“Pai quero ser deputado.” Uma pessoa até treme. A sorte é que nos dias que correm não há filho que ambicione tal coisa. Nem isso, nem ser presidente de uma distrital ou chegar ao topo de uma federação ou sentar-se na gigantesca mesa do comité central. Ser político é uma ambição de gerações antigas e fazer vida nos partidos desde pequenino é, no mínimo, ridículo. “Onde é que vais hoje à noite? Vou ali a uma reunião na jota… Eh pá, mas não digas a ninguém!” Ou será o fim de toda uma vida social. Política, partidos, debates, campanhas, são realidades tão distantes quanto a II Guerra: ouviram falar e parece que foi feio.
A política, ao contrário do futebol, ganhou mau nome em poucos anos, tem má fama. E foi num ápice. Hoje, alguém dizer que ambiciona ser político é como confessar que quer passar o resto da vida a jogar no casino, só que não tem estilo nenhum. Nem estilo nem moral, nem graça, nem interesse. É um mistério para os nossos jovens que alguém ambicione uma carreira na política. Acham genuinamente estranho.
E é esta a verdadeira crise que atravessa os estados do mundo Ocidental e as democracias liberais: não há novas gerações interessadas nos seus destinos.
Voluntariado no Ruanda, agricultura biológica no Chile, passar o resto da vida no Alasca em defesa do ambiente, viver num satélite, trabalhar num banco 18 horas por dia, não trabalhar e fazer surf, viver até aos 40 em casa dos pais, tudo isto é compreensível. Agora querer ser Primeiro-Ministro, Ministro, Presidente da Comissão Europeia, por exemplo, isso sim, é um disparate.
Já no mundo do futebol deu-se o movimento contrário. Se há uns anos a carreira de futebolista, de treinador, de agente desportivo ou afins era encarada como qualquer coisa que se passava entre uma vida dentro da taberna e os corredores da máfia – um verdadeiro pesadelo de uma mãe, que só queria que o filho estudasse e largasse a bola “para ser alguém”– hoje em dia, o futebol é uma carreira internacional altamente especializada, competitiva e de elite. O céu, o sucesso, estão ali. Entre o futebol e a astrofísica não restam dúvidas sobre a carreira mais promissora, quanto mais entre a presidência da Câmara de Ílhavo um lugar numa equipa da Primeira Liga com direito a cromo na caderneta da época.
São raros os jovens que saibam o nome de cinco políticos e que não desprezem a política (e já agora, na exata medida em futebolistas snobam os políticos e a política). E é esta a verdadeira crise que atravessa os estados do mundo Ocidental e as democracias liberais: não há novas gerações interessadas nos seus destinos.
Os nossos meninos acham que o bem comum se resume às questões ambientais e que a política não tem qualquer influência. Consideram o bom comum apenas universal e não local. Acham convictamente que a sua intervenção – a existir – deve ser global tal como é a economia e tudo o resto. Preferem o abstrato ao concreto, o digital à escrita em forma de post e a escrita ao discurso. Fogem do confronto e do debate, do desafio e do compromisso. Ou seja, afastam-se de tudo aquilo de que é feita a política. Sabem pouco de doutrina, de ideologia. E por isso não têm consciência que representam tanto: o seu passado e o seu futuro.
Dizem que é por a política estar tão mal frequentada que os nossos jovens se afastam, por não ser apelativa, porque ali não se reconhece o mérito, porque nos partidos funciona o cacique em detrimento do valor e da qualidade, perde-se tempo e dinheiro e porque, na verdade, não valem a pena todas as reuniões e conversas ocas. Mais vale estudarem e dedicarem a sua boa vontade, o seu tempo, energia e inteligência a outras causas públicas e humanitárias.
Só que não. A definição de bem comum, o nosso sacrifício pelo bem comum e estar ao serviço do bem comum, faz-se, por excelência, na Política, que é a atividade pública mais nobre de todas. E se hoje os nossos filhos não ambicionam ou não admiram a atividade política a culpa é principalmente nossa, que lhes mostramos inúmeros exemplos de podridão e decadência, em que os bons exemplos não contam e os maus chegam longe. Já no futebol, mostrámos o nosso Ronaldo. Hoje choramos porque Marrocos nos passou e não porque a Roménia nos ultrapassou.
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.