá sido o cenário dos meus anos de juventude. O regresso à nossa cidade natal é sempre, quer queiramos, quer não, o revisitar de um passado longínquo que deixou as suas saudades e que traz consigo muitas memórias de quando ainda vivíamos entusiasmados a descobrir o mundo, os outros, nós próprios e Deus.
Quando partimos para longe de casa entramos num mundo desconhecido, que nos reserva uma série de novidades e surpresas. Por outro lado, também enfrentamos desafios, adaptações, novos ritmos, novas amizades… e sabemos bem como todos esses reajustes, físicos ou psicológicos, sociais ou gastronómicos, são exigentes, forçando a reajustes na forma como vivemos e nos relacionamos. Eventualmente, com o tempo, um outro lugar social passará a ser também “casa”: familiar e descansativo.
Regressar traz-nos de volta às grandes amizades, à família, às relações significativas que dão sentido à vida.
No último ano, curiosamente, fomos forçados a viver todas estas adaptações, mas em nossa casa! Regressámos ao nosso quatro, a um intenso convívio com a família, a pequenas rotinas num ambiente tão fechado e a relacionar-nos virtualmente com os outros, no trabalho e no convívio. E esse ambiente, tão familiar, que anteriormente tinha sido um “porto seguro”, tornou-se pesado, monótono e difícil de suportar. Foi a aventura do confinamento, que nos fez desenvolver algumas resistências e competências que nem acreditávamos poder alcançar! Porque, normalmente, gostamos de regressar a casa, o nosso porto seguro, onde nos sentimos protegidos, o nosso lar.
Regressar traz-nos de volta às grandes amizades, à família, às relações significativas que dão sentido à vida. Um emigrante que regressa ao seu país; um estudante Erasmus que regressa do seu ano letivo no estrangeiro; uma criança que regressa do seu primeiro campo de férias (10 dias sem contactar com os pais!) Todas são experiências de descanso e repouso, pois deixamos de fazer esforço, podendo voltar a ser nós próprios, naturalmente.
Mas há também regressos que nos custam, a situações que gostaríamos de já ter ultrapassado (ou de nunca voltar a elas) como o regresso ao trabalho, a uma doença prolongada, a uma relação forçada ou conflituosa, à época de exames…
Mas há também regressos que nos custam, a situações que gostaríamos de já ter ultrapassado (ou de nunca voltar a elas) como o regresso ao trabalho, a uma doença prolongada, a uma relação forçada ou conflituosa, à época de exames… Estes regressos lembram-nos que a vida implica sacrifícios e, se queremos crescer, temos de sair da nossa zona de conforto e confiar na nossa versatilidade, para lidarmos com situações que nos são estranhas ou problemáticas, às quais temos que aprender a responder positiva e construtivamente.
Aproxima-se o famoso regresso às aulas, sempre tão publicitado pelos hipermercados que lançam as promoções do material escolar. Há uma preparação necessária, exterior e interior, para voltar a uma rotina desejada pelas famílias, e pelas próprias crianças e jovens, após o tempo de férias de verão. Confesso que nunca, em tantos anos de educador, tinha assistido a tanta alegria por parte dos alunos (de todas as idades) que desejavam tão ardentemente regressar à escola, após o confinamento iniciado em janeiro! O regresso às aulas, após as férias da Páscoa, quase parecia uma autêntica experiência de ressurreição! Ou de saída vitoriosa do túmulo! Talvez pela primeira vez na vida de muitos alunos, o desejo de voltar às aulas tenha sido tão forte que nunca mais se atreveram a dizer mal da escola.
O regresso às aulas deste ano será, esperamos, um regresso à vida! Uma nova ressurreição! Claro que lá estarão os mesmos personagens de sempre, mas encontraremos algo de novidade e expectativa boa, já que iremos conhecer novos colegas, estamos um ano mais velhos, temos saudades dos amigos, e também de alguns professores!… Mas o sabor deste setembro será especial, assim como o desejo de um ano “normal” habitará no coração de todos.
Regressar às aulas é voltar ao contacto diário e contínuo com uma comunidade de pessoas que conhecemos bem, muitas delas de quem somos amigos, voltar a um espaço que já vamos sentindo como “casa” e voltar a entrar num processo de crescimento, de aprendizagem, de desafios, de socialização. Haverá, mais do que nunca, a esperança de que este ano letivo não seja novamente interrompido a meio. Haverá, talvez, uma maior abertura e disponibilidade para as propostas de estudo, de trabalho, de criatividade, que todos iremos receber. Uma maior vontade de arriscar, de se comprometer, ou de colaborar com os outros. Bom regresso à Vida!
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.