A Escola precisa de propor uma aprendizagem que coloque o aluno no centro. A ideia não é a minha e a expressão não é nova. À primeira vista, não é uma afirmação que nos faça confusão. Faz sentido pensar que a aprendizagem deve ter o aluno como centro. Conseguimos perceber que se trata de uma aprendizagem pensada de acordo com as caraterísticas do aluno e para responder às suas necessidades. Quem é que seria capaz de dizer que não é isto que queremos que aconteça na Escola (e, por isso, nas nossas escolas)?
No entanto, estaremos nós verdadeiramente conscientes do que exige propor ao aluno que aprenda assim?
Olhemos para o que isto significa – o centro. Porquê? Porque me parece que a grande exigência de colocar algo no centro vem daqui: de só haver um. Centro só há um. Sim, é óbvio. Mas é essencial.
Quando colocamos algo no centro, significa que é importante, sim. Assumir isso muda a nossa perspetiva e os nossos critérios. Isto é, muda a forma como olhamos a nossa realidade e aquilo que fazemos e as razões pelas quais tomamos decisões – as pequenas e as grandes. No entanto, acho que colocar algo no centro vai para além disso. Se centro só há um, então, mais do que importante, aquilo ou aqueles que lá colocamos são a prioridade. Não apenas prioridade, mas a prioridade – aqui, o artigo definido faz mesmo diferença, não faz?
Na Escola, se a decisão é a de colocar o aluno no centro, então significa que queremos que aquilo que fazemos e lhe propomos o tenha a ele como a prioridade. A prioridade é o aluno.
Enquanto professora, não me sinto, de longe, uma especialista nisto. Na verdade, este tem sido um processo de tomada de consciência que tenho sido chamada a fazer. Por isso, tenho tido a oportunidade de confirmar como, efetivamente, a decisão de colocar o aluno no centro tem impacto na perspetiva que temos do que fazemos e nos critérios que usamos para tomar decisões. Tenho-me apercebido, de forma especial, da diferença que tudo isto faz nas perguntas que (nos) fazemos.
E depois? Vem a grande responsabilidade: a de ousar optar por isto. Isso é difícil porque, para começar, não foi assim que aprendemos. Depois, porque implica verdadeiramente que se opte. Não se trata de acrescentar ou adaptar o que já se fazia.
A propósito disso, tenho-me lembrado de como Jesus era especialista nisto – em mudar o centro e, assim, mudar a lógica e o sentido das perguntas que lhe faziam. Foi neste sentido que aprendi a ler com um novo olhar a parábola do Bom Samaritano.
Como? Jesus mostra que, quando estou eu no centro, me pergunto sobre quem é o meu próximo. Mas, quando decido colocar o outro no centro, já me pergunto sobre de quem é que eu me faço próximo; de quem é que eu me aproximo. Não é um mero jogo de palavras parecidas. A lógica é completamente diferente – e tudo porque o centro mudou.
Não pretendo trazer o Samaritano até à Escola. Mas esta diferença mostra-me a importância de trazer perguntas diferentes.
Para isso, por onde é que se começa? Por não esquecer de que centro só há um. Logo a seguir? Diria que é preciso perceber que, se é o aluno que está no centro, não é outra coisa. Se está o aluno no centro, não está a disciplina que leciono. Então, não se trata de perceber e optar por aquilo que beneficia a minha disciplina, por aquilo que sempre se fez nessa área ou pela forma como sempre se ensinou esses aspetos do currículo.
No meu caso? Tenho em mãos uma tarefa difícil: a de perceber como é cada aluno pode crescer melhor com a ajuda das competências que a Matemática desenvolve – que, não duvido, desenvolve e bem! Sou chamada a descobrir como é que a Matemática pode ser veículo para que cada um dos alunos cresça de forma mais completa. Não se pretende reduzir a Matemática ou ignorar a importância que pode ter. Trata-se de a colocar no sítio certo – que, neste caso, não é o centro, mas o de contribuir para o aluno, que é quem lá está.
Afinal, mais do que ser professora de Matemática, sou chamada a ser Professora – arrisquei escrevê-lo com letra grande, não por achar que esta profissão me faz maior, mas por ter a convicção de que se trata de um missão maior do que eu e, neste caso, do que a Matemática.
E depois? Vem a grande responsabilidade: a de ousar optar por isto. Isso é difícil porque, para começar, não foi assim que aprendemos. Depois, porque implica verdadeiramente que se opte. Não se trata de acrescentar ou adaptar o que já se fazia. E, para além disto, porque exige que se tenha como centro cada um dos alunos e não uma imagem única de “aluno modelo”, que serviria apenas em termos teóricos. Mas isso são ‘dezenas de centros’, não? Sim. É, de facto, exigente. Mas, apesar de só haver um centro, há a certeza de que não sou só uma; de que isto se faz juntos, enquanto Professores – lá está, com letra grande. Somos chamados a muito, mas não sozinhos.
Pode soar estranho, mas, geometricamente, há uma ideia que me ajuda a ter isto mais claro. Se o centro de uma figura muda, tudo muda. Então, preciso de uma folha nova para desenhar tudo de novo. E posso decidir olhar para essa mudança de duas formas: pelo trabalho que se tem para desenhar tudo de novo – que é real – ou pela oportunidade (e, atrevo-me, privilégio) de poder desenhar numa folha nova. Eu escolho a segunda.
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.