Eutanásia: quebrar os laços da solidariedade

Terá lugar hoje a votação final global da Lei que regula a possibilidade de pedir a antecipação da morte. Entendemos tornar público o nosso posicionamento sobre este tema.

Terá lugar hoje a votação final global da Lei que regula a possibilidade de pedir a antecipação da morte. Entendemos tornar público o nosso posicionamento sobre este tema.

Em maio de 2018, quando a sociedade debatia o tema da eutanásia, os jesuítas portugueses posicionaram-se com serenidade e clareza sobre o assunto. Então, como agora, não colocamos em causa a legitimidade do Parlamento como órgão legislador. Mas, no momento em que decorre na Assembleia da República a votação final global da Lei que regula a possibilidade de pedir a antecipação da morte, parece-nos ser necessária uma nova reflexão.

Vivemos um tempo particularmente sensível. A solidão, a doença, o luto, o cansaço físico e emocional confrontam muitos com a questão do sentido da vida. Nos hospitais, os profissionais de saúde esgotam-se no esforço sobre-humano de cuidar de todos e preservar a sua vida, ao mesmo tempo que são confrontados com decisões limite, sem meios nem capacidade para atender a todos. Num contexto como este, é profundamente perturbador que uma legislação aprovada pelo Parlamento assuma como válida a premissa de que há situações em que vida deixa de ser digna de ser vivida.

Hoje, o que queremos dizer é que este não é o tempo de vivermos desligados, não é o tempo de abandonar à solidão os que duvidam do valor da sua vida.

Num momento de alheamento parlamentar, os deputados encerram nas paredes de São Bento a sua sensibilidade, desligando-se do que todos estamos a viver. Esta rutura com a sociedade não é nova, num caminho que ignorou os pareceres das ordens dos profissionais de saúde e que não deu a devida atenção aos alertas variados e consistentes.

O processo legislativo não ficará já concluído. Há ainda passos que têm de ser dados. Há ainda a possibilidade de que a Lei não chegue a entrar em vigor. Se isso vier a acontecer não diminui a nossa responsabilidade de promover o cuidado e a proteção da vida. Hoje, o que queremos dizer é que este não é o tempo de vivermos desligados, não é o tempo de abandonar à solidão os que duvidam do valor da sua vida. É justamente quando somos obrigados a viver mais isolados que mais precisamos reforçar os laços de solidariedade que nos unem. A decisão que o Parlamento se prepara para tomar quebra esses laços.

Fazemos também eco de um manifesto que foi publicado hoje e é assinado por diversas organizações sociais que conhecem bem a realidade da saúde:

“Apelamos uma última vez aos deputados para que revejam a sua posição no momento de votar a lei em plenário e, se estes persistirem nos seus intentos, ao Senhor Presidente da República para que faça o que estiver ao seu alcance para travar a legalização da eutanásia em Portugal.” (para ler o manifesto clique aqui)

 

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.