Descanso em Jesus e naqueles que Ele me pede

É na sua companhia que tantas vezes saboreio o descanso, acolhida pela alegria que têm no coração, e que me mostram que nesta procura de trazer Jesus no meu testemunho «uma só coisa é necessária».

Em missão confronto-me diariamente com o propósito a que vim, no modo como escuto e sirvo aqueles que fazem caminho comigo, e como permito que Jesus seja a fonte que dá de beber ao testemunho que deixo nas suas vidas.

No encontro diário, vou construindo relação, exigindo mais dos dons que lhes reconheço e criando expetativas que se fazem exigentes. É neste encontro, que vou dando um pouco mais do que sou, mostrando que também eu possuo fragilidades e sou vencida tantas vezes pelos cansaços.

E nos cansaços, que são tantas vezes a necessidade de me sentar aos pés d´Aquele que me convidou, vou experimentando o privilégio de encontrar pessoas que me levam ao descanso com Jesus.

Entre os tantos afazeres, ora num passo bem apressado, inquieto pelo querer cumprir tudo aquilo que me proponho, ora num passo em que abrando e procuro contemplar as obras da criação, cruzo-me por sorrisos genuinamente fáceis e abraços tantas vezes carregados de lama, mas com sabor doce de afeto.

Chego ao largo onde fica a fruteira¹ que sombreia as tardes, sento-me no banco de pedra junto ao Sr. Inocêncio e deixo-me ficar. Fala sobre a roça no tempo colonial, levando-me numa viagem aos tempos de outrora, e assim descanso neste velho homem e nas histórias que somou ao longo da vida. É um privilégio descansar naquele banco, e sem apressar o tempo vou guardando os pormenores que se escutam apenas com o coração.

Sabedoria, Partilha, Comunidade, Porto Alegre

Noutras tardes, procuro pelo portão de zinco cinzento, bato à porta e entro confiante que ali encontro a Nha² Adelina com o seu sorriso pronto e discreto. Sento-me no seu alpendre de pedra e ali repouso, contemplando a beleza desta avó que prepara o jantar para os que esperam pela sua comida, ou que se dedica a fazer açucarinhas³, um pouco do seu ganha pão.

Açucarinhas, Doce Côco, São Tomé,

De todas as vezes, coloca-me na mão um prato bem servido de arroz e quando há, uma porção de peixe frito. Na fragilidade própria da idade, esta avó continua a cuidar de todos os que por ali passam.
Quando finalmente se senta ao meu lado, e consigo uma bagagem de histórias contadas numa mistura de português e criolo, que nem sempre decifro, confiada ao Espirito Santo, fico somente, escuto e acolho a riqueza do momento.

Estes são dois dos velhos que resistem ao avanço da idade. Há muito que deixaram as suas casas em Cabo-Verde, chegaram a S. Tomé e por aqui ficaram. Todos eles partilham desta história, da extraordinária resiliência às dificuldades da vida, e trazem consigo um lindo testemunho sobre a amizade, que se vê na forma como conversam e se cuidam entre si. É na sua companhia que tantas vezes saboreio o descanso, acolhida pela alegria que têm no coração, e que me mostram que nesta procura de trazer Jesus no meu testemunho «uma só coisa é necessária».

Virgínia Gabriel
São Tomé e Príncipe – Porto Alegre, 2021

 

¹ Árvore de grande porte que existe em S. Tomé e Príncipe.
² Nome dado às Avós de Cabo-Verde.
³ Doce típico feito com côco, açúcar e canela.