Educação em Portugal: resistir ao totalitarismo do Estado

As famílias pagam os seus impostos. Porque têm elas, então, de ficar sujeitas ao que um Estado lhes impõe, em prejuízo do direito de exercerem responsavelmente a liberdade de escolha no que à Escola para os filhos diz respeito?

O cidadão: sujeito ou objeto da política?

Quando na política, e em particular nas politicas educativas, um cidadão não é sujeito, será necessariamente seu objeto.

A última grande luta de cidadãos pela liberdade de educação, travada há dois anos, foi objeto de ideologizada ridicularização por parte da comunicação social, ao identificar de forma premeditada liberdade de educação com contratos de associação e privilégios injustos para alguns que despudoradamente pretendiam enriquecer e explorar o Estado. Todo esse processo desembocou na identificação, perigosa para qualquer democracia e para liberdade, entre o domínio público e o estatal. Que regimes terão interesse em tal identificação? Os regimes totalitários: na sua versão nacionalista de Salazar, na versão internacional-comunista de Estaline. A educação controlada por um Governo prestador único de serviço público é uma forma de esse Governo formatar cidadãos para o pensamento único, gerador de rebanhos submissos e controláveis.

É muito difícil, mesmo em democracia, lutar contra Governos que, embora legitimamente eleitos, decalcam da ideologia o seu modo de governar. Neste modo de exercer a política, tudo pode ser justificado e legitimado com o facto de uma maioria saída de eleições democráticas poder expressar-se em legislação congeminada pelo órgão soberano de um povo. Pode essa ser legítima; o problema é se não será ela imoral. Com efeito, nem tudo o que é legal é moral. E quando as políticas se limitam aos ciclos temporários de processos eleitorais, o que fica em risco é o futuro de um país.

É fundamental, numa sociedade democrática, a pluralidade de projetos educativos. Uma pluralidade que o Estado, por si só, não conseguirá oferecer, porquanto o seu produto é previamente formatado e anquilosado por procedimentos legais e administrativos que tenderão a manietar todo o sistema educativo – ou não fosse essa a única forma pela qual, entregue a si mesmo, o Estado sabe exercer o seu poder e ação.

A liberdade na educação

Em Portugal, no momento presente, os cidadãos não têm liberdade para optar por um Projeto Educativo. O Governo resolveu, despudoradamente e contra o que estipula a Constituição da República Portuguesa, humilhar e, se possível, eliminar qualquer Escola que não seja a sua. Segundo os defensores de um Estado prestador de serviços – e não de forte Regulador, como deveria ser –, o seu Projeto Educativo é o único legítimo, democrático, moralmente válido, porque “neutro” e, por isso, não ofensivo para qualquer cidadão.

Mas, existe uma educação neutra? Não, nunca: em parte alguma existe uma educação neutra. A não ser que uma Escola não tenha, no seu Projeto Educativo, uma ideia do que significa ser pessoa! A chamada educação neutra é uma falácia.

Nem se diga que a “única escola democrática é a do Estado”. Como é isso possível, se tudo é mandado e controlado pelo poder central? Mais uma falácia!

O que deveria, então, interessar na Educação e numa Escola? A qualidade, traduzida na defesa daquele que é o centro do processo educativo: a pessoa do Aluno. O que acontece hoje em Portugal? Fez-se da Escola um foco de luta de classes, um chamariz para manter ou derrubar Governos.

A injustiça da dupla tributação

Na situação atual, uma família que opte por um projeto educativo diverso de uma escola pública estatal paga esta e aquela. Ou seja, ensino público está ideologicamente identificado com ensino estatal. Depois, o que a ideologia do estatismo faz passar para o cidadão comum é que estatal é bom, impoluto, sem pecado original, e o que não for estatal, i.e. privado – palavra que parece tabu –, é tudo o contrário de estatal. Sabemos bem o que o estatismo faz a um país. Os regimes ditatoriais mostraram-no e comprovam-no com exemplos condizentes. Depois do 25 de Abril, a liberdade não chegou ainda à Escola!

As famílias pagam os seus impostos. Porque têm elas, então, de ficar sujeitas ao que um Estado lhes impõe, em prejuízo do direito de exercerem responsavelmente a liberdade de escolha no que à Escola para os filhos diz respeito? Coartar esse direito equivale a passar um atestado de menoridade às famílias. Como lutar contra esta injustiça? Será indiferente os filhos estarem numa ou noutra Escola? No final do processo educativo, um Aluno será o mesmo quer frequente um tipo de Escola ou outro? Não será! Por que motivo a maioria dos grandes decisores e defensores da Escola estatal pública não a querem para os seus filhos? Porque não podem as famílias com menos recursos económicos optar, em igualdade de condições, por um Projeto Educativo? Porque querem os decisores políticos atuais fazer de um Projeto Educativo não estatal um exclusivo das famílias ricas, onde também eles se incluem? Não há lógica de pensamento democrático nesta forma de pensar…

As famílias e a Escola católica

As Escolas católicas querem ser inclusivas, não fazendo qualquer discriminação em termos religiosos, sociais, políticos e sociais. Se assim não fosse, iriam contra a sua própria essência, contra a sua origem histórica. Todavia, hoje em dia, em Portugal, a sua sobrevivência é extremamente difícil porque, dado o que em cima se disse, são somente toleradas e tudo se faz a nível político para que, através das dificuldades que se vão criando e inventando, o desânimo seja nelas uma realidade.

Estas Escolas fazem falta à sociedade e ao mundo atual. A ideia de pessoa que nelas se pretende construir contribuirá, acreditamos, para a estruturação de um mundo melhor.

As Escolas católicas serão por isso – como se questionou ainda há pouco numas Jornadas – um luxo ou uma necessidade? Que responsabilidade têm os cristãos pela sua existência, defesa e promoção? Deixar tudo nas mãos das próprias Direções das Escolas é fardo demasiado pesado para elas. A sobrevivência da Escola católica passa em primeiro lugar pelo plano político. Todavia, a sua vida corre perigo sem uma união entre os cristãos e as Associações de Pais destas Escolas.

Os cristãos não são cidadãos de segunda. Têm de assumir as suas responsabilidades em matéria de políticas educativas. Serem-lhes elas indiferentes, significa conceberem-se como objetos e não sujeitos do seu “destino”. Não é indiferente um Aluno ser ou não educado num Projeto educativo cristão. Além de diferente, queremos acreditar que o Projeto educativo cristão é também indispensável à sociedade democrática, plural e inclusiva. A nível de políticas educativas, esse projeto tem de permanecer ao abrigo do direito de opção para os pais, não podendo nem devendo ser penalizado através do duplo pagamento. Além disso, as Escolas com Projeto educativo cristão têm de continuar a ser opção para todas as famílias, sejam elas cristãs ou não.

Os Alunos são filhos dos pais e não do Estado. Ninguém mais do que os pais quer o melhor para os filhos. O Estado-educador e prestador de serviços, monopolista da Escola de um país, além de comprometer atavicamente a liberdade, é caminho inexorável para a perda de qualidade da Escola e para que os lobbies que à sua volta vão gravitando se continuem a locupletar à custa dos impostos dos cidadãos.

A única forma de se garantir a democracia no sistema educativo é possibilitar a quem tem o dever-direito de educar, a Família, ser livre na escolha do projeto educativo que considere mais adequado para os filhos(as).

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.