Não há dúvida que a percepção do belo está inscrita no que é sermos humanos. A beleza faz-nos estremecer, faz-nos viajar até longe para a observarmos e comovermo-nos, faz-nos parar junto ao mar para nos maravilharmos com um pôr-do-sol. Faz-nos sorrir, chorar, sentir e pode mesmo fazer-nos enamorar. É sempre belo o fruto do nosso amor. São sempre belos os nossos amigos.
Mas, como diz o ditado, “não há bela sem senão”. A beleza e o seu significado é de tal modo impactante que pode tornar-se uma obsessão e, hoje como outrora, os jovens prendem-se aos padrões de beleza, às definições do que é belo e são capazes de sentir que, ao não obedecerem a esses parâmetros, não podem estar bem com o seu rosto, com o seu corpo, acabando por se deixar dominar pela baixa auto-estima.
Esses padrões são de tal modo dominantes, que temos jovens africanas que desfrisam os seus caracóis para usarem cabelos lisos; jovens asiáticas que fazem cirurgias para tornar os olhos maiores ou os narizes mais finos; jovens indianas que usam branqueadores de pele para ficarem mais claras. Tudo isto porque o padrão que domina os seus subconscientes é o da jovem branca, de cabelos lisos e louros e, claro, de olhos azuis. A ditadura da beleza domina as redes sociais onde a maioria das crianças e adolescentes navegam — já são notícia as crianças de 8 anos que acordam mais cedo para se maquilharem antes de saírem para a escola, fruto dos tutoriais do TikTok; ou os jovens que não se conseguem ver sem os filtros das redes sociais, preferindo a sua imagem com filtros.
Muito tem sido feito para desmistificar estes padrões de beleza, desde campanhas publicitárias a mudanças na seleção das modelos que passam a alta-costura nas semanas da moda, ou dos actores que são escolhidos para protagonistas de filmes e de séries. Essas mudanças passam também pelos bonecos com que as crianças brincam — a Barbie já não tem medidas irrealistas, mas pode ser forte, baixa, ter trissomia 21 ou mesmo andar de cadeira de rodas, para que as crianças compreendam que a diversidade existe e os padrões podem ser muitos. Até as princesas da Disney deixaram de ser jovens do centro da Europa, como Cinderela ou Branca de Neve, e temos protagonistas que além de serem de outras etnias, são jovens fortes e independentes como a chinesa Mulan ou a índia Pocahontas (sei que há umas mais recentes, mas eu fiquei parada nos finais dos anos 90, desculpem).
Toda esta diversidade do belo é importante para que os mais novos cresçam de maneira saudável, não focados em si e nas suas necessidades. Esta diversidade está cada vez mais presente nas escolas portuguesas e pode ser abraçada, com a ajuda dos pais. Como é simpática a amiga ucraniana com os seus totós louros, como é querida a amiga nepalesa com os seus olhos enormes, como é divertida a amiga brasileira com o seu sotaque doce. Ensinar a ver a beleza nos outros, torna-nos mais tolerantes e menos exigentes connosco próprios. Torna-nos mais humanos. Por isso, é obrigar os mais pequenos a tirar os olhos do ecrã e deixá-los espraiar pelo mundo, para que se comovam com a beleza.
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.