Provavelmente alguns dos leitores não saberão do que falo, mas outros conseguirão acompanhar-me: na minha infância (década de 80 do século passado) foram vários os filmes e desenhos animados que se passavam no, então, futuro. O Regresso ao Futuro 2 (ou Back to the Future – Part 2, no seu original), levou-me viajar com as personagens de 1985 para o, então, longínquo ano de 2005. Podendo listar mais algumas séries de animação e de ficção, destaco apenas mais um: Conan, o rapaz do Futuro, que vivia no ano de 2008, a ameaça da extinção da Humanidade, o qual me trouxe, de uma forma lúdica muito impactante para quem como eu tinha 6 ou 7 anos, o valor da amizade e o respeito pela natureza.
O futuro, que se escrevia em 2005 ou 2008, tal como chegava na década de 80, não parecia risonho, mas a ficção conduzia-nos a vislumbrar a possibilidade de corrigir o erro. Ironicamente, a pandemia empurrou-nos para uma reflexão profunda sobre o ensino tal como é pensado nos seus diferentes níveis, sem qualquer hipótese de regresso ao passado. Ironicamente, são as crises que despoletam mudança. A era digital ao nível da educação começou verdadeiramente agora, passados mais de 20 anos do século XXI. O futuro é hoje, afinal.
Num inquérito aplicado pela OCDE, apenas 38% dos professores referiam ter-se sentido à vontade com as novas tecnologias, aquando do primeiro confinamento.
Face às disparidades e desigualdades que a pandemia despoletou e que continuam a ser documentadas, importa construir já novos alicerces. A Comissão Europeia lançou recentemente o Plano de Ação para a Educação Digital para os seus Estados Membros (2021-2027), com a missão de procurar reduzir essas mesmas desigualdades a curto e médio prazos. De uma forma ambiciosa, este plano contempla um conjunto de estratégias e ações, pensadas segundo uma abordagem sistémica e integrada. Apesar do acesso à internet ter melhorado em Portugal nos últimos cinco anos (dados do Eurostat de 2019), ter internet e um computador não basta para entrarmos numa transformação plena ao nível da educação. Se nos questionarmos sobre 2019 e 2020, rapidamente colocaremos como hipótese que é com as atuais gerações que se estão a testar um conjunto de práticas pedagógicas ditas (mais) inovadoras. Este processo seria, talvez, inevitável, considerando a transformação em tempo real que a pandemia despoletou. A inovação pedagógica tomou conta do léxico das escolas, das famílias e das próprias sociedades.
A verdadeira inclusão só se faz numa lógica participada, em que a qualidade do ensino se torna uma estratégia de cariz universal.
Num inquérito aplicado pela OCDE, apenas 38% dos professores referiam ter-se sentido à vontade com as novas tecnologias, aquando do primeiro confinamento. O plano aqui descrito, ainda que ambicioso (sim, digo-o mais uma vez), procurará potenciar uma maior literacia digital (i.e., conhecimentos e competências), em toda a comunidade escolar, estimulando a criação de verdadeiras comunidades de partilha entre os diferentes Estados. Nesta linha, a iniciativa Connectivity4Schools, permitirá o acesso a ferramentas digitais, como o SELFIE for Teachers, que visa uma monitorização do modo como as escolas melhoram a forma como utilizam as tecnologias no processo de ensino aprendizagem.
O Plano 2021-2027 para a educação digital traz, paralelamente dois outros tópicos fundamentais: a valorização de sociedades mais sustentáveis, tendo em conta a visão ecológica que subjaz ao digital, e que deve continuar a ser uma aposta conjunta e concertada; a promoção de uma maior igualdade de género, ao contemplar ações e iniciativas que procurem estimular, ainda mais, o interesse de meninas pelas áreas STEM (Ciências, Tecnologias, Engenharias e Matemática), procurando quebrar alguns papeis de género, que persistem em manter-se até aos dias de hoje. A estes tópicos adicionaria o da inclusão. A verdadeira inclusão só se faz numa lógica participada, em que a qualidade do ensino se torna uma estratégia de cariz universal. Pensar o futuro da educação com tod@s e para tod@s.
Os sinais são claros. O futuro é hoje, sem animações ou efeitos especiais.
Fotografia: Hello I’m Nik – Unsplash
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.