Dignidade e/ou direitos?

A escola não pode, no entanto, ser, em meu entender, palco de ações de protesto. Apesar do direito à greve, depois dos desafios provocados pela pandemia na aquisição das aprendizagens básicas, as crianças e jovens têm direito à educação.

As Nações Unidas declararam esta década na qual nos encontramos (2020-2030), como a “década da ação”.  São 17 os objetivos e metas comuns dos Estados-Membros das Nações Unidas para um mundo mais justo e sustentável, também designados como Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável (ODS). Um desses Objetivos consiste em possibilitar uma Educação de qualidade (Objetivo 4) às crianças e jovens de todo o mundo. Ora, de acordo com a UNESCO (2016, p. 30), este objetivo só é conseguido se “existirem professores com boas qualificações, com uma remuneração adequada e motivados”. Esta afirmação apresenta-nos, no entanto, um conjunto de desafios e reflexões.

Globalmente, são várias as motivações para o trabalho que a literatura tem identificado: a superação, enquanto motivação pessoal para alcançar sempre uma melhor performance; a possibilidade de crescimento/promoção; o poder; a remuneração; a segurança; e a valorização social, são algumas delas.

No que aos professores diz respeito, alguns estudos recentes que analisam esta questão, um pouco por todo o mundo, em países mais e menos desenvolvidos, têm mostrado que os salários dos professores não têm acompanhado o salário de outras profissões, nem tão pouco as oportunidades de crescimento profissional. O prestígio da profissão tem também decaído. A violência nas escolas ou o aumento do rácio alunos-professor, associado a uma deterioração das condições de trabalho, são também apontados como fatores que têm minado a motivação dos professores. Sem motivação, cresce o absentismo e também os problemas de saúde mental, que se viram agravados, também nos professores, com a pandemia.

O prestígio da profissão tem também decaído. A violência nas escolas ou o aumento do rácio alunos-professor, associado a uma deterioração das condições de trabalho, são também apontados como fatores que têm minado a motivação dos professores. Sem motivação, cresce o absentismo e também os problemas de saúde mental, que se viram agravados, também nos professores, com a pandemia.

O último estudo (TALIS, Teachers and School Leaders as Lifelong Learners) da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE, 2019), indica que a principal motivação de 9 em cada 10 professores consiste em ter um papel crucial no desenvolvimento das crianças e jovens e em contribuir para o desenvolvimento das sociedades. Este mesmo estudo salienta, no entanto, que os professores enfrentam um conjunto de exigências diversas e que implicam uma boa capacidade de gestão de diferentes tarefas (multitasking), nem sempre conseguida: responder a tarefas burocráticas parece ocupar cerca de 22% do tempo; do restante tempo, o professor deve saber ensinar, socorrer-se das melhores estratégias pedagógicas, considerando a heterogeneidade dos seus alunos, quer em termos dos seus backgrounds, quer em termos das suas necessidades específicas; ser inclusivo e entusiasta no modo como ensina diariamente; as exigências são muitas num mundo complexo, global e em constante mudança, onde o papel do ensino necessita de um dinamismo constante, de inovação tecnológica, para a qual os professores – cada vez mais velhos – não se têm mostrado preparados, não obstante considerem este aspeto fundamental.

Mas, porque importa pensar a motivação dos professores? Porque, toda a investigação nos diz que a sua motivação é preditora da aprendizagem dos alunos e alunas. Garantir o direito de acesso a uma educação de qualidade (ODS) é olhar para esta questão de uma forma sistémica. Importa criar medidas concretas que promovam uma maior motivação nos professores.

A escola não pode, no entanto, ser, em meu entender, palco de ações de protesto. Apesar do direito à greve, depois dos desafios provocados pela pandemia na aquisição das aprendizagens básicas, as crianças e jovens têm direito à educação. O superior interesse da criança, tal como explicitado na Convenção dos Direitos da Criança, deve ser salvaguardado. Interromper a progressão escolar das crianças e jovens é agravar as desigualdades que já se fazem sentir desde a pandemia. Quebrar as rotinas dos processos de ensino-aprendizagem é também desmotivar as crianças e jovens, colocar em causa o seu envolvimento, sendo que o envolvimento é também preditor de sucesso na escola. A dignidade laboral não pode, assim, suprimir o direito à educação (Artigo 28º).

 

 

Fotografia de: Ana Mendes – Flickr Esquerda.net

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.