Teachers leave the kids fly alone

O Amor e a Esperança são a força do motor da aeronave onde ajudámos a pôr a bagagem que cada um construiu e que levará consigo pela vida fora.

Muito se escreve sobre as gerações actuais de alunos e suas características. Normalmente diz-se que têm pouca curiosidade e que estão desatentos e indisciplinados nas aulas, só lhes interessando verdadeiramente o “chat” com os amigos e/ou os jogos de computador, conforme a idade. Do nosso ponto de vista é difícil fazer um retrato estereótipo “do aluno”, mas das características do tempo em que eles e nós vivemos, podemos apontar algumas que sejam comuns.

A principal característica em que nos vamos apoiar para falar de educação hoje é a da MUDANÇA PERMANENTE de tudo o que nos rodeia. Não é fácil prever o mundo que os espera quando saírem da Escola: não terá a mesma estrutura, nem os mesmos empregos nem a mesma forma de comunicação…

Que faremos então para falar de Educação? Não falaremos decerto em amestrar e conduzir, nem mesmo ensinar no sentido em que até hoje tomávamos o termo.

O desafio é agora de preparar o voo com a dificuldade de não sabermos quais os climas e locais que a aeronave vai encontrar,

Educar será preparar as crianças e adolescentes para viverem na mudança de paradigmas encontrando dentro si, do seu foro interior, o fio condutor e as  referências que os farão ficar seguros na mudança e, seguir o rumo que os faz seres realizados, como se, para a corrida da vida, só tivessem uns sapatos bem ajustados que servissem para qualquer tipo de caminho ou uma aeronave que voasse em qualquer atmosfera.

O que é extraordinário é que enquanto estávamos a pensar qual a bagagem que deveríamos, como professores, ajudar a carregar nesta sua viagem, esbarrámos mental e intuitivamente com o escrito do frontão do templo de Delfos, adoptado por Sócrates: “Homem conhece-te a ti próprio”. Educar poderá ser, então, ajudá-los a construir a sua própria bagagem, aquela que serve para qualquer ocasião e em qualquer ambiente, terno ou hostil, tendo-se a si próprio como uma estrutura sólida.

Educar poderá ser, então, ajudá-los a construir a sua própria bagagem, aquela que serve para qualquer ocasião e em qualquer ambiente, terno ou hostil, tendo-se a si próprio como uma estrutura sólida.

Por parte dos professores, o que acima está dito, requer atitudes, quanto a nós, muito difíceis: desinstalação do sistema em que fomos educados e treinados, mudança para uma planificação de aulas mais flexível, mais atenção a cada um dos alunos, capacidade para aceitar toda a sua criatividade e exigência na participação e, uma combinação dialéctica entre competências e conteúdos. Neste contexto, deixa de ser possível encontrar regras rígidas, estáticas e permanentes para estabelecer na Escola e na sala de aula: adaptar-se-iam a poucos e durante pouco tempo. Os Professores estão simultaneamente a reeducar-se nesta nova interacção com os seus alunos. Parece inseguro?  Sim, mas o que parece pode não ser e o desafio traz uma enorme felicidade ao mesmo tempo que um grande esforço. É uma questão de vermos quais os “objectos” que ajudávamos a pôr na bagagem. Escolhemos os seguintes sem pretensão de sermos exaustivos:

Primeiro – Reconhecimento de si e dos outros enquanto pessoas

Segundo – Conhecimento das suas aptidões, gostos e dificuldades

Terceiro – Autonomia – capacidade de decidir por si e de ser coerente na decisão

Quarto – Capacidade de escolher, criticar e hierarquizar valores

Quinto – Apreciar a beleza

Sexto – Estar disponível para o Acaso

Sétimo – Cultivar a criatividade

Oitavo – Amor e Esperança

Para não ser um discurso muito teórico propomos algumas actividades, já experimentadas com êxito e, que ajudam a construir os “objectos” da bagagem:

1.    Em cada turma são os alunos com o professor a fazer um regulamento que abrange toda a relação entre todos (professor incluído). Este regulamento não visa só aspectos de respeito disciplinar, mas também da forma como se processam as aulas e, o que cabe a cada um, professor e aluno. Exercita, também, o sentido de responsabilidade.

2.    A avaliação, depois de estabelecidos entre todos os tipos, momentos e peso, é feita pelo professor, pelo aluno e pela turma em conselho (hétero, auto e co-avaliação). Este item é duma extrema importância, na medida em que provoca um auto-conhecimento das capacidades e incapacidades e, na prática, faz cada um perceber o que consegue e respeitar as capacidades dos colegas. Exige, também, que o professor se mostre com autoridade, mas nunca autoritário (a avaliação não é um exercício de poder)

3.    A planificação é construída pelo professor e homologada pelos alunos, tendo sempre e obrigatoriamente, momentos vazios para a introdução de actividades que surjam por sugestão dos alunos, da Escola ou da Sociedade (ex.: um filme, uma exposição…). Na planificação devem estar sempre presentes momentos de intervenção dos alunos, como preparação de temas para apresentarem e para intervenção crítica sobre qualquer actividade.

Depois do que dissemos e da exemplificação, embora incompleta, que fizemos, não esqueceremos de mencionar o Amor e a Esperança com que começamos cada ano lectivo e, que estando sempre presente, nos preenchem mesmo nos momentos mais difíceis por que todos temos de passar. O Amor e a Esperança são interstícios de todas as actividades e de todos os momentos e devem ser o ambiente que se sente sem ser traduzido por nenhum discurso. São a força do motor da aeronave onde ajudámos a pôr a bagagem que cada um construiu e que levará consigo pela vida fora.

Saberemos “deles” de vez em quando e, teremos a certeza de que também fomos na bagagem que ajudámos a construir.

 

* A Autora não escreve segundo o novo acordo ortográfico.

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.