Educação rima com… verão! O verão é um período ideal para estimular a autonomia das crianças e jovens. Se por um lado se sai das rotinas e de algum modo se quebram regras, o verão acaba por ser um período importante para treinar novas competências: tirar fraldas, ensinar a nadar de uma forma mais descontraída, sem horários e sem professor; introduzir novos alimentos, como frutas ou legumes frescos; fazer amigos e improvisar brincadeiras no areal da praia, sem recurso ao telemóvel ou a outro dispositivo móvel; estimular a curiosidade, seja pela possibilidade de visitar novos lugares, seja pela possibilidade de explorar o que temos diariamente tão perto. O verão deve ser também o tempo de olhar o mundo que nos rodeia, estimular a ética do cuidado pela natureza: debatem-se as preocupações climáticas em família? O cuidado pelo nosso mar e rios? Recicla-se em férias? Que papel e responsabilidade devem ter os cuidadores num tempo em que as mudanças climáticas se sentem bem de perto?
O verão deve ser também sinónimo de tempo em família. Criar momentos de lazer conjuntos que possibilitem uma comunicação (mais) positiva; abordar-se temas que a rotina engole e não permite aprofundar no bulício do dia a dia; saborear esse tempo, o tempo das refeições sem tempo, que entram pelas noites quentes de verão. Fazer atividades em conjunto, estimular a cumplicidade. O tempo em família é também o tempo que permite (re)visitar familiares mais distantes, ou amigos que já se tornaram, tantas vezes, família; regressar ao passado, às origens, ouvir estórias que muitas vezes só voltam a ser revisitadas e contadas mais tarde, passando-as, assim, de geração em geração.
O verão é também sinónimo de frustração. É hoje comum encontrarmos adolescentes que não sabem lidar com os silêncios, ou com momentos sem estimulação.
O verão é também sinónimo de frustração. É hoje comum encontrarmos adolescentes que não sabem lidar com os silêncios, ou com momentos sem estimulação. Aborrecer-se é, assim, algo que parece impensável e ao mesmo tempo assustador, mas que se torna fundamental para um crescimento saudável. Num período em que os adolescentes estão permanentemente ligados a um telemóvel ou outro dispositivo, importa criar momentos de “shut down” ou “standby”. De que forma podemos estimular nos adolescentes um tempo de contemplação – tantas vezes confundido com aborrecimento – que estimule uma maior capacidade de reflexão sobre si e sobre o mundo? Asch, psicólogo social do século XX, usou o termo sonambulismo social para definir a passividade do ser humano, que limita o seu repertório comportamental e que nos faz agir apenas por imitação. Importa criarmos novas gerações pensantes ou que apenas se cingem à imitação hoje em dia tão reforçada pelo peso das redes sociais?
O verão deve ser também sinónimo de supervisão. Pensando novamente nos adolescentes e na adolescência – período fulcral para o desenvolvimento da autonomia e da identidade, em que os pares ganham maior peso (ou peso total) –, deverá a supervisão fazer parte da educação? Margarida Gaspar de Matos, psicóloga e coordenadora de vários projetos na área da saúde mental, escreveu em tempos que os adolescentes precisam de espaço para aprender a crescer com autonomia, mas com regras e monitorização. A palavra liberdade deve estar associada a responsabilidade, mas os cuidadores não se podem, em meu entender, desresponsabilizar neste processo. O verão traz consigo excessos.
Num período em que os adolescentes estão mais expostos a comportamentos de risco, não podemos esquecer que neurologicamente, estando o seu sistema límbico (sistema associado à componente emocional e relacional) mas ativo, o córtex frontal, que regula o comportamento, encontra-se, ainda, em maturação. A supervisão parental requerer tempo, atenção e esforço por parte dos cuidadores, mas tem um papel protetor no desenvolvimento saudável dos adolescentes. O desafio é encontrar o equilíbrio entre supervisão e autonomia. A supervisão é estar presente: amar, regular e estruturar, colocar limites. Alertar para os riscos dos comportamentos de risco, ser consistente nas regras, saber dizer que “não”, debater, negociar, envolver os adolescentes nos processos de decisão. É também apoiar, ouvir, reconfortar. Supervisão é, assim, também afeto.
Educação rima, assim, com verão, tempo privilegiado para as aprendizagens em contextos informais, tão importantes para um desenvolvimento completo; tempo de partilhas e de criação de memórias coletivas; tempo sem tempo, sem pressa; tempo para refrescar, fazer “reset”, ganhar novo folego para um novo ano letivo que se avizinha. Bons mergulhos, caro leitor!
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.