Cuidar do (c)oração para ver a Deus

Este ‘processo’ pode dizer-se que requer discernimento, identificar e reconhecer os momentos de consolação e de desolação que vivemos no nosso dia-a-dia, perceber onde é que nos aproximamos e onde é que nos afastamos d’Ele.

Na visita das mulheres ao sepulcro, Jesus disse-lhes para irem anunciar aos discípulos que tinha ressuscitado, fazendo-lhes a promessa que ‘Lá Me verão’, na Galileia (Mt 28, 7). No passado domingo, ouvimos o evangelho das bem-aventuranças, em que é definida uma importante condição para que o nosso olhar O reconheça: a pureza de coração – ‘Bem-aventurados os puros de coração porque verão a Deus’.

De facto, o coração, enquanto o mais íntimo do nosso ser, quer-se limpo para que possamos reconhecer a Deus e ser este o lugar onde se estabelece e constrói uma relação de intimidade com Ele, permitindo-nos viver a nossa vida de forma plena e feliz.

Diria que este ‘processo’ de purificação passa pela oração, o que atualmente poderíamos considerar de certo modo exigente. É algo que requer tempo para parar, para fazer silêncio e escutar, para estar, tempo que muitas vezes não Lhe e nos sabemos dar. Mais ainda, este exercício implica sabermo-nos criaturas e filhos por Ele muito amados, escolhidos para viver na Sua presença, enviados a levá-Lo aos outros e confiados na Sua proteção. Implica um confronto verdadeiro com o que temos de bom e com o que temos de menos bom, que Ele já conhece e quer que nos libertemos de modo que consigamos ser indiferentes a tudo o que nos dá. Este ‘processo’ pode dizer-se que requer discernimento, identificar e reconhecer os momentos de consolação e de desolação que vivemos no nosso dia-a-dia, perceber onde é que nos aproximamos e onde é que nos afastamos d’Ele.

Uma leitura recorrente da própria vida afina o nosso olhar – que pode ser feita com o exame de consciência – torna-o mais capaz de identificar os pequenos milagres que Deus realiza todos os dias no concreto do nosso quotidiano. Pois, não raras vezes, o bem está escondido, é silencioso. Deus não se impõe, é discreto no seu agir, é essencial tal como o ar que respiramos, mas cuja importância só nos é evidente quando nos falta. Ver a Deus permite-nos entender qual a sua vontade para cada um de nós, reconhecer a Sua presença nos que nos rodeiam, encontrar onde Ele se manifesta, e permite-nos viver já a alegria prometida do Reino dos Céus para onde vamos.

Peçamos a graça de um coração aberto ao Espírito Santo, para que nos purifique e nos permita vê-Lo todos os dias da nossa vida.

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.