Valorizar o Santíssimo Sacramento dentro de nós

Poderá haver lugar mais adequado para Deus ser reverenciado que no próprio ser humano?

Nas nossas celebrações eucarísticas, não é raro algumas pessoas colocarem-se de pé no momento em que, após a comunhão, a píxide com as hóstias consagradas é colocada no sacrário. Levantar-se nesse momento pretende ser, sem dúvida, sinal exterior de reverência para com o Santíssimo Sacramento.

Ao mesmo tempo, convém também não esquecer que, após a comunhão, o mesmo Jesus Sacramentado Se encontra, igualmente, dentro de cada uma das pessoas que acabou de comungar. E, assim sendo, poderíamos então dizer que cada uma delas se torna, nesse momento, uma espécie de ‘sacrário vivo’. Não será por isso de estranhar se, depois de ter recebido a comunhão, uma pessoa decidir ficar simplesmente em recolhimento e oração, agradecida por ter nesse momento dentro de si Jesus Sacramentado (que, através da sua morte, a alimenta e cristifica). Ou reverenciá-Lo igualmente nos outros membros da assembleia que acabaram também de O receber.

Deus está presente na píxide ou no sacrário que contém hóstias consagradas? Certamente que sim. Mas está igualmente presente nos seres que Ele criou à sua imagem, e a quem quis chamar seus filhos (Gen 1,26; 1 Jo 3,1); E, por maioria de razão, naqueles que, tendo recebido a comunhão, têm agora dentro de si Jesus Sacramentado – o mesmo, precisamente, que Se encontra no sacrário. Na verdade, se Cristo quis fazer-Se pão, foi exatamente para habitar dentro de nós. Se quis vir ao nosso encontro, foi para unir o humano com o Divino. “O corpo de Cristo” é aliás a expressão que S. Paulo repetidamente usa para se referir às pessoas que seguem Jesus (Rom 12,5; 1 Cor 12,27; Ef 4,12; Col 1,18).

De resto, sabemos bem que o amor a Deus se concretiza no amor aos homens e mulheres, seus filhos. S. João di-lo de modo bem explícito (1 Jo 4,20). Ou, mais do que isso, o próprio Jesus identifica-Se com cada um de nós, em especial com os mais necessitados (Mt 25,31ss). E, ao falar especificamente sobre a oração no templo, Jesus chama à atenção de que o verdadeiro culto a Deus não pode ser separado da relação com o próximo (Mt 5,23-24).

Poderá haver lugar mais adequado para Deus ser reverenciado que no próprio ser humano? De facto, como rezamos no Prefácio Comum IX da Eucaristia, «Vós sois o único Deus vivo e verdadeiro e estais presente em todo o universo; mas é sobretudo no ser humano, criado à vossa imagem, que imprimistes o sinal da vossa glória».

Talvez fizesse então sentido que, quando nos reunimos em torno do altar, esta importante verdade cristã pudesse também ser celebrada, de modo explícito e com o destaque litúrgico que merece.

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.