No último dia de aulas do ano letivo, na última aula desse dia, há, para os alunos de todas as idades, uma extraordinária sensação de liberdade e de alívio, expressado num grito de júbilo: “Férias!”. Sabem que chegou o momento tão esperado: o início das férias de verão. É uma sensação parecida à de terminar uma maratona que parecia nunca mais ter fim. Aquelas horas infindáveis a ouvir professores, a rotina de levantar cedo de manhã, a ansiedade dos testes e das avaliações, tudo isso termina com o início das férias. Subitamente, podemos desfrutar de tempo livre sem limites, podemos fazer planos, descansar até ser aborrecido e fazer coisas que nos dão prazer.
No final deste ano letivo, embora este dia tenha chegado para muitas crianças e jovens, a entrada em férias teve um sabor ligeiramente diferente. Por um lado, houve o alívio do fim das aulas online e da aprendizagem à distância, que tanto fez sofrer os alunos. Por outro lado, houve algo que não mudou: estávamos em casa e… continuamos em casa! Com o progressivo desconfinamento, é certo que se apresentam algumas possibilidades de sair para o exterior, programar férias em família, ou até com grupos restritos de amigos. Porém, tal como nas medidas restritivas aplicadas às aulas, também as férias deste ano serão diferentes, pois continuamos em ambiente de pandemia, de uso das máscaras e de medidas de contenção que devem seguir sendo aplicadas.
Muitas famílias terão receio de fazer férias longe de casa, expondo-se ao risco de frequentarem locais onde possam contrair o vírus. As viagens para o estrangeiro estão naturalmente mais limitadas. Os orçamentos familiares não terão a mesma folga de outros anos, já que a crise gerada pelo longo período de inatividade de empresas e negócios colocou muitas pessoas em situações financeiras delicadas. O contacto entre as diferentes gerações na própria família, como entre netos e avós, deve ser encarado com prudência e cuidados adicionais. Os tradicionais passatempos de verão em grupo, como os festivais de música ou os campos de férias foram cancelados, não tendo os jovens muitas alternativas de encontro com os amigos da mesma idade. Por estas e tantas outras razões, as férias deste ano em particular serão diferentes de outros anos.
Como fazer férias em tempos de Covid-19? Como sempre, podemos encontrar limitações causadas pelos cuidados de saúde a manter; mas encontramos também (como sempre, em tempos de crise) um leque de novas oportunidades para viver o tempo livre de forma mais construtiva e criativa.
Podemos começar por seguir um antigo slogan turístico nacional que dizia “vá para fora cá dentro”. A convicção de que, para conseguir um descanso de qualidade, temos que ir para longe, frequentar locais de férias luxuosos, ou conhecer outros lugares e contactar culturas diversas, pode ser disputada por um turismo mais caseiro, conhecendo o próprio país, o qual, bem o sabemos, possui paisagens e gentes variadas e de grande enriquecimento a todos os níveis.
A arte de conversar, escassamente praticada neste tempo, pelas vidas aceleradas que temos, poderá, nestas férias, ser um incentivo para aprofundar relações e aproximar pessoas.
Poderemos pensar em alternativas de descanso em família, mais simples, como caminhadas, desportos ao ar livre, exploração de zonas do país que nos são desconhecidas, etc. Foi longo o tempo que as famílias se viram confinadas em suas casas durante a quarentena, em muitos casos forçando um convívio intenso e continuado. Foi ainda manifesta a dificuldade de articulação, num mesmo espaço, entre pais em teletrabalho e filhos em aulas online. Esse tempo foi gerador de tensões e de algum desgaste nas relações familiares. As férias em família, estando agora todos disponíveis e em igualdade de circunstâncias, podem ser um tempo regenerador e até reparador das relações com os que mais gostamos.
A forma como se vive o tempo livre, visto como oportunidade, pode ser aproveitada para a redescoberta das conversas à volta da mesa, à beira-mar, ou em caminhadas noturnas. A arte de conversar, escassamente praticada neste tempo, pelas vidas aceleradas que temos, poderá, nestas férias, ser um incentivo para aprofundar relações e aproximar pessoas.
Finalmente, as férias podem ajudar-nos a reaprender a estar sozinhos, sem meios tecnológicos ou redes sociais, sem ruídos ou interrupções, diante de uma bela paisagem ou escutando o canto dos pássaros. Recuperar os hábitos de leitura, deixando guiar a nossa imaginação por uma corajosa aventura ou seguindo a trama de um romance. Encontrar tempo de qualidade para aprofundar a nossa relação com Deus, deixando que o silêncio da oração nos devolva a paz.
O grito de alegria “Férias!” abre, afinal, um infindável número de oportunidades para reestabelecer forças, aprofundar relações, enriquecer-nos culturalmente e aprofundar a nossa fé. Sejamos criativos!
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.