Conservadorismo e Ambientalismo: um paradoxo?

Ao serem impostas de cima, as soluções que têm sido encontradas não se afiguram compreensíveis pelos cidadãos comuns que veem os problemas ambientais como apenas resolúveis por decisões a tomar a nível global.

Como é sabido, problemas ambientais surgem quando há recursos comuns que não são detidos por ninguém e, tendo em vista assegurar o seu maior aproveitamento, cada pessoa retira o máximo de utilidades possível, provocando, paradoxalmente, a sua extinção.

Em face disto, e hoje, o Ambientalismo é mais comummente identificado com uma causa de Esquerda, contra a qual a Direita, e o Conservadorismo, se oporiam. E surge como uma causa de Esquerda porque as suas causas tradicionais, como o socialismo, acabaram desacreditadas pela realidade. Ao mesmo tempo, a defesa do Ambiente revela-se o motivo ideal para defender a humanidade contra os opressores de sempre: aqueles que enriquecem, agora, à custa do ambiente (as grandes empresas, o mercado, e os capitalistas gananciosos). Se bem vemos, a lógica, de louvar, de defesa dos mais fracos, teve neste contexto o ambiente ideal para o seu florescimento.

O modo como o problema ambiental é encarado transparece também da forma como tem sido enfrentado. O que, convenhamos, e não obstante os méritos evidentes alcançados, não tem surtido os efeitos pretendidos. O defeito está, achamos, em o problema estar mal estruturado. Com efeito, tem-se encarado a questão ambiental como estando em causa intervenientes que são incontroláveis, donde, a solução estaria em imposições vindas de cima. O que aliás é absolutamente coerente com a lógica de criar organismos e entidades transnacionais poderosas que se imponham aos prevaricadores. E é coerente com as soluções encontradas, que, repito, são de louvar, mas talvez não cheguem. Há um enfoque desmesurado na celebração de tratados internacionais e na regulação transnacional que não há interesse em cumprir, ou que, infelizmente, nem todos os Estados têm capacidade de cumprir.

Para começar: o problema não está (apenas) nas grandes empresas. E a solução não está na sua nacionalização: caso em que o Estado seria parte e juiz, faltando uma entidade que o pudesse controlar. O problema está no comportamento que todos temos de retirar as vantagens dos recursos que temos ao mesmo tempo que externalizamos os seus custos. E por isso é que um dos problemas do pensamento ambiental foi o de ter feito as pessoas desviarem a atenção do que conhecem e gostam, como o seu lar, a sua rua, o seu bairro, a sua cidade, o seu país, para coisas como tratados internacionais, que, por muito úteis e necessárias que sejam, não põem as pessoas como protagonistas na solução dos problemas. Deslocou-se a chave da solução para o que os governantes, longe do quotidiano, logrem alcançar. Salvo melhor opinião, cremos que esta perspetiva leva as pessoas comuns a encararem o problema ambiental como insolúvel e a desistir. Ao serem impostas de cima, as soluções que têm sido encontradas não se afiguram compreensíveis pelos cidadãos comuns que veem os problemas ambientais como apenas resolúveis por decisões a tomar a nível global.

É necessário encontrar um caminho que motive as pessoas, sem as quais nenhuma solução será profícua. E os movimentos ambientalistas, apesar dos seus méritos, têm falhado nesse particular: definem os seus objetivos em termos globais com armas que não fazem uso da soberania nacional e sem qualquer tipo de ligação aos locais sobre os quais exercem o seu poder.

A verdade, porém, é que a Direita em geral, e o Conservadorismo em especial, não têm encarado a causa ambiental. E não o têm feito primeiro porque a ideologia dos grandes negócios e das grandes multinacionais como que contaminou o pensamento conservador. Ao aliar-se com correntes que veem o esforço de preservar o que herdámos como antiquado cremos que a consequência não podia ser outra. Em segundo lugar porque a verdade do ambientalismo (de que os seres racionais externalizam os seus custos se não tiverem razões para atuarem de outra maneira) tem sido obscurecida pela propaganda ecológica. Quando o foco são problemas como o aquecimento global, as alterações climáticas e o aumento do nível das águas – todas fora do alcance de qualquer país e para as quais não há soluções imediatas – o resultado é a perda de confiança nas políticas tomadas, o desespero pera

A solução não está na vingança, mas sim na conservação do que não é nosso mas que herdámos; não está em tratados inaplicáveis mas em casos reais de conservação bem sucedidos; não está no ataque aos mercados, mas na sua utilização para restaurar o equilíbrio.

nte a incapacidade humana e a adoção de soluções que dispensam a soberania nacional.

Embora a propriedade privada possa surgir como uma solução possível também não nos parece que seja suficiente. Primeiro, porque não podemos confiar cegamente nos proprietários que nem sempre têm interesse na preservação dos seus próprios recursos. Segundo, porque as soluções de mercado só resultam se os atores do mercado suportarem os custos das suas atividades. Ora, os problemas ambientais resultam, precisamente, de falhas de mercado: os beneficiários não suportam os seus custos e passam-nos para gerações futuras.

Se, como Burke, virmos a sociedade como uma parceria entre os vivos, os não nascidos, e os morto, a causa ambiental encaixa que nem uma luva no pensamento conservador. Se o melhor que podemos fazer é instalarmo-nos, construir um lar, e passá-lo às futuras gerações, então a causa ambiental é uma decorrência natural deste pensamento. Conservando o ambiente aceita-se que a ordem pré-existente tem alguma prioridade sobre o que a pode substituir.

E é por essa razão que entendemos que a proteção do ambiente será ainda mais eficaz se houver uma atuação a nível local, motivando as pessoas a proteger aquilo que conhecem e com que lidam todos os dias. Só atuando a nível local, e incutindo este espírito é que estaremos dispostos a fazer sacrifícios pelas futuras gerações. O incutir de um espírito patriótico saudável, que nos une como cidadãos de um mesmo país, pode motivar-nos a ver o ambiente como algo que é nosso. E a verdade é que os problemas globais exigem algum tipo de solução local: apenas se protegermos o que conhecemos será possível resolver o problema globalmente.  Com efeito, as iniciativas de preservação do que é “nosso” – e que herdámos – têm-se revelado bem sucedidas. Sucesso este que assenta no apelo a uma razão que nos é cara e que se prende com a ligação partilhada que todos temos a um local partilhado.

A solução está, portanto, em encontrar causas não egoístas que incentivem as pessoas a conservar o que não é apenas nosso para as gerações futuras. Não basta que os nossos representantes eleitos estejam decididos a conservar o ambiente, é necessário que cada um de nós tenha essa intenção. E é aqui que ambientalistas e conservadores encontram uma causa comum: a preservação do território como um local onde existimos e que partilhamos, que nos define e que conservamos para os nossos descendentes que não queremos defraudar. Este pode ser um motivo que serve a causa ambiental, criando uma razão que impeça as pessoas de externalizar os custos em que incorrem.

E é por tudo isto que, com Roger Scruton – filósofo conservador inglês que seguimos nestas linhas – podemos dizer que a solução não está na vingança, mas sim na conservação do que não é nosso mas que herdámos; não está em tratados inaplicáveis mas em casos reais de conservação bem sucedidos; não está no ataque aos mercados, mas na sua utilização para restaurar o equilíbrio. A verdade do ambientalismo, aponta para a razoabilidade do conservadorismo e para a necessidade de incorporar o objetivo de proteger o que não é nosso nas políticas conservadoras.

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.