“Meu Senhor e Meu Deus”

Povo santomense é assim: só acredita quando vê. Por isso é que gente na missa diz alto “Meu Senhor e Meu Deus”, porque somos povo de São Tomé, que só acreditou quando viu.”

As missas aqui em S. Tomé são muito diferentes das de Portugal. Os cânticos são muito animados, com batuques e coros grandes, toda a gente canta, bate palmas, dá as mãos, dança! Às vezes, para além do peditório normal, fazem-se grandes ofertórios, em que as pessoas oferecem o que têm e põem, desde barras de sabão até galinhas vivas, panelas de sopa, mesas, cadeiras…! Mas o que me intrigou mais foi o facto de, no momento da elevação da hóstia e do cálice na Consagração, toda a assembleia dizer em voz alta, elevando as mãos e os olhos para o Céu, “Meu Senhor e Meu Deus!”

Uma vez, numa reunião de Grupo Comunitário, percebi o porquê desta frase ser dita em voz alta (pelo que percebi, S. Tomé é o único país que tem autorização para o fazer).

Falávamos do mais recente projeto do Grupo Comunitário da Boa Morte, que é um modelo de recolha de resíduos, que consiste na construção de casas do lixo em pontos estratégicos do bairro onde as pessoas possam depositar o seu lixo, e a recolha desses resíduos é depois feita por uma moto-carrinha, adquirida pelo Grupo, com a ajuda dos Leigos para o Desenvolvimento (LD). Durante esta reunião discutia-se os locais onde podiam ser construídas as casas do lixo, e surgiu o problema de algumas pessoas não quererem ceder um pedaço do seu terreno para este efeito.

Um dos presentes, a certa altura, disse: “A gente tem é de começar a construir. Nem que seja só uma! Aí, as pessoas vão ver o modelo a funcionar e elas próprias vão pedir que se construam casas do lixo nos seus terrenos! Povo santomense é assim: só acredita quando vê. Por isso é que gente na missa diz alto “Meu Senhor e Meu Deus”, porque somos povo de São Tomé, que só acreditou quando viu.”

É engraçado observar no dia-a-dia a fé tão viva e alegre deste povo. É bom reconhecer o privilégio de trabalhar em projetos pioneiros, com estas pessoas que tomam a iniciativa, que não precisam de ver para acreditar!

Carmo La Cerda
S. Tomé e Príncipe, 2018-2019