RTP (Relatório Trimestral de Plenitude)

Por isso, por estes momentos, por estas pessoas, seja qual for o relatório, seja o que for que estamos a contar ou a medir, não consigo deixar de achar que a grande beneficiária serei sempre eu.

No trabalho que realizamos ao longo da nossa missão, além do tempo dedicado aos projetos, também nos é pedido que vamos redigindo relatórios e planos que nos ajudam a medir o impacto da nossa intervenção e a planear as atividades seguintes. Nesta altura, no meio de relatórios quinzenais, trimestrais, anuais, de projeto, de contas, relatórios comunitários ou individuais, dou por mim a pensar no tanto que nesta missão não é mensurável.

Uma imensidão de momentos que não se contam, de palavras e sorrisos que não se medem e pessoas que são demasiadas para se contar e impossíveis de caberem em qualquer relatório. Mas e se tentássemos, como seria? Será que daria para se fazer um relatório com aquilo que para mim, dá mais sentido à missão?

No início teria, claro, um cronograma. Não sei bem como poderia ser, mas sei que indicaria que por mais que o trabalho apertasse, por mais tempo que o projeto exigisse, este tempo para estar com as pessoas continuaria a ser tempo a privilegiar.

Os indicadores seriam algo como: n.º de magogas (1) ou maçarocas consumidas em boa companhia, ou n.º de crianças que consigo ter ao meu colo ao mesmo tempo sem cair ao chão, n.º e variedade de conversas interessantes com desconhecidos na Hiace (2), decibéis atingidos pela Liliana nos ataques de riso que temos os três ao jantar (agravados muitas vezes pela falta de luz), n.º de reproduções das músicas que “estão a bater” e n.º das que já sei de cor, olondaka vingãmi nditelã okupopia kumbundu (3), nº de abraços espontâneos por dia, ou tempo de conversa com a mamã da praça até ela dar aquela eskebra (4) de cenoura.

E os resultados? Esses indicariam com certeza a alegria que vivo diariamente, e justificariam o quão inteira me sinto aqui. Por isso, por estes momentos, por estas pessoas, seja qual for o relatório, seja o que for que estamos a contar ou a medir, não consigo deixar de achar que a grande beneficiária serei sempre eu.

Marta Horta
Benguela, 2017-2019

(1) Sandes de frango com repolho e cenoura
(2) Toyota Hiace – veiculo utilizado como táxi
(3) Tradução: Quantas palavras sei dizer em Umbundo
(4) Promoção, oferta