O Outro em mim

Estou constantemente à procura de Jesus nos outros. Se calhar, deveria antes pensar que exemplo de Jesus sou ou quero ser para os outros.

Gosto de pensar que, para além de ser fruto da educação dos meus pais, sou também fruto da relação com os que estão à minha volta. E que novidade este pensamento traz na minha relação com Jesus?

Naturalmente a maneira como agimos com outras pessoas é resultado daquilo que aprendemos em casa. Desde pequeninos olhamos para os nossos pais como referência e exemplo a seguir: como nos devemos comportar, o que devemos ou não fazer, ou dizer. Quantas vezes olho para a minha maneira de falar e revejo a minha mãe; ou mesmo quando me revejo nos meus irmãos… A convivência diária leva-nos a adotar pequenos hábitos uns dos outros e assim vamos mudando e crescendo ao longo do tempo.

Mas não só a família. Os nossos amigos, de certa forma, também influenciam a nossa maneira de ser. Talvez porque têm algo para nos ensinar, uma maneira nova de ver as coisas, uma reação a uma situação perante a qual não saberíamos responder. Mas pode também ser o oposto: algo que nos deixe mais desconfortáveis ou acabemos por chegar à conclusão que provavelmente, naquele contexto, teríamos agido de maneira diferente.

E quando penso sobre isto, e na novidade que os outros trazem à minha vida, pergunto-me: se fosse Jesus, o que é que teria feito naquele lugar? Se calhar, estou constantemente à procura de Jesus nos outros. Se calhar, deveria pensar que exemplo de Jesus sou, ou quero ser para os outros.

Mas não é só nos que estão mais perto que posso encontrar Jesus. Quando veio à terra, o que Ele mais procurava era ajudar e chegar aos que estavam mais longe, aos que a sociedade afastava, aos que eram rejeitados – podemos recordar a passagem da cura do leproso (Mt 8,1-4), ou quando deu a mão a Maria Madalena (Jo 8,1-11) -. Cada um de nós pode tentar ser Jesus assim, estando atento ao mundo, interessando-se pelas histórias e situações de cada um, de cada nação, como por exemplo ao procurar ajudar refugiados que chegam a outra cidade, a outro país.

Se calhar, estou constantemente à procura de Jesus nos outros. Se calhar, deveria pensar que exemplo de Jesus sou, ou quero ser para os outros.

Enquanto pensava sobre o tema deste artigo e começava a escrever as primeiras linhas, ouvi um episódio do podcast “Aquele que habita os céus sorri”, da autoria do padre António Pedro Monteiro, que ainda me desafiou mais na minha relação com “os outros”. Ouvi a sua perspetiva sobre a importância de não rotular o próximo pela sua condição, por exemplo, não me referir àqueles que não têm liberdade como “os presos”, mas sim como “as pessoas que estão presas”; não pensar naqueles que fogem do país por causa da guerra como “os refugiados”, mas sim como “as pessoas que estão refugiadas”. Porque antes de qualquer condição, está uma pessoa, igual a mim, com os mesmos direitos.

Neste início de Quaresma São Paulo, na sua carta aos Coríntios, recorda-nos que “este é o tempo favorável”. É o tempo favorável para sair de mim para ir ao encontro dos outros, mais uma oportunidade de recomeçar.

Ao dar-me ao próximo sem esperar nada em troca, ao perdoar, ao não julgar talvez assim esteja a ser mais Jesus para o outro. E voltando à questão “o que faria Jesus se aqui estivesse?” Acredito que a cada um de nós nos sopraria a melhor resposta, na certeza de que continuaria a gostar de mim independentemente da condição em que eu estivesse, independentemente de me dar gratuitamente, independentemente de julgar o outro, independentemente de pecar, independentemente de tudo.

A isto chamo fé. E consigo perceber (e sentir!) que é um fator de mudança na minha maneira de estar. Quase como se fosse uma amiga que me ensina o melhor que sabe para assim eu O levar aos outros. É esta a novidade Jesus me  traz!

 

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.