Adolfina, uma história de resiliência e redescoberta

Foi por causa de um conselho, da força que encontrou no Grupo de Mulheres da Caparica-Pragal e das conversas com as voluntárias LD que, em plena pandemia, Adolfina persistiu na esperança e conseguiu encontrar emprego enfermaria de um lar.

De naturalidade congolesa e nacionalidade angolana, Adolfina tem uma história de vida que entrelaça oração, família numerosa, ativismo e resiliência.

Nasceu em 1971, em Boma, na República Democrática do Congo, onde o seu pai, natural de Cabinda, se refugiara no tempo da guerra e casara com uma congolesa.
Adolfina cresceu em Kinshasa, frequentou um curso de enfermagem e “não tinha ideia de casar”, talvez ser madre. Um dia, uma tia sua, muito amiga, começou a interceder em favor de Mavungo, um cabindense que terminara os estudos na faculdade, que “gostava muito de casar com uma menina de Cabinda” e andava enamorado de Adolfina, a
quem ia observando sem que ela o conhecesse ou suspeitasse.

“Mas não foi fácil para ele”, porque Adolfina “não gostava de casar; gostava muito de rezar, em casa ou na igreja”. Em conversas sucessivas, a sua tia continuava a interceder por Mavungo, “um rapaz muito calmo”, até que Adolfina reconsiderou: “Vou fazer um programa de oração e ver o que Deus me dá como resposta. Se casar for o plano de Deus para mim, então que seja a vontade de Deus, não a minha.” Começou a rezar mais ainda. Entretanto, ficou doente com uma apendicite e precisava de ser operada, mas a irmã com quem vivia não tinha meios de pagar o hospital. Avisada da doença, a tia foi visitá-la e Mavungo, ao saber da situação, quis acompanhá-la. Foi só nesse dia que Adolfina conheceu o rapaz de quem tanto ouvira falar. “E gostei muito. O pouco que ele tinha, deixou com a minha irmã” e, com a sua ajuda, juntaram o suficiente para pagar a operação.

“A partir dali, foi oração, oração, conversa, conversa”. Depois de muito conversar com Mavungo, Adolfina começou a pensar que “talvez…”, talvez aquele homem fosse o sonho de Deus para si. Com o tempo e oração, ambos sentiram que o casamento era o plano de Deus. Noivaram no Congo, antes de Mavungo viajar para Cabinda, aonde regressaria para trabalhar no porto. Adolfina ainda ficou um ano com a irmã e fez um curso de beleza e estética. Mavungo voltaria ao Congo para aí se casar e trazer Adolfina consigo.

“Eu fui conhecer Cabinda através do casamento”, em 1999. Aí nasceram os 7 filhos do casal. Embora gostasse de ter um emprego, Adolfina ficou em casa a criar os filhos e, durante algum tempo, geriu um salão de beleza. Em março de 2015, o marido, ativista e defensor dos direitos humanos, foi detido à saída da missa, acusado de se insurgir contra a má governação em Cabinda. Ficou preso 1 ano, 2 meses e 6 dias. Adolfina ficou sozinha, com os 7 filhos, vivendo sempre da solidariedade dos amigos e visitando, todos os dias, o marido na cadeia, a quem tinha de levar roupa e comida, pois Mavungo era considerado “inimigo do governo” e, por isso, os alimentos tinham de vir “de casa”.
Viviam com medo, até do envenenamento.

Quando o marido foi absolvido e libertado, estava doente e precisava de tratamentos médicos. A Amnistia Internacional pagaria a viagem para Mavungo ser tratado no país que escolhesse. Decidiu ser tratado em Portugal e pediu que Adolfina pudesse vir consigo, pois também tinha problemas de saúde. Em novembro de 2016, chegaram os dois a Portugal para tratamentos médicos ficando alojados em casa de uma ativista.

Foi então que começaram a repensar a vida: “O que é que vamos fazer? O governo, lá, está sempre atrás de ti…” Ainda em Portugal, com a indeminização recebida da empresa
em que Mavungo trabalhara, decidem comprar um apartamento na Caparica e deixar Cabinda, onde o medo lhes marcava a vida. Quando regressam a Cabinda, “era já só para ir buscar as crianças” e tratar dos vistos. A 30 de maio de 2017, “chegámos aqui com toda a família, agora com os filhos”. Já a viver na Caparica, Adolfina conheceu os LD quando Mavungo regressou da missa com a notícia de que esta ONGD ia formar um grupo de mulheres na paróquia. Foi o marido quem começou a mobilizar as mulheres e Adolfina resolveu entrar também no grupo. “Essas partilhas, as ideias, aprender as coisas… eu vi que o grupo estava bom e fiquei.” Aprendeu muito e conheceu alguém que a inspirou a não desistir de arranjar um emprego. Imaginar-se já a trabalhar, com uma farda, a andar nos corredores — era uma ideia que devia estar sempre, sempre na sua
cabeça. “Esse conselho… eu gostei tanto!” “Eu vou trabalhar, eu vou trabalhar” — foi por causa deste conselho, dessa força que encontrou no Grupo de Mulheres da Caparica-Pragal e das conversas com as manas LD que, em plena pandemia, Adolfina persistiu na esperança e conseguiu encontrar emprego na secção de enfermaria de um lar. Por isso,
e pela amizade dos LD à sua família, “nunca vou acabar de contar aquilo que os Leigos para o Desenvolvimento estão a fazer pela minha casa.”