Saudações! Espero encontrar-te bem.
Desta vez, passados quase 10 meses, não te escrevo sobre pessoas, projetos ou costumes. Hoje falo-te sobre nós, seres humanos tão imperfeitos, ainda assim tão amados. Já pensaste? Qual de nós é capaz de confiar noutro, se esse em ti não confia?
Pois bem, o que aqui partilho hoje contigo é um pensamento que me veio à mente. Constantemente procuramos controlar o que não está ao nosso alcance. Como seres humanos temos dificuldade em aceitar que nem tudo depende de nós. Não está na nossa essência aceitar que fatores externos influenciem os nossos planos.
Uma vez um peixe disse-me que só temos que nos deixar ir. Às vezes temos que deixar que a corrente nos leve. Perdemos tanto tempo a lutar contra ela e, às vezes, ela só nos quer mostrar algo mais, tão mais bonito. O tempo não é para ser desperdiçado a lutar contra a corrente, não esqueças que só te são dadas 24h por dia, pensa bem no que queres fazer delas!
Assim aconteceu quando me propus a esta missão, quando disse o meu sim a este desafio, sem saber para onde, com quem, trabalhar em quê, sem saber o que seria da minha família, das minhas relações, do meu futuro… Mas acontece algo engraçado, por vezes o “aleatório” tem um encaixe perfeito em ti.
Aconteceu e acontece diariamente. Antes de missão, quando precisava mesmo que a cor do semáforo mudasse para conseguir apanhar o metro, ou que me dava mesmo jeito que o feriado calhasse a uma sexta-feira, ou aqui em missão, quando marco reuniões e ninguém aparece, ou tenho uma atividade planeada ao ar livre e começa a chover torrencialmente… São tantas as situações que não controlamos mas que acabam por combinar tão bem com a nossa vida… E tu, recordas-te de alguma?
Sou levada constantemente para onde acho que não quero e afinal era exatamente aí que pertencia. Sabem quando vemos um pintor a pintar? Vemos traços aleatórios que só o pintor sabe o seu motivo e no final de tudo, passado o caos de traços desconcertantes, vemos toda a beleza que a sua união constrói.
Claro que não, nem sempre é fácil aceitar a corrente. Eu própria raramente o faço. A toda a hora tento, como por aqui se fala, “adiantar pensamento” e reduzir os efeitos catastróficos dos imprevistos. Raramente funciona! E é exatamente aí que percebo que o que eu havia planeado, a longo prazo, não era um milésimo do maravilhoso que obtive com todos os acasos, imprevistos e fatores externos.
Todos nós somos imperfeitos, então porque não aceitar a incompletude do nosso planeamento?
Não somos capazes de sonhar além do que conhecemos, por isso, confio e a vida mostrar-me-á o rumo. Assim conheceremos algo tão maior…
Obrigada. Que a corrente nos encontre!
Sofia Costa
S. Tomé e Príncipe, 2018-2019