Cuidar, colaborar e comprometer-se: a cura para a Casa Comum?

As escolas da Companhia de Jesus, com a nobre missão de “educar mulheres e homens para e com os outros”, são terreno fértil para implementar ações concretas que coloquem em prática este cuidado da Casa Comum.

“A Terra está doente.” O diagnóstico ao nosso planeta já foi feito e são muitos os líderes mundiais e instituições que têm chamado a atenção para os graves problemas que enfrentamos na atualidade, como as alterações climáticas, a perda de biodiversidade, a escassez de água e a poluição. Estes problemas revelam os sintomas preocupantes na saúde da Mãe Terra e causam inúmeras vítimas.

Na encíclica Laudato Si’, o Papa Francisco refere a necessidade de uma “conversão ecológica” (216-221). No mês de setembro, na Rede Mundial de Oração do Papa, o apelo era evidente: “Rezemos pelo grito da Terra. Se medirmos a temperatura do planeta, dir-nos-á que a Terra tem febre. Que está doente, como qualquer doente”. O Papa adverte ainda que “cuidar da nossa casa comum, mesmo sem considerar os efeitos das mudanças climáticas, não é simplesmente um esforço utilitário, mas uma obrigação moral para todos os homens e mulheres como filhos de Deus”.

Já muito se escreveu sobre o cuidado da Casa Comum. Foram planeadas ações concretas, criaram-se associações, todas a acudir a este grito da Terra e ao do seu povo, especialmente os mais desfavorecidos, pois as alterações climáticas criam graves injustiças sociais e são os pobres os que mais sofrem. Mas ainda há um longo caminho a percorrer, pois, para muitos homens e mulheres, a surdez a este grito é ensurdecedora… A água descontrolada inunda a audição de muitos, os incêndios avassaladores turvam a visão de outros, enquanto o lucro desenfreado de alguns seca a terra de tantos!

O que fazer? Como podemos ser bons cuidadores da criação de Deus? Como podemos dar força à conversão ecológica? É urgente uma mudança de mentalidade, de comportamento, e assumir o compromisso de trabalhar pela resiliência das pessoas e dos ecossistemas em que vivem. Como referiu o Papa: “Temos de nos comprometer na luta contra a pobreza e na proteção da natureza, alterando os nossos hábitos pessoais e os da nossa comunidade.” Também o secretário-geral da ONU, António Guterres, fez um apelo urgente à ação onde evidenciou o estado precário do nosso planeta e frisou que “o caos climático e as crises alimentares são ameaças graves e crescentes à paz e à segurança global”, referindo que “é tempo de procurar soluções de compromisso”.

Nas Preferências Apostólicas Universais da Companhia de Jesus, a quarta é dedicada a este cuidado da Casa Comum e as obras inacianas são interpeladas “a colaborar com os outros na construção de modelos alternativos de vida, fundados no respeito à Criação e no desenvolvimento sustentável capaz de produzir bens que, distribuídos com justiça, assegurem uma vida digna a todos os seres humanos no nosso planeta”.

As escolas da Companhia de Jesus, com a nobre missão de “educar mulheres e homens para e com os outros”, são terreno fértil para implementar ações concretas que coloquem em prática este cuidado da Casa Comum. Então, numa educação que se quer integral, como podemos educar os alunos para serem pessoas realmente comprometidas com a justiça e transformação do mundo?

Formar pessoas comprometidas, e não apenas pessoas “com compromissos”, é um verdadeiro desafio para todos os educadores. Uma pessoa comprometida coloca o coração naquilo que faz e esforça-se por dar o melhor de si na missão que lhe foi confiada. Para além do respeito pelos princípios e comportamentos estabelecidos, implica envolvimento e esforço por um bem maior, neste caso, a Casa Comum que clama pelo comprometimento de todos os que a habitam.

Formar pessoas comprometidas e não apenas pessoas “com compromissos”, é um verdadeiro desafio para todos os educadores. Uma pessoa comprometida coloca o coração naquilo que faz e esforça-se por dar o melhor de si na missão que lhe foi confiada. Para além do respeito pelos princípios e comportamentos estabelecidos, implica envolvimento e esforço por um bem maior, neste caso, a Casa Comum que clama pelo comprometimento de todos os que a habitam.

Tendo bem presente a Pedagogia Inaciana e o nosso lema “Educar a cabeça, o coração e as mãos”, no 1.º Ciclo do Instituto Nun’Alvres, as Oficinas de Projeto, deste ano letivo, centram-se na preocupação ecológica e no envolvimento dos alunos neste cuidado pela Criação de Deus.

Neste projeto anual, os alunos do 1.º Ciclo desenvolvem atividades em quatro oficinas que se complementam entre si e têm como objetivo o desenvolvimento de competências fundamentais e transversais a todas as áreas do saber, como o pensamento crítico, criatividade, partilha de ideias e capacidade de trabalhar em equipa. Os alunos, divididos em grupos heterogéneos (do 1.º ao 4.º ano) trabalham de forma colaborativa e rotativa, em cada uma das seguintes Oficinas de Projeto (OP):

  • “Mãos à Consciência”: a sensibilização para as implicações da ação humana na Natureza ajuda a compreender o que está a acontecer à nossa Casa Comum e qual é a responsabilidade de cada um na recuperação da saúde do planeta. Nesta OP, são discutidas as problemáticas que desgastam e põem em causa a sustentabilidade da Terra e que, consequentemente, criam condições de instabilidade e injustiça social: as alterações climáticas, as ameaças à biodiversidade, o desperdício e esgotamento de recursos naturais. A partir da exploração de vídeos sobre sustentabilidade e preservação da Natureza, parte-se para a discussão e reflexão sobre as atitudes benéficas que cada um deve adotar e para o desenvolvimento de uma consciência ecológica, onde o ativismo não se confunde com vandalismo.
  • “Mãos à Horta”: a convivência com a Natureza é fundamental para que as crianças aprendam a cuidá-la e respeitá-la. Nesta OP, os alunos têm a seu cargo a manutenção da Horta Pedagógica, desde a sementeira até à colheita. Ao longo deste processo, as crianças cuidam das plantas e verificam o que é necessário para o bom desenvolvimento de cada uma. Realizam também um trabalho de pesquisa sobre as melhores condições e quais as espécies mais indicadas para serem cultivadas no meio em que se insere a horta, assim como os animais que têm uma ação benéfica para o desenvolvimento das plantas.
  • “Mãos à Ciência”: desenvolver experiências científicas simples ajuda a explicar conceitos relacionados com o clima, a compreender melhor a Natureza e como esta é afetada pela ação humana. Nesta OP, os alunos realizam experiências que lhes permitem conhecer melhor as plantas, os fenómenos naturais e as consequências da poluição.
  • “Mãos à Arte”: o desenvolvimento da criatividade aliado à educação ambiental, cria um elo entre as crianças e a Natureza de uma forma criativa, sustentável e divertida. Nesta OP, através da reutilização de materiais de desperdício, os alunos transformam objetos e criam “obras artísticas” com utilidade (por exemplo, com a elaboração de ecopontos, que serão utilizados em pontos estratégicos da escola).

Com esta ação educativa ambiental e integral, pretendemos que os nossos alunos se tornem agentes de mudança, cada um atuando na sua comunidade. Assim, estes gestos de mãos “pequenas”, cabeça consciente e coração comprometido, multiplicam as sementes que devolverão em prol da saúde da Casa Comum, assumindo a responsabilidade da humanidade como cuidadora de tudo o que Deus criou e nos confiou.

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.