O ano de 2019 entrou em Moçambique com todo o fulgor. Frenético, enérgico e atarefado, por vezes, tenho a sensação que fui disfarçadamente tele-transportado ou que caí numa falha cósmica que me enviou para o velho continente.
Vivendo agora as últimas semanas destes mais de dois anos de missão, longe vão os tempos do “vacani vacani”* e do “leve-leve”.
Após uma incursão à capital moçambicana, com o Sr. Paulino e a Ir. Margarida, responsáveis das Escolinhas Comunitárias do Niassa, onde pudemos mostrar o Documentário das mesmas e conversar com alguns ministérios, regressámos ao Norte.
Neste momento, divido-me entre as planícies de Cuamba e as montanhas do Gurué, num trabalhoso processo de mudança de casa e de cidade, pois, ao cabo de mais de 20 anos na capital do algodão, os Leigos para o Desenvolvimento vão implantar-se na Suíça de Moçambique, casa da água e do chá.
Ainda em Portugal, diziam-me que o tempo de missão era um tempo de graça e de paz.
De facto, é-o.
Obviamente, existem momentos, pela sobrecarga de trabalho, se pensa: “Quando é que esta correria acaba?” Momentos que me fazem sentir que todos os dicionários estão errados e que missão, muito mais do que uma simples palavra, devia ter como sinónimos: alegria, paz e gratidão, claro, mas também: corrida, cansaço, exaustão e entrega.
Poderá parecer indelicado para com o romantismo de missão expor este lado mais duro, mas no final destes mais de dois anos, reaprendi vários conceitos, entre eles: cansaço e exaustão…
Ninguém se iluda: o tempo de missão é exaustivo!!!
Porém, é nesta exaustão que nos redescobrimos como pessoas, que redescobrimos o mundo à nossa volta, que nos entregamos ao outro…
Perante toda esta bagunça, a questão que fica é: como é possível uma pessoa andar exausta, cansada, alegre e grata, tudo ao mesmo tempo?
Não é.
Leram bem: não é!
Quem nas suas vidas “normais” se lembra de passar mais de um ano sem férias? E se o fez, qualquer um reconhece que se trata de uma atitude questionável e pouco saudável, seria um esforço sobre-humano, certo?
Em missão acontece.
Atenção! Não vou dizer que é saudável, apenas digo que é sobre-humano.
Longas foram as horas de trabalho e o cansaço acumulado, os momentos em que queria dormir mais um pouco ou, pura e simplesmente, não fazer nada. Porém, dois anos depois, olho para trás e rendo-me. Reduzo-me à minha condição humana e percebo que se muito consegui, não fui eu, mas Ele.
O segredo da missão é precisamente esse: não é por mim, mas por Ele. Desta forma, qualquer missionário pode transformar-se, deixar que Deus através dele e metamorfosear-se num sobre-humanóide divino, uma espécie de Super-Deusomem. Só assim é possível a missão e só assim se percebe como tanto se vence cansaço e se tem tanta alegria na entrega.
Tudo fica mais fácil.
Ninguém se iluda: o tempo de missão é exaustivo, mas, sobretudo, é de paz, de alegria, de entrega… é de Deus.
André Patrício
Cuamba, 2017-2018
S. Tomé e Príncipe, 2016-2017