Entrámos numa nova década e nas últimas semanas, provavelmente fizemos algum tipo de propósitos para o novo ano: mais exercício físico, ter mais tempo para mim, ler aquele livro ou ligar àquela pessoa. Contudo, se vimos as notícias logo depois dos espetáculos de fogos de artificio em todos os cantos do mundo, parece que as novidades do novo ano cheiram a velho: os fogos continuam a destruir a Austrália, aumentou a tensão nas relações do Ocidente com o Irão, a Venezuela continua em estado de sítio, as guerras na Líbia, Gaza, ou noroeste da Índia continuam sem fim à vista, ou a violenta morte de um jovem em Bragança, que se tornou em mais um caso para fazer política que na oportunidade para condenar qualquer tipo de violência.
Talvez as nossas escolas ainda não tenham a solução imediata para acabar de uma vez com os crimes contra a ecologia ou os conflitos entre Estados ou a violência xenófoba, racista ou de género. A solução imediata, talvez não. Mas a educação para uma cultura de paz, justiça e liberdade, isso, sim.
E se as nossas escolas fossem mesmo lugares seguros, de alegria e criatividade? E se fossem mesmo lugar de encontro e amizade, de estímulo do que há de melhor em nós? Para tantos Alunos e Educadores a escola é, sem nenhuma dúvida, um lugar assim: um lugar pelo qual estamos apaixonados e onde damos o nosso melhor, muito além das horas que lhe devemos e da burocracia que os anos foram aumentando à arte de educar.
Por isso mesmo é que as escolas podem ser lugares para encontrar soluções que, não sendo imediatas, são duradouras. E se este reinício de ano fosse o tempo para os propósitos que, como as ondas do lago que se alargam ao redor da pedra, despertam em todos esses desejos de um mundo melhor?
Aqui fica um decálogo para fazer deste ano realmente um ano novo:
1. Saber o nome dos Alunos
Lembrar-me que cada Aluno é uma pessoa, com um nome e uma história, e não só um número ou um rosto anónimo, no meio de tantos. Quando conhecemos alguém pelo nome, criamos uma relação e, tantas vezes, estima e amizade.
2. Personalizar o espaço
Como é bom chegar a um lugar familiar, em que sentimos que podemos ser a melhor versão de nós mesmos. Criar um espaço em que todos se sintam bem-vindos é um convite ao acolhimento.
3. Abrir o baú da criatividade
A rotina dos dias pode levar a repetir fórmulas que já não servem e que desmotivam quem ensina e quem aprende. Mas voltar aos tempos em que o trabalho se preparava com gozo e originalidade pode quebrar essa monotonia.
4. Sorrir, mesmo quando não apetece
Ninguém é de ferro e, às vezes, a vida fora da escola também não corre de feição. Mas já todos sabemos que um ar carregado e um semblante fechado não resolvem os problemas a ninguém nem facilitam a vida. Talvez o meu sorriso faça a diferença na vida de alguém.
5. Fomentar boas conversas
Quando andamos à pressa ou cansados, é mais fácil queixarmo-nos ou deixarmo-nos levar por conversas superficiais ou, até, maledicentes. Mas não há nada melhor que entrar num espaço onde as pessoas sorriem e as conversas promovem o bem e a boa disposição.
6. Convidar alguém para um café
Passamos muitas horas juntos e a correr entre aulas e as filas do bar ou da cantina. Mais difícil é tirar tempo gratuito para saber como tem corrido a vida àquele colega. E como em tempo de aulas não se pode convidar para um copo, que se leve alguém ao café, que é sempre momento para boas conversas.
7. Reparar nos detalhes
A sala que está limpa, a comida que está preparada, as fotocópias tiradas a tempo são tudo pequenas coisas que fazem a vida numa escola mais simples. E tantos outros pormenores sem nome nem momento e que pedem olhos atentos para os saber reconhecer.
8. Agradecer o trabalho dos outros
Porque quem se esforça por ver o mundo com olhos atentos, também aprende a agradecer. A gratidão faz-nos dependentes de outros e, ao mesmo tempo, põe-nos no lugar justo, sem vaidades nem exageros.
9. Fazer sem esperar recompensa
Quem se sabe no seu lugar, também sabe fazer o bem generosamente e sem holofotes. Às vezes, basta apanhar aquele papel do chão ou desligar o interruptor. Outras vezes, é dar mais tempo, mesmo que a custo, sabendo que o fim é um bem maior que esse esforço.
10. Aprender coisas novas todos os dias
E para que tudo isto funcione e se alastre, como aquelas ondas no lago depois da pedra atirada, é preciso continuar a aprender, a deixar-se surpreender pela beleza dos dias, a alimentar a curiosidade própria de se ser humano.
Dir-me-ás: como é que dar a vez a alguém que passa no corredor pode acabar com a violência num país distante? Ou como é que pôr o papel no cesto azul atrasa as alterações climáticas? Pois, eu respondo-te: já viste onde terminam as ondas provocadas por essa pedra que acabaste de atirar ao lago?
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.