A que sabe a escola?

O segredo reside, assim, em encontrar os ingredientes que permitem criar as condições para a cooperação entre alunos diversos, com necessidades distintas, com conhecimentos prévios diferentes e com motivações variadas.

A escola sabe a chocolate amargo quando se assiste a bullying no recreio ou a cyberbullying nas redes sociais.

O mês Europeu da Cibersegurança e da Prevenção do combate ao bullying, que termina agora, em outubro, vem uma vez mais alertar-nos para a importância de darmos a conhecer bem estas problemáticas. Desta forma, e de uma forma mais lata, importa capacitar os jovens no sentido de os ajudar a compreender como os processos de violência e agressão funcionam por forma a antecipar ou terminar mais rapidamente a sua eventual ocorrência.

O PREVINT é um projeto da UTAD (Universidade de Trás os Montes e Alto Douro) que procura precisamente explicitar a jovens entre os 12 e os 18 anos, os fenómenos de violência, tantas vezes mascarados em papéis de género que persistem ainda na Geração Z. A violência psicológica, em concreto, é a mais difícil de identificar e muitas vezes os comportamentos a ela associada encontram-se normalizados entre os mais novos. O ciúme, como forma de amor, associado tantas vezes à ameaça, continua a ser, provavelmente, um dos mais comuns. Neste projeto, já disseminado em muitas escolas do nosso país, esta explicitação é feita com recurso ao “Violentómetro”, um material gráfico e didático em forma de régua, que permite ajudar a identificar e posteriormente trabalhar com a população à qual se destina, manifestações de violência, não só explícitas, mas também implícitas.

Mas, e a que sabe mais a escola? “A escola”, diz Maria, de 13 anos, “tem talvez um sabor agridoce: A escola é doce, quando aprendo com gosto, quando o professor me faz perceber que posso superar-me e ir mais longe”; uma palavra apenas é a chave da receita: “boa”, “conseguiste”, “é bom estar aqui convosco”. Mas a escola pode também tornar-se palco de stress e ansiedade, quando o foco se reduz à nota e ao mérito exclusivamente académico, e quando aprender é sinónimo de ouvir, sem o foco numa aprendizagem vivencial, numa lógica centrada exclusivamente no professor.

«A escola», diz Maria, de 13 anos, «tem talvez um sabor agridoce: A escola é doce, quando aprendo com gosto, quando o professor me faz perceber que posso superar-me e ir mais longe»; Mas pode também tornar-se palco de stress e ansiedade

A escola pode ter, na verdade, sabor a mel, quando é permitido voar, colher o néctar, aprender a pensar, conhecer o significado das palavras criar, testar ideias, inovar. A Escola da Ponte continua a ser uma referência nacional, pelo seu projeto educativo bem sustentado, monitorizado e ajustado às necessidades das crianças e jovens: a escola é pensada pelos jovens, com os jovens, em diálogo permanente com a comunidade onde se localiza, numa lógica colaborativa, procurando contrariar o conceito de grupos homogéneos e a ideia de o sucesso estar associado a estes. O segredo reside, assim, em encontrar os ingredientes que permitem criar as condições para a cooperação entre alunos diversos, com necessidades distintas, com conhecimentos prévios diferentes e com motivações variadas. É nesta palete de diversidade que importa apostar e criar sinergias, onde “ninguém pode ficar para trás”.

Mas, nesta altura, o leitor perguntar-se-á se este título teve por base o livro de Michael Grejniec “A que sabe a Lua?”. Claro que sim. Esta história, faz-nos precisamente pensar em quão importante é cooperar, nos pequenos gestos do quotidiano, mas também na condução e realização de iniciativas conjuntas. Ou em perceber que uma ideia de um só, pode ser afinal, uma ideia conjunta, pincelada com diferentes cores, matizadas. Esta história faz-nos também refletir sobre o facto de, não obstante a escola poder “saber” ao que cada criança ou jovem quer que ela saiba, importa que a escola possa ser “saboreada”. Vivenciar a escola significa que dentro dela são criadas, por excelência, oportunidades para um desenvolvimento integral de cada criança ou jovem, numa lógica inclusiva e construtiva, procurando-se que esta experiência não tenha apenas impactos positivos em cada indivíduo, mas nas suas comunidades, fomentando-se a criação de uma sociedade mais justa e inclusiva.

O plano governamental 21/23 Escola + apresenta-se como ambicioso, espelhando, em boa verdade, a vontade de colocar em prática algumas destas inquietações. Importa agora apurar sabores, escrever receitas de sucesso e disseminá-las, de forma a ser possível a sua replicação.

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.