Mais um novo ano letivo que se inicia, acompanhado por mudanças, desafios, surpresas, receios. Desta forma, torna-se pertinente refletir sobre esta fase de mudança. A transição para um novo ano letivo implica mudanças em quem? Alunos/estudantes? Pais/Encarregados de Educação? Professores? Como encarar a mudança de forma positiva? Como promover a adaptação ao novo ano, e consequentemente a aprendizagem e o desenvolvimento das crianças e dos jovens?
Antes de mais, importa referir que o presente texto partilha reflexões e aborda a transição para um novo ano letivo de uma forma genérica, isto é, sem especificar as particularidades que cada ciclo de estudos acarreta.
Assim, genericamente, para muitos estudantes, o início de um ano letivo pode implicar transições muito diferenciadas, isto é, corresponder à mudança para um novo ciclo de estudos, novas disciplinas e/ou para uma nova escola, com novos colegas e docentes. Perante estas circunstâncias, quer os estudantes, quer os pais/Encarregados de Educação criam expectativas e inquietações sobre como será o novo ano. Podem questionar-se: “será que conseguirá adaptar-se a esta transição?”, “conseguirá acompanhar os conteúdos?”, “conseguirei acompanhar o/a meu educando/a nesta nova etapa?”, “o que poderei fazer para o/a ajudar?”. Perante estas preocupações, e no sentido de ajudar estudantes e pais/Encarregados de Educação a lidar com as mudanças inerentes ao novo ano letivo, lançam-se três pontos que poderão ser úteis à reflexão.
Algumas pessoas podem encarar a transição e as suas mudanças como um problema, uma dificuldade, em que se esperam obstáculos e se expressa ansiedade exagerada, debilitante.
Um primeiro ponto remete para o que é transitar. Ao consultar dicionários de língua portuguesa, a definição de transição considera a passagem de uma situação para outra, bem como se associa a palavras como mudança, transformação e evolução. Tal é alinhado com o modo como autores nos domínios da Psicologia e da Educação percebem a transição, pois reconhecem-na como um processo natural na vida, em que ocorrem mudanças que são percebidas de forma subjetiva, conforme as competências e as experiências de cada um. Algumas pessoas podem encarar a transição e as suas mudanças como um problema, uma dificuldade, em que se esperam obstáculos e se expressa ansiedade exagerada, debilitante. Outras pessoas podem encarar a transição como oportunidade de aprendizagem e desenvolvimento, em que se revela curiosidade, entusiasmo, motivação. É importante realçar que estudos realizados por especialistas sugerem que pessoas com uma visão mais otimista tendem a apresentar maior satisfação com a transição e adaptam-se melhor às mudanças.
Além disso, poder recorrer ao apoio de figuras significativas (como pais/Encarregados de Educação, outros familiares, docentes, colegas) contribui para uma transição bem-sucedida. Há vários tipos de apoio, podendo destacar-se: o apoio informativo (como partilhar informações sobre como é o novo ciclo de estudos ou a nova escola); o apoio instrumental (como exemplificar como chegar à escola de transporte público ou se disponibilizar material escolar); e o apoio emocional (como revelar preocupação, empatia e encorajamento). Deste modo, a partir do conceito de transição, sobressai a importância de estudantes e pais/Encarregados de Educação refletirem sobre como estão ou podem encarar a transição, e de que apoio podem beneficiar, se necessário.
Um segundo ponto alude à relação entre família e escola. Pais/Encarregados de Educação, professores e estudantes admitem que nem sempre é fácil construir e manter esta relação. Tal pode dever-se a vários motivos, como falhas na comunicação; horários e exigências de trabalho que dificultam a disponibilidade de ambas as partes; ainda estereótipos e juízos de valor que minam as interações. Acresce que a relação entre família e escola muda consoante a etapa de desenvolvimento ou de transição que o/a estudante enfrenta. Apesar destes desafios, a investigação mostra que é essencial família e escola se assumirem como co-responsáveis pelo percurso educativo dos estudantes. Quando se aposta numa relação caracterizada por envolvimento, respeito e cordialidade, há benefícios para o estudante, tanto ao nível do seu aproveitamento escolar, como da sua disposição para colaborar e ajudar o próximo. Família e escola devem colaborar no processo de aprendizagem e desenvolvimento dos/as estudantes, pelo que faz sentido colocar a seguinte questão: O que pode ser feito para estreitar relações profícuas entre família e escola? Entre várias respostas possíveis, pode destacar-se a necessidade de família e escola conhecerem e refletirem sobre a complementaridade dos seus papeis, ainda que diferentes. Diferentes porque da família se esperam condições básicas de vida, amor e saúde, necessárias para ser possível aprender; e da escola se esperam práticas pedagógicas ajustadas às necessidades dos estudantes e ao currículo. Complementares porque família e escola educam – juntas contribuem para a formação de cidadãos, com espírito crítico, solidariedade e tolerância, essenciais à vida em sociedade. Ao mesmo tempo, escola e família devem acertar formas viáveis de comunicação entre si e interagirem não só quando o estudante revela dificuldades, mas sobretudo perante sinais de progresso ou quando se detetam sinais de preocupação para concertar estratégias educativas. Importa, igualmente, que família e escola respeitem diferenças culturais e experiências únicas de cada pessoa. Ao reconhecer que uma mesma situação pode suscitar várias interpretações, e que essas interpretações, por sua vez, podem ter por base ideologias culturais ou experiências anteriores, emerge abertura para dialogar e acordar formas para avançar em sintonia. Assim, pode ser útil pais/Encarregados de Educação e profissionais nas escolas refletirem sobre como podem estreitar a relação entre si, tornando-a mais eficaz, satisfatória e benéfica para os estudantes.
Quando se aposta numa relação caracterizada por envolvimento, respeito e cordialidade, há benefícios para o estudante, tanto ao nível do seu aproveitamento escolar, como da sua disposição para colaborar e ajudar o próximo.
Um terceiro ponto, não menos importante, prende-se com a necessidade de se considerar, num processo de transição, as especificidades desenvolvimentais de quem transita, assim como as características dos diferentes tipos de transição. A investigação mostra que as competências pessoais de quem transita assumem um papel crucial neste processo. É importante um estudante conhecer-se, aceitar as suas competências, procurar ajuda para ultrapassar as suas limitações, encarar a transição como um desafio e enfrentá-la como uma oportunidade para se desenvolver. Competências como autoconhecimento, autoconceito, autoestima, gestão emocional, autorregulação, capacidade de tomada de decisões, persistência, assertividade são referidas pelos especialistas como cruciais para o desenvolvimento, de uma forma geral, e para a transição, de uma forma particular. Ao mesmo tempo, à medida que a transição ocorre em níveis de ensino diferentes, os vários intervenientes apresentam responsabilidades específicas neste processo, que só o diálogo e a interação permitirá aferir.
Concluindo, transitar é um processo de mudança que, quando encarado como um desafio, quando os vários intervenientes colaboram e cooperam, corresponde a uma oportunidade única de desenvolvimento pessoal, familiar e organizacional.
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.