Ao longo dos últimos anos, nas instituições e organizações da Província Portuguesa da Companhia de Jesus (PPCJ), temos procurado promover ambientes de proteção e cuidado para todos, em particular, para as crianças e jovens e adultos vulneráveis. O Sistema de Proteção e Cuidado de Menores e Adultos Vulneráveis (SPC), em implementação nas instituições da PPCJ desde 2018, tem apostado na sensibilização e na formação dos seus colaboradores, bem como na prevenção de situações de maus-tratos e abusos, sejam cometidos internamente ou no contexto em que estas crianças, jovens e adultos vivem.
Confiantes no caminho que temos percorrido até aqui, mas conscientes da exigência que estas mudanças de comportamento e de mentalidade comportam, acreditamos que estamos a dar passos concretos e sólidos no sentido de reforçar a proteção daqueles que nos são confiados. Mas importa agora dar um passo mais. Um passo que permita criar condições de segurança e confiança para acolher e escutar qualquer pessoa que, independentemente da data dos factos, possa ter sido vítima de abuso sexual por parte de alguém vinculado à Companhia de Jesus em Portugal, seja jesuíta, trabalhador, colaborador ou voluntário. Para isso, criamos agora, no âmbito do Sistema de Proteção e Cuidado, o Serviço de Escuta, destinado a acolher e a apoiar estas possíveis vítimas e a receber denúncias de possíveis casos que possam nunca ter sido comunicados ou que, tendo sido, não foram devidamente tratados.
Na medida em que o desejem, as vítimas serão acompanhadas pelo Serviço de Escuta, através de pessoas vocacionadas e formadas para esta missão, ao longo dos processos que estejam ou possam vir a viver (psicológico, canónico, judicial – civil/criminal), na sequência da denúncia.
O Serviço de Escuta contará ainda com o apoio de um grupo consultivo, composto por pessoas com vocação e experiência nesta área e que, de forma independente, ajudarão a afinar os procedimentos, agindo com liberdade e isenção.
Move-nos o desejo de acolher quem possa ter passado por este sofrimento numa tentativa de atender às suas necessidades e reparar o mal de que foi alvo, embora estejamos conscientes de que não há nada que apague a dor e o sofrimento causado por um abuso sexual. É nosso compromisso tratar cada pessoa e cada situação com o máximo de proximidade e seriedade possíveis. Faremos desencadear, para isso, todos os mecanismos processuais adequados e necessários, no foro civil ou canónico.
A outro nível, e sem qualquer prejuízo do desencadeamento destes processos, se viesse a surgir alguma acusação contra alguma pessoa envolvida nas nossas Obras Apostólicas, também tudo faríamos para a acompanhar no que fosse necessário. Sentimos que esta dimensão é também parte da nossa responsabilidade enquanto Província Portuguesa da Companhia de Jesus.
Vivemos um contexto internacional onde o drama dos abusos sexuais cometidos no seio da Igreja continua a marcar a agenda mediática e a suscitar desconfiança e perplexidade dentro e fora dos meios eclesiais. Queremos participar neste desejo sincero da Igreja de cuidar de cada pessoa ferida por este flagelo, na certeza de que o passo que agora damos é necessário e inadiável.
Recordo as palavras proferidas no Ponto SJ pelo P. Hans Zollner, jesuíta que integra a Pontifícia Comissão para a Proteção dos Menores (criada pelo Papa Francisco em 2017) e que esteve em Portugal há uns meses: “As pessoas aproximam-se para falar de experiências traumatizantes apenas se se sentirem seguras. É preciso comunicar com clareza que há disponibilidade para acompanhá-las de verdade, uma vez que tomem a decisão de falar sobre o assunto”. É precisamente este ambiente de segurança e confiança que queremos construir com a abertura do Serviço de Escuta já no dia 18 de novembro, Dia Europeu para a Proteção das Crianças Contra a Exploração e o Abuso Sexual.
Mais informação:
Jesuítas abrem Serviço de Escuta -Notícia
Entrevista à Coordenadora do Serviço de Escuta
Caixa de Perguntas sobre o funcionamento do Serviço de Escuta
Miguel Almeida, sj
Padre Provincial
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.