Todos somos chamados

Todos somos chamados a ser missionários, ainda que de formas diferentes, e a viver de coração aberto ao próximo. A consciência de termos sido criados para o amor responsabiliza-nos por cuidar e dar a conhecer este amor.

Lembro-me que, há mais de um ano atrás, quando partilhava com alguém que me preparava para partir numa missão de voluntariado, eram frequentes reações de espanto e admiração, por ter decidido deixar as pessoas e os lugares que conhecia, em troca de algo que nunca se sabe muito bem o que é, até lá se chegar.

A exclamação “Uau! Que corajosa!” era comum, mas soava-me sempre estranha, como se, de repente, não estivéssemos a falar da mesma pessoa. Nunca me senti especialmente corajosa, ou que os meus talentos e competências fossem notáveis em alguma medida. Antes pelo contrário, estes comentários chocavam de frente com todos os sentimentos que me assaltavam. O medo, a dúvida, a insegurança, a ansiedade perante o desconhecido, eram reais, ainda que revestidos com uma capa de alegria, vontade e ânimo em seguir este caminho.

Dez meses após ter chegado a São Tomé e Príncipe, enviada pelos LD para trabalhar e servir a comunidade do Bairro da Boa Morte, na cidade de São Tomé, nesta caminhada conjunta em prol do desenvolvimento, regressei a Portugal, e a exclamação repetia-se. Mas, desta vez, assaltavam-me respostas como: – Corajoso és tu, que te despediste desse trabalho que não te fazia bem; – Corajosa és tu, a criar dois filhos incríveis; – Corajosa és tu, que decidiste montar o teu próprio negócio, em plena pandemia!

Acredito que, ao longo da nossa vida, o Senhor nos vai confiando missões cujo sucesso depende muito pouco da coragem que temos, ou que os outros veem em nós. Estas missões, nem sempre claras ou óbvias de definir, e muito menos de concretizar, dependem primeiramente da força de vontade interior de ir ao encontro, de sair de nós próprios, mas acima de tudo, de fazer cumprir o motivo pelo qual fomos criados.

Todos somos chamados a ser missionários, ainda que de formas diferentes, e a viver de coração aberto ao próximo. A consciência de termos sido criados para o amor responsabiliza-nos por cuidar e dar a conhecer este amor a quem temos ao nosso lado, seja onde for, e de acordo com as nossas capacidades, tantas vezes enfrentando desafios inesperados e sacrifícios.

O encanto e gratidão gigante com que vivi a oportunidade de ser leiga missionária ao longo do último ano, impeliu-me a renovar missão, ainda que a insegurança e os medos iniciais permaneçam. Sinto-me sempre pequena, perante tudo aquilo que me vai sendo pedido. Não cresceu em mim coragem, mas cresceu a fé e a esperança, que se refletem na alegria do serviço, na disponibilidade em abraçar, no olhar apaixonado com que vou contemplando a terra de missão que me foi confiada.

Hoje, Dia Mundial das Missões, rezamos e agradecemos a vida de todos os missionários espalhados pelo mundo, mas também daqueles com quem nos cruzamos no dia a dia, e cujo testemunho reflete a verdadeira alegria do amor de Deus, que só do Espírito pode vir.

 

Inês Sampaio
São Tomé e Príncipe – Cidade, 2020-2022