Demografia e natalidade: quem ficará cá para contar?

Devemos festejar o facto de as pessoas viverem cada vez mais. Mas não podemos ignorar que nascem cada vez menos pessoas em Portugal nem que, por consequência, a população esteja cada vez mais envelhecida.

Os factos: Portugal tem hoje menos 214.286 pessoas do que em 2011, o que se traduz numa redução de 2% que nem o saldo migratório positivo foi suficiente para inverter. O número de pessoas com 65 anos ou mais aumentou 20,6% nos últimos 10 anos e representa hoje 23,4% da população portuguesa. O grupo de pessoas até aos 15 anos de idade desceu 15,3% e representa hoje 12,9% do total. A população jovem em idade ativa (dos 15 aos 24 anos) desceu 5,1%. As pessoas com idades entre os 25 e os 65 anos diminuiu 5,7%. Por cada 100 jovens há 182 idosos em Portugal (em 2011 havia 128 jovens por cada 100 idosos e em 2011 havia 102). A relação entre a população ativa e o número de idosos passou de 4,1 em 2011 para 2,9 em 2020.

Se é verdade que é motivo para festejar o facto de as pessoas viverem cada vez mais, não podemos ignorar que nascem cada vez menos pessoas em Portugal nem que, por consequência, a população mais jovem esteja a diminuir, havendo uma população cada vez mais envelhecida.

As causas são várias, e vêm elencadas nos mais diferentes estudos e artigos que tratam esta matéria. Por um lado, parece existir um maior individualismo geracional, a que se alia uma hipervalorização do trabalho fora de casa, e uma desvalorização do trabalho informal e doméstico (ao qual não é atribuído valor económico). Creio que também não será alheio a este fenómeno uma erosão da família nuclear, que desincentiva o nascimento de mais filhos.

A tudo isto podemos ainda somar a liberalização do aborto que, naturalmente, contribui para que haja menos nascimentos. Por fim, e não menos importante, sendo até uma causa que alimenta as outras, existe um custo de vida elevado e salários baixos que levam a que haja dificuldades na obtenção de habitação e falta de perspetivas para os jovens que não veem como suportar os filhos que querem ter.

Estima-se que em 2070 sejamos 8,5 milhões de pessoas. Uma redução da população em idade de trabalhar e um aumento dos idosos numa economia que pouco ou nada cresce são sinais de alarme.

Estima-se que em 2070 sejamos 8,5 milhões de pessoas. Uma redução da população em idade de trabalhar e um aumento dos idosos numa economia que pouco ou nada cresce são sinais de alarme. A nossa identidade enquanto país é, também, e inevitavelmente, posta em causa. Para além das implicações civilizacionais e culturais surgem também problemas de sustentabilidade.

No que respeita à Segurança Social, corremos o risco de o país não ter quem trabalhe para suportar os custos das pensões e das reformas. Não obstante ser necessário criar incentivos para que outros modelos alternativos sejam prosseguidos convém não esquecer que, a manter-se o modelo atual, este tem que ser alimentado com um aumento da população ativa e, antes disso, com um aumento dos nascimentos.

No que respeita ao modo de enfrentar o problema demográfico em Portugal, é espantoso que num país como o nosso não se aborde o problema e que, paradoxalmente, se fale em reduzir a idade da reforma. Em temas como este, e antes que qualquer medida concreta seja tomada, é essencial que se gere um consenso generalizado para que as políticas demográficas continuem a ser prosseguidas independentemente de quem esteja no poder.

Uma primeira solução pode passar pelo aumento da imigração. Aqui, se é verdade que ajuda a resolver o problema, não parece que baste. E não basta, nomeadamente, porque não gera as contribuições fiscais suficientes que assegurem a sustentabilidade da segurança social. É, ademais, uma solução com alcance limitado.

Se a sociedade se apoia na família é importante que esta seja promovida para que aquela beneficie. Tem que se prescindir, portanto, de uma visão do indivíduo autossuficiente e independente de laços familiares como neutra ou até boa.

Outra medida é a de criar benefícios fiscais para quem tenha mais filhos. Tais medidas devem ser, a meu ver, especialmente destinadas às mulheres, que, como se sabe, são as mais prejudicadas profissionalmente quando decidem ter filhos. Isentando-se de impostos as mulheres que tenham mais filhos (como se fez, por exemplo, na Hungria) cria-se um incentivo para que se tenha mais filhos, para que, depois, as mulheres queiram voltar ao mercado de trabalho e para que seja menos dispendioso para as empresas empregar mulheres. Ao mesmo tempo, compensa-se o atraso na carreira que invariavelmente tem lugar quando se decide ter filhos. Teríamos uma medida verdadeiramente social que beneficia aqueles que contribuem para a sociedade com filhos, que, mais tarde, vão criar riqueza para o país.

Com efeito, do ponto de vista económico, o investimento familiar é, nos dias de hoje, irracional. Para além de ser marcado por um altruísmo assinalável, os filhos dão um sentido à vida que se deve fomentar. Na verdade, a promoção da riqueza e do sucesso profissional parecem ser pouca coisa para o ser humano. Há que honrar e dar prestígio aqueles que garantem o futuro do nosso país.

Por fim, tem que se fomentar tudo o que contrarie aquelas que são as causas que já apontámos. E para isto acreditamos ser essencial a promoção de políticas pró-família. É, por exemplo, essencial que se apoiem as famílias monoparentais que, na sua grande maioria, são lideradas por uma mulher. Se a sociedade se apoia na família é importante que esta seja promovida para que aquela beneficie. Tem que se prescindir, portanto, de uma visão do indivíduo autossuficiente e independente de laços familiares como neutra ou até boa. É com isto que se consegue criar uma maior solidariedade entre as diferentes gerações que veem nos avós e nos filhos os representantes que não se quer desapontar.

Fotografia – Carlo Navarro – Unsplash

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.