A pergunta é corriqueira, e sai-nos a todos da boca, conheçamos melhor ou pior a pessoa a quem a dirigimos. “Como estás?”. Respondemos rapidamente que’ está tudo bem’, que se ‘vai andando’ – ou, no meu caso, que ‘está tudo ótimo!’. No fundo, são respostas diferentes que dizem o mesmo de verdade: muito pouco.
Nem sempre – tantas vezes – estamos bem, nem sempre está tudo ótimo. Mas se repetirmos as coisas como um mantra, elas podem quase tornar-se verdade, e nós aproveitamos para não pensar naquilo que nos torna o caminho menos fácil. Acredito que é essa a motivação para respondermos sempre com a leveza de quem parece não estar a carregar qualquer cruz (pequena, média, grande) às costas.
Mas quantas vezes precisávamos, genuinamente, que um Simão de Cirene nos cruzasse o caminho e nos ajudasse com a cruz? E quantas vezes – à semelhança do que fez Jesus – nós deixamos de ajudar aqueles que efetivamente nos chegam e nos estendem a mão?
Desde antes do Seu nascimento, a história de Jesus é de ajudas e necessidades: primeiro, foi preciso pedir abrigo para que o menino nascesse quente e seguro numa altura em que as portas se fechavam repetidamente na cara de Maria e de José. Logo depois, foi em forma de Anjo que chegou o auxílio, avisando a Sagrada Família de que deveriam fugir de Herodes, tinha Jesus pouco mais do que alguns dias de vida. E, durante a sua infância, quando todos o julgavam perdido – e Jesus discutia com os Doutores da Lei – foi o Amor de quem mais O queria que se transformou na busca incessante até garantir que se encontrava bem.
E embora na altura Jesus não entendesse a preocupação de seus pais [“Por que me procuráveis? Não sabíeis que eu devia estar na casa de meu Pai?» (Lucas 2:49)], certo é que lhe era necessária. Como a nós, durante a nossa peregrinação na vida.
Saber pedir ajuda e receber auxílio é, para muitas pessoas – para mim incluída –, uma aprendizagem. É descermos do nosso pedestal de todo-poderosos, assumir a fragilidade e deixar para trás todo o orgulho que nos faz erguer a cabeça mesmo que contra nós soprem os piores ventos e venham as gigantes vagas que mal nos deixam respirar. Aceitar ajuda é ter consciência de que a tempestade existe, de que vai ser dura, de que estamos só em modo de sobrevivência, mas que, se tivermos alguém a dar-nos a mão, as subidas para vir à tona serão mais fáceis e as conversas enquanto flutuamos ajudarão o tempo a passar. “Ao lado do teu amigo nenhum caminho será longo”, escrevia há uns anos D. Tolentino de Mendonça. Não porque se encurtem os percursos, mas porque há quem no-los queira tornar menos pesados. Saber aceitar isso é termos consciência da nossa pequenez, das nossas falhas, da nossa humanidade.
Ali, Jesus Cristo não era apenas o Filho de Deus. Era homem, e como todos os homens, as suas fragilidades fizeram-se sentir durante um percurso que é metáfora para a vida de cada um de nós.
A caminho do calvário, enquanto carregava a sua cruz e caía repetidas vezes, Jesus teve a seu lado os amigos. Uns, como o Cireneu, aliviaram-lhe a carga, outros limparam-lhe o rosto, outros olharam-no de forma amorosa o suficiente para que ele conseguisse aguentar a provação. Ali, Jesus Cristo não era apenas o Filho de Deus. Era homem, e como todos os homens, as suas fragilidades fizeram-se sentir durante um percurso que é metáfora para a vida de cada um de nós.
Ora, se Jesus aceitou ajuda quando mais precisou, que soberba é esta que teimamos em mostrar quando respondemos que “está tudo bem”, e há nuvens negras por cima da nossa cabeça? Numa altura em que as redes sociais e as suas vidas perfeitas nos entram pelos olhos dentro a todo o momento, pedir ajuda parece cada vez mais ser um sinal de ‘falhanço’ – não é por acaso que Portugal continua a ser um país com números assustadores no que diz respeito à doença mental.
Mas a verdade é que pedir ajuda é, na verdade, um sinal de crescimento, de serenidade, de reconhecimento dos nossos limites. Aceitar ajuda é assumir que não somos sozinhos, e que o Amor é parte do caminho para a praia, assinalada pelo farol que sabemos existir, mas cuja luz não conseguimos ver por entre o negrume das marés. É nas mãos estendidas, nos silêncios partilhados, mas cheios de compreensão, e nos olhares sinceros que podemos, eventualmente, encontrar a força necessária para flutuar até terreno seguro, onde o sol voltará a brilhar – afinal ele está lá, ainda que tapado por nevoeiro e nuvens.
Por isso, da próxima vez que um amigo perguntar “Olá!, como estás?”, não nos acanhemos: se estivermos mal, estamos mal – e queremos ajuda. Se estivermos bem, então perfeito: estamos ótimos. E aí talvez possamos ser nós a estender uma mão no meio da tempestade!
Aproveitemos o Natal que agora começa para, sendo bons também para nós, nos concedermos diariamente o dom do renascimento. De olhos postos em Jesus, saibamos reconhecer, com humildade, que somos mais fortes acompanhado e mais felizes se nos deixarmos amar por quem nos quer bem
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.