Andei à procura da primeira grande referência masculina feminista no mundo.
Não foi fácil, mas numa observação mais profunda confesso que o primeiro nome que me ocorreu foi o daquele que para mim, em virtude da minha religião, é o Filho de Deus que veio à Terra para nos salvar: Jesus.
Tenho a certeza que se Jesus viesse hoje à Terra, continuaria à procura das minorias, sentar-se-ia no chão com os pobres, juntar-se-ia aos acampamentos de refugidos espalhados pelo mundo; que partilharia o espaço dos doentes e dos infetados, que continuaria a acolher os mais pecadores, os mais frágeis e marginais. A vida de Jesus é uma vida de promoção do outro e de Igualdade.
Tenho a certeza que Jesus se sentaria ao lado de um homossexual, de um trans, com a mesma ligeireza com que se sentaria ao pé de mim: ora relembremos que o seu mandamento mais precioso – “Amai-vos uns aos outros como eu vos amei” – é uma ordem de Amor, e o Amor não existe sem aceitação, sem respeito, sem empatia.
Não acho que possa ser diferente disto. A conta é feita pelo coração e o seu quociente são ações, nem omissões, muito menos condenações.
Mas porquê Jesus? Porque ele foi o Mestre da inclusão e fez das mulheres exemplo dando-lhes o espaço e o destaque que nem o mundo nem a Igreja souberam acompanhar ao longo dos séculos.
Se pensarmos bem, a grande mensagem que foi deixada na Terra – a da ressurreição do Filho de Deus, o Cordeiro – é transmitida por mulheres e não por homens: Maria Madalena e Maria foram as escolhidas para essa tarefa.
Se pensarmos bem, a grande mensagem que foi deixada na Terra – a da ressurreição do Filho de Deus, o Cordeiro – é transmitida por mulheres e não por homens: Maria Madalena e Maria foram as escolhidas para essa tarefa. Não Pedro nem João. Pedro acobarda-se. Qual é a mulher que nalgum Evangelho se acobarda assim?
Jesus apresenta como exemplo de fé outras mulheres: uma das maiores ofertas que é feita ao Templo é a de uma viúva pobre, que dá tudo o que tem e que por isso figurará para sempre como exemplo de fé e generosidade (Lc 21, 1-4). Por outro lado, a mulher Cananeia maltratada e ignorada pelos discípulos de Jesus é escolhida e acolhida por Ele que, quando a vê, cura a sua filha como ela lhe pedira (Mt 7 24-30).
Outro episódio da sua vida em que Jesus privilegia as mulheres e as coloca novamente como protagonistas na sua própria História – que é a nossa –, é quando Cristo é perfumado para a sepultura, por uma mulher que lhe concede o perfume mais caro e mais precioso (e por isso acaba por ser criticada, note-se, por um homem). Jesus sai prontamente em sua defesa, e mais uma vez esta mulher, uma mulher, se torna exemplo de verdade e vida.
Se seguirmos esta análise, encontraremos outra. É através da figura de outra mulher, Maria, irmã de Marta, que Jesus ensina a importância de ouvir o outro e de deixarmos de lado as preocupações de um quotidiano, vãs e às vezes tão inúteis. Vejamos este episódio como uma lição de como viver melhor connosco e com os outros, novamente protagonizado por uma mulher.
Por último – a minha figura mais querida e amada, a Mãe das mães – aquela que O pariu, que certamente o ensinou a andar, a comer, que lhe deve ter tirado a febre: a mulher que O viu preso numa cruz e nunca O abandonou, aquela que nunca o abandonaria primeiro por ser mulher e ter seguido Deus, e depois por se ter tornado sua mãe, Maria.
No meu entendimento, com os seus ensinamentos essenciais, Jesus diz-nos que uma sociedade que é omissa em Direitos e Igualdade é uma sociedade doente que mata e morre.
Tinha de ser uma mulher, não era? Não podia ser de outra forma. Jesus não só respeitou e amou, mas colocou-as muitas vezes como protagonistas nos seus ensinamentos. Podia recorrer a homens, mas colocou-nos em paridade. Atrevo-me a dizer que nos principais momentos foi de nós que foi feito o exemplo.
E para mim Jesus não foi um feminista da primeira vaga, foi de quarta.
No meu entendimento, com os seus ensinamentos essenciais, Jesus diz-nos que uma sociedade que é omissa em Direitos e Igualdade é uma sociedade doente que mata e morre. Uma humanidade doente que mata e morre é o que nos tornaremos se não aprendermos com estas heroínas bíblicas.
Curiosamente hoje às mulheres é negada a ordenação sacerdotal pela Igreja Católica. Não há previsão de uma mudança, porque afinal Jesus só teve discípulos homens e, à mesa da última ceia, aquele espaço de sacralidade onde se instituiu para sempre a Eucaristia, só se sentaram homens. Mas teremos mesmo sido excluídas desse ajuntamento divino? Da última Ceia, a maior das Transformações? Quem, de facto, terá amassado e tornado possível aquele pão?
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.