O tempo que não me foge entre os dedos

No final do dia, é só isto que importa: a alegria com que vivemos cada encontro e as marcas que deixam, o saber parar e apreciar a genuinidade de uma conversa, de um olhar ou até mesmo de um sorriso.

4 meses já passaram e parece que foi uma vida inteira. A Boa Morte, o bairro onde os LD têm missão em São Tomé, já é casa e lugar de conforto e as pessoas com quem me cruzo começam a ser família. Assim o é, porque desde o primeiro dia que cheguei a esta terra, que agora chamo casa, me tenho cruzado com histórias de vida incríveis e pessoas que, sem pensar duas vezes, me abriram as portas de suas casas com um grande sorriso no rosto, prontas para darem tudo o que têm e não têm. Estes momentos de acolhimento são tão genuínos e espontâneos, que me fazem parar e contemplar Deus a mostrar-se nos pequenos gestos, num tempo que passa sem darmos conta.

Digo muitas vezes que o tempo me foge entre os dedos e aqui não tenho dúvidas de que estou a viver isso por completo. Quando dou por mim, já passou mais uma hora, mais um dia, mais um mês e tanta coisa havia ainda para fazer e aprender. O medo de não conseguir aproveitar tudo é real, mas só o estar, suspende tudo o que fica lá fora. Graças a estes momentos, torna-se possível parar e apreciar o que me é dado. Sinto-me grata e realizada com a missão que me foi confiada.

O desejo de guardar cada instante, cada pessoa, cada lugar está sempre presente, porque este é um tempo que deixa marcas na vida de quem por aqui passa. Também a mim já está a marcar. Muda-nos o olhar e faz-nos ver as coisas como elas são, sem quês nem porquês. É a simplicidade e a entrega das pessoas, nestes momentos em que estou com a comunidade da Boa Morte, que me fazem querer recordar tudo, para um dia poder partilhar o bem que tenho recebido.

No final do dia, é só isto que importa: a alegria com que vivemos cada encontro e as marcas que deixam, o saber parar e apreciar a genuinidade de uma conversa, de um olhar ou até mesmo de um sorriso. Só há uma coisa a fazer, pedir ao Senhor que me deixe aproveitar este tempo, nesta casa, para que ele não me fuja entre os dedos.

“Ajuda-me a realizar o meu trabalho e o meu lazer, o meu esforço e a minha pausa, como tempos de dádiva e de encontros.” José Tolentino Mendonça

 

Mariana Areosa
São Tomé e Príncipe, 2022-2023