“Isto podia não ser tão seca como parece!”

Por que é que não ouvimos a sério a voz das crianças? Por que é que desprezamos tanto a experiência e a perspicácia dos alunos?  Se a sua motivação é a chave do sucesso da sua aprendizagem, de que estamos à espera?

Por gosto e dever de ofício, passo muitas horas por ano a ouvir os alunos. Eles têm uma voz cristalina que, apesar disso, conta muito pouco nas nossas escolas. Estão ali para aprender e pronto. São objetos do propósito escolar que, sem dúvida, representa um bem comum inestimável. Mas, porque é que não são plenamente sujeitos? E se fossem, não aprenderiam muito mais e melhor e não seriam melhores pessoas?

Este ano letivo passado, ouvi-os muito sobre a avaliação. Recolhi deles um manancial de orientações sobre o que fazer e como para se melhorar a avaliação pedagógica. Convido-vos a ouvirem a voz dos alunos, o essencial está aqui dito.

A finalidade: “A avaliação é importante porque assim sabemos o que é que podemos melhorar. Podemos esforçar-nos mais. Também serve para ajudar o próprio professor a conseguir ajudar o aluno. O professor pode ajudar, avaliando-o” (9º ano).

“Os testes servem para avaliar, mas os professores dizem que servem para reforçar os conhecimentos, porque estudamos em casa antes. Mas acho que não serve para isso, porque chegamos ao teste, estudamos a semana anterior, metemos os conhecimentos na cabeça, escrevemos no teste, passado uma semana já nos esquecemos. Devia haver um método de ensino melhor que fizesse com que os conhecimentos permanecessem na nossa cabeça” (8º ano).

A importância do envolvimento ativo de cada aluno na sua avaliação: “A autoavaliação é importante porque podemos dar a nossa opinião, podemos ser coerentes e pensar como fizemos as coisas. É muito bom por causa do feedback que o professor nos dá na conversa que temos como ele sobre a nossa autoavaliação” (9º ano)

“Acho que os trabalhos de grupo e as apresentações orais ajudam a reter muito mais informação. Acabamos por ficar mais envolvidos e ficamos a saber muito mais. E esforçamo-nos muito mais e retemos muito melhor quando estamos a fazer uma coisa de que gostamos” (8º ano).

Depois surge a enormíssima relevância da qualidade do feedback do professor, domínio onde se joga o essencial da avaliação pedagógica:
“Por vezes no feedback final as professoras dizem o que melhorámos e o que ainda podemos melhorar e assim nós também conseguimos evoluir. Se isto for muito vago, ficamos um bocado à nora. Isso devia acontecer com todos os professores” (8º ano) .

“Quando os professores dão feedback tem de ser específico para cada aluno, porque nós somos todos diferentes e temos dificuldades diferentes e de acordo com o feedback que nos dão, vão ajudar-nos a melhorar. Quanto mais específico o feedback, mais nos ajuda.(9º ano).

“Eu penso que esse feedback devia ser construtivo porque às vezes os professores dizem “nota-se mesmo que não estudaste nada” e às vezes estudámos e até nos esforçámos. Eu acho que os professores deviam fazer um comentário mais concreto e dizer no que é que podíamos melhorar, não dizer só que os teste está uma porcaria” (9º ano).

“Quando aqui cheguei há três anos havia vários professores que davam feedback no cabeçalho do teste e diziam onde tínhamos de melhorar ou onde tínhamos de insistir. Agora, sinto que perderam esse hábito e só fazem isso no fim do período” (9º ano).

Finalmente, os alunos dão inúmeras sugestões sobre as melhorias a realizar para melhorar a avaliação e as aprendizagens. Partilho estas:
“Podia haver formas mais apelativas de ensinar a pessoas da nossa idade, que fizessem com que nós memorizássemos mais facilmente. Por exemplo: fichas de questões-aula, jogos interativos, fazer perguntas diretamente à turma inteira, fazer com que toda a gente queira responder; abrir o manual, ler, fechar, explicar o que lemos ao colega do lado” (7º ano)

“Mas tornar as aulas mais interessantes implicaria que os professores estudassem os alunos, investissem muito tempo e tivessem imaginação. Com aulas diferentes teríamos mais alunos a quererem avançar, iríamos andar mais motivados e a pensar que isto não é tão seca como parece” (11ª ano).

“A interação com os alunos também é importante. Por exemplo, colocar questões e não se limitar a dar a matéria, pedir a opinião dos alunos, envolvendo-os” (12º ano).

“Tudo depende da forma de ser professor, da maneira como dá a matéria e como fala connosco. Por vezes, eu levantava a mão e era como se não estivesse lá ninguém. A matéria pode ser extraordinária, mas se a relação professor-aluno não for boa não adianta” (11º ano).

“Eu acho que os professores variam na avaliação porque há os que motivam os alunos e ajudam e outros que simplesmente não querem saber. Estão mais concentrados nos que têm melhores notas. A maneira como os professores cativam os alunos é muito importante” (9º ano).

Não é só com avaliações que nós somos avaliados. Tudo o que fazemos na escola é avaliado. Por exemplo, se eu não respeitar as regras, estou a ser avaliado. De todas mas maneiras estou a ser avaliado. Depende da avaliação o nosso futuro” (4º ano)

Ou seja, por que é que não ouvimos a sério a voz das crianças? Por que é que desprezamos tanto a experiência e a perspicácia dos alunos?  Se a sua motivação é a chave do sucesso da sua aprendizagem, de que estamos à espera? Assim, com este envolvimento ativo e contínuo dos alunos, o ano letivo que agora se inicia poderia vir a ser bem melhor!

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.