Cheguei a São Tomé em setembro, já lá vão 6 meses. O tempo corre e a vida acontece, mas nesta terra vou aprendendo a viver num “leve-leve”¹, contemplando e saboreando cada momento vivido.
Tenho o privilégio de fazer missão numa terra de artistas. Artistas diferentes dos que estamos habituados a conhecer. Esta gente é artista na forma como vive e se entrega ao que o Senhor lhes vai confiando. Nos Exercícios Espirituais que fiz no fim do tempo de formação, o padre que estava a orientar disse-nos para fazermos da nossa vida uma obra de arte. Na altura fiquei com esta frase a ecoar, mas não percebi o alcance que podia ter. Em São Tomé percebi que esta arte se admira na vida de cada um. Aqui aprendo a contemplar a ARTE DE SER.
A ARTE DE SER SIMPLES…. No livro “O Príncipe e a Lavadeira” li umas linhas escritas por Laurinda Alves que diziam: “Ser simples é muito mais do que não ser complicado. É ser verdadeiro, é prestar atenção, é ouvir com o coração e é falar sem pretender ter sempre razão. Só uma pessoa simples é capaz de estar na vida para os outros e pelos outros e consegue fazê-lo sem se perder no essencial.” Em vidas entregues ao essencial cada um coloca em prática a arte de ser simples. Contemplo esta arte quando observo a forma bonita como cada um vive e se entrega aos outros com o pouco que tem, mas que é partilhado com muito amor.
A ARTE DE SER ACOLHEDOR…. Recordo a minha primeira semana no Bairro da Boa Morte, e de como, ao entrar nos quintais, eramos recebidas como se fizéssemos parte da família. Também a contemplo no cuidado que todos têm diariamente connosco, quando ligam só para cumprimentar, ou quando nos oferecem um pouco do que a terra dá.
A ARTE DE SER ALEGRE é uma das que mais vezes me inunda o coração. Para mim é fácil perceber a alegria quando tudo corre bem e como desejado, mas é bem mais difícil de entender quando a vida nos troca as voltas e nos desafia a crescer. Esta gente bonita transborda alegria em tudo o que vive, mesmo quando enfrentam a dureza do caminho, há sempre uma alegria enraizada na forma como procuram resolver os seus problemas. Aprendo todos os dias a saborear as pequenas alegrias que vou vivendo. Percebo que só quando nos deixamos tocar pelas pequenas alegrias temos o coração preparado para viver verdadeiramente as grandes.
A ARTE DE SER “LEVE-LEVE” que contemplo na forma como cada um vive a sua rotina diária sem muitos horários cumpridos, mas inteiros em tudo o que vão fazendo. Neste “leve-leve” aprendo a ser mais paciente e a saborear o tanto que recebo enquanto espero. A espera passou a ser um tempo de crescimento, há sempre alguma coisa que vem ter connosco, precisamos é de estar atentos a todos os sinais que o Senhor nos dá.
Neste tempo em que a arte de ser me desperta todos os sentidos, vou aprendendo a contemplar a beleza na vida de todos os que o Senhor me coloca no caminho. Hoje compreendo melhor este grande desafio de fazermos da nossa própria vida uma obra de arte, que só é possível quando aceitamos viver uma vida de verdadeira entrega ao que nos é confiado.
Mariana Pedro
São Tomé e Príncipe – Cidade, 2021-2022
¹ “Leve-leve” é a expressão utilizada pelos habitantes de São Tomé e Príncipe para descrever o seu ritmo de vida. Um ritmo devagar, suave, tranquilo