Queridos organizadores da Jornada Mundial da Juventude (JMJ) de 2023,
venho pedir-vos que esta jornada opte preferencialmente pelos jovens pobres.
Pelos jovens residentes em territórios periféricos.
Pelos jovens doentes.
Pelos jovens presos.
Pelos jovens institucionalizados.
Pelos jovens precários.
Pelos jovens imigrantes.
Pelos jovens dos PALOP.
Pelos jovens sem abrigo.
Pelos jovens de outras religiões ou confissões cristãs.
Pelos jovens de minorias étnicas.
Pelos jovens de minorias afetivas.
Pelos jovens que vivam ou tenham vivido experiências de dependências químicas.
Pelos jovens que vivam ou tenham vivido experiências de prostituição e tráfico humano.
O facto de estes jovens não fazerem parte dos quotidianos daqueles que se dedicam diretamente à pastoral não quer dizer que não existam. O facto de não estarem enquadrados eclesialmente também não quer dizer que não tenham uma relação com Jesus e que esta não mereça ser partilhada e aprofundada. O problema talvez esteja precisamente nesses quotidianos que urge reinventar. Que estes jovens não sejam apenas destinatários mas protagonistas da JMJ 2023. Que oiçamos o que têm para dizer mesmo nas irregularidades dos seus discursos e percursos.
Esta jornada é uma oportunidade para a pastoral juvenil portuguesa se repensar e refazer. Nesse sentido, que não seja a cereja no topo do bolo mas uma nova receita do bolo.
A natureza missionária e a universalidade são características assinaladas como próprias do catolicismo português (leia-se, por exemplo, a homilia do papa Bento XVI no Terreiro do Paço em maio de 2010). Que se suscite, então, uma dinâmica missionária que passe por formas novas de chegar a estas juventudes à deriva, usando de criatividade pastoral e da «fantasia da caridade» (João Paulo II). Que exista uma disponibilidade de fundo capaz de galgar estereótipos e de ir ao encontro de estranhas formas de vida.
Peço-vos, porém para não absolutizarem as redes de jovens católicos que já existem. Que nos levantemos e partamos apressadamente ao encontro de juventudes periféricas.
Possivelmente, o envolvimento destes jovens não será feito de modo massivo, mas por via de pequenas iniciativas realizadas de forma intensiva, com acompanhamento fiel e paciente de pequenos grupos de jovens que habitam nestas periferias territoriais ou existenciais. Por outro lado, implicará um investimento de natureza pastoral mas também financeira. Porque não investir-se numa angariação de fundos para envolver estes jovens, até para criar modos de empregabilidade dentro do âmbito da JMJ 2023, para criar projetos artísticos integradores em vista a serem apresentados no âmbito da jornada ou para possibilitar a participação de jovens dos vários países da lusofonia? Por outro lado, seria tão positivo escutarem-se tantos cristãos que durante anos se têm dedicado ao acompanhamento de grupos de jovens, sobretudos nestes contextos de margem.
A JMJ realizada em Portugal ocorrerá num momento de convalescença da Humanidade. Que tenhamos coragem de falar de Jesus não como o padrinho dos sucessos da vida; que declinemos a profundidade do Seu mistério em todas as modalidades do sofrimento humano e, em particular, das vulnerabilidades juvenis atuais.
Este texto procura apenas ser um terno e fraterno lembrete, tendo eu amigos envolvidos na dinamização preparatória desta Jornada. Sei que o vosso coração é atravessado por muitos sonhos em relação à grande aventura da JMJ 2023. Peço-vos, porém para não absolutizarem as redes de jovens católicos que já existem. Que nos levantemos e partamos apressadamente ao encontro de juventudes periféricas.
Fotografia: JMJ Panamá 2019
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.