15 Mai 2023 | Notícia
Antes de começar por explicar qualquer coisa, ou escrever sobre este tema, vamos tentar perceber o que é um campo. Melhor, o que é um campo de Gambozinos?
Como a maioria dos leitores deste jornal deve saber, os Gambozinos são uma associação juvenil sem fins lucrativos etc. etc. etc.… A grande questão que se põe é: mas porque é que os Gambozinos, que aos olhos da sociedade são tão distintos entre si, se inscrevem todos os anos nos campos de verão?
Para se obter este impacto na vida dos Gambozinos, sejam eles animados ou animadores, é preciso muita preparação e dedicação. Muita oração e (bom) tempo dedicado ao essencial, porque “uma só coisa é necessária”.
Podemos encontrar todas estas exigências na preparação de um campo de verão. Tudo começa num fim-de-semana.
O fim-de-semana começa por juntar os quatro elementos da direção (Diretor, Diretor-Adjunto, Mamã e Padre) e treze animadores. Todos eles de núcleos distintos. É logo nesta pequena grande diferença que se começa a viver e a sonhar um campo. Aliás, se fossem todos melhores amigos e do mesmo núcleo, não resultava. Esta é a primeira magia e o primeiro passo do campo: conhecer e partilhar a nossa vida com um “desconhecido”. Só assim, conhecendo-nos e conhecendo quem está ao nosso lado, é possível começar a juntar peças. É na diferença que está a inovação.
No decorrer dos dias, são nos propostas várias tarefas. Uma das primeiras é o Plano de Campo. Plano de Campo… a dor de cabeça que isso dá! Este tem muitas regras base que, sem elas, seria apenas um conjunto de jogos sem sentido, com algumas refeições, banhos no meio e, por acaso, falar-se-ia de Jesus lá por volta das 10h00. NÃO! É no Plano de Campo que se começa a rezar o campo. Começa-se por falar das idades que vão fazer o campo, de seguida adapta-se o tema dos BDS’s à idade, divide-se esses temas pelos dias e, por fim, inicia-se a logística do plano de campo.
Agora sim, a dor de cabeça chega! Planear dez dias de campo, tendo por base tudo o que foi discutido nos pontos anteriores. Que comece o brainstorming de possíveis imaginários! Definindo o imaginário, passo seguinte é preencher os espaços designados para os jogos, com jogos novos, jogos criativos e jogos clássicos (Tens Mira e Assalto ao Castelo são os clássicos que não podem faltar no Plano de Campo).
Preparar um campo requer muita dinâmica. Muita disponibilidade, acima de tudo. O ideal seria ficar tudo perfeito e feito naqueles três dias de fim-de-semana, mas por vezes não é possível e temos de levar trabalho para casa. Aqui, a correria do dia-a-dia impede-nos de parar e de focar no essencial. Mesmo tendo tudo feito e fichas de jogo entregues, é muito importante não esquecer e ir rezando o campo, cada animado, cada animador, cada jogo, a gamboliga, entre muitas outras coisas, para se chegar ao campo focado no que de verdade importa.
Para quem está a ler, parece fácil. Para quem já experienciou, sabe que não…. Mas isso é ótimo! Entregar o nosso tempo a estes animados e a preparar um campo, é, por outras palavras, dedicar e oferecer este tempo a Jesus! É por Ele que o fazemos, é por Ele que choramos e é por Ele que no final sentimos a Alegria (no seu verdadeiro sentido) através dos animados.
Saber que um campo pode transformar um gambozino (sim, basta um), já valeu todos os dias, todas as horas, todos os minutos, segundos, milésimos de segundo, e muito mais… porquê esta conclusão? Porque sim, porque só isso é necessário!
Zé Matos
15 Mai 2023 | Notícia
Viver, Pressa, Crescer.
Como viver sem pressa?… Viver para crescer…ou crescer para viver?
Algumas perguntas que nos vão ocupando o pensamento e, à medida que ficamos mais velhos, com maior frequência surgem, porque não deixamos de viver e muito menos de crescer.
No mês de abril iniciei a minha carreira profissional e não estava à espera de um impacto tão grande. E o grande desafio – de iniciarmos funções onde tudo é novo – deixa-nos desamparados, porque sentimos que não estamos a ter controlo sobre nenhuma tarefa ou assunto e, por mais que queiramos à força uma independência em relação aos nossos superiores, somos limitados em conhecimento e experiências. Achava eu que poderia executar ao ritmo do crescimento da vinha, da batata, da amêndoa ou da azeitona – a seu ritmo e a depender do clima.
Quando sentimos que não estamos a ter controlo sobre as nossas funções, surgem frustrações e precisamos de nos vigiar para identificarmos sinais. Até que nos lembramos da frase mágica: “não nascemos ensinados”. E quando tomamos consciência desta máxima, tomamos também consciência de que ninguém espera que saibamos tudo logo à partida e, muito menos, que consigamos executá-las sozinhos e de forma perfeita. Ao que parece, neste processo estamos a crescer. E tudo isto é vida!
Finalmente, a primeira questão torna-se premissa: é urgente vivermos sem pressa. A pressa é consciente, mas não racional. A consciência de que temos muito para fazer é importante, mas torna-se irracional quando julgamos que temos de fazer tudo no momento. Pára, respira, vai por passos! Torna-te consciente das tarefas que tens para fazer – e também da forma como vais aprender a executá-las – e vai calmamente realizando cada uma. Isto é planear.
Nestes 24 anos de vida, aprendi que que devemos priorizar o brio e a qualidade, não a quantidade. E o brio exige imediatamente que vivamos sem pressa.
Num campo de Gambozinos como animadora, tive de preparar um peddy paper pela cidade de Tomar com outras duas animadoras. Preparámos o jogo à distância da cidade e ainda a alguns meses do campo. Eu era quem conhecia melhor a cidade e acreditava que a atividade estava bem preparada. Poucas horas antes do jogo começar, fui colocar as pistas nos diferentes locais da cidade, juntamente com a equipa de preparação e o meu irmão. Nesse momento entrei em pânico, pois apercebi-me de que o jogo não estava bem pensado e que teria merecido mais dedicação, brio e planeamento… e ainda recebi um sermão do meu irmão! Acabámos por conseguir adaptar o jogo sem que os Gambozinos se apercebessem. Aprendi que, se não temos a certeza de que a tarefa está controlada, então é preciso dedicar mais tempo e planear bem… sem pressa! Serviu-me para a vida e cresci muito! Ainda hoje utilizo este exemplo como premissa para muitos trabalhos e tarefas que tenho de planear.
Afinal vivemos para crescer! Pela mesma e simples razão de que “só falha quem tenta”, só cresce quem vive, pois primeiro estamos cá para viver e, com as experiências, crescemos.
Maria Mina
15 Mai 2023 | Notícia
O sentinela permanece vigilante no cimo das ameias do castelo, atento ao horizonte, para quando vir o inimigo aproximar-se, alertar as tropas para defenderem o seu castelo; o guarda-noturno faz rondas durante a noite vigiando o local que está à sua responsabilidade e, quando vê chegar o ladrão, avisa as autoridades; o segurança vigia a loja, atento a quem vem para roubar e quando vê alguém a sair sem pagar, alerta a polícia.
Jesus convida-nos a vigiar o nosso coração, o nosso interior. Há muitas tentações na nossa vida que nos querem “assaltar”, roubando-nos a paz, a alegria, a serenidade. Frequentemente, isso acontece sem nos darmos conta. A tentação de nos desviarmos do caminho de Deus e do amor vem ter connosco de muitas formas: conforto, prazer, comodismo, egoísmo… Somos tentados e atraídos para o que nos apetece, o que brilha, o que sabe bem. Num primeiro momento, até parece atrativo e interessante. Santo Inácio fala na “tentação com aparência de bem”. Mas depois, quando já nos desviámos, ficamos tristes e desanimados.
A oração é o melhor vigilante, guarda-noturno e segurança do nosso coração! Mantém-nos ligados a Deus e ao Evangelho, mantém-nos alerta para tudo aquilo que vem disfarçado de bem, mas, na realidade, nos vai fazer mal. Jesus convida-nos a orar sempre, todos os dias, para protegermos o castelo do nosso interior e estarmos sempre atentos às escolhas diárias que fazemos. O Exame de consciência, no final do dia, é uma ótima forma de vigilância. Conserva-nos firmes nos critérios de Deus, alinhados com a moral cristã, na felicidade maior que Jesus nos propõe: “Amai-vos uns aos outros, como Eu vos amei”. Só uma vida por amor é garantia da paz profunda do coração. E essa paz tem de ser protegida e defendida diariamente.
Lourenço Eiró, sj
13 Abr 2023 | Testemunhos de animadores
Em Abril, os Gambozinos viveram o seu tradicional Minicampo.
Um Minicampo são (apenas) 4 dias de campo, na semana antes da Páscoa, onde aproveitamos as férias para rever os nossos amigos, preparar a Páscoa e reavivar o nosso espírito gambozínico.
Ao contrário de um campo de Verão, onde costuma haver uma suave transição do relax das férias para a simplicidade de um campo, no Minicampo, o desafio é sobreviver a uma “aterragem forçada”. Somos, súbita e violentamente, projetados do nosso dia-a-dia para a realidade, tão distante, de um campo de Gambozinos.
Pimbas!
Entramos no autocarro, à pressa e ainda com a mochila da escola nas costas, cansados, confusos, apercebendo-nos que nem trouxemos metade das coisas que era suposto – …as meias… não trouxe meias!
Há pouco tempo para nos adaptarmos, mas lá aterramos.
O dia neste Minicampo é bastante parecido com o de um campo de Verão, só faltando as tendas, que, por medo da chuva, trocamos por um local mais resguardado, e as latrinas que, para alegria de muitos, não marcam presença neste modelo de campo. Quem nunca esteve num Minicampo provavelmente imagina que se trata de um campo mais curto, de um pequeno campo, mas não se deixem enganar pelo nome – o Minicampo não é só um campo em ponto pequeno. É, sim, uma atividade diferente, uma que é muito especial – por várias razões:
Uma coisa que distingue o Minicampo de um campo de Verão – e que é grande parte do que o faz “simples” -, é a familiaridade que se sente: o estar lado a lado com gambozinos de todas as idades. Apesar do campo ser “mini”, há gambozinos de todas as idades e tamanhos – minis, médios e crescidos. Cabe a cada um, durantes estes dias, cuidar dos seus “novos irmãos mais novos” e aprender com os “novos irmãos mais velhos” que temporariamente ganhou. É o único campo em que isto acontece.
Outra coisa, a mais curiosa, talvez, é que, apesar de ser o campo com menos tempo, nem por isso o pouco tempo que temos é gasto a correr. Os quatro dias são vividos na maior tranquilidade e simplicidade possível – que é, afinal de contas, a única boa forma de os aproveitar verdadeiramente. A simplicidade é a chave para um ótimo Minicampo. Contrasta com a complexidade do nosso dia a dia e permite-nos ajudar a centrar e entrar no período Pascal. Essa simplicidade também é o centro de um campo de Verão, claro, com a diferença de que, enquanto no Verão ela surge naturalmente, no Minicampo é um verdadeiro desafio alcançá-la, porque o tempo é escasso e não houve um “período de adaptação” entre a violência do mundo real e a realidade do campo.
É certo que o Minicampo é mini (…óbvio), mas não é como aqueles mini-croquetes que só servem para nos abrir o apetite e deixar com mais fome. É uma realidade de campo distinta: uma oportunidade própria para viver o tempo da Páscoa e sentir a antecipação da Paixão na unidade e simplicidade que melhor nos ajudam a entendê-la verdadeiramente.
As famílias passam juntas a Páscoa. Os Gambozinos vivem juntos a sua antecipação. Vivem-na na amizade, diversão, oração, desprendimento e alegria com que passam aqueles quatro dias de Minicampo.
Miguel Santos
13 Abr 2023 | Testemunhos de animadores
Olá, eu sou o António e foi me pedido que escrevesse um texto com o tema: Ser Gambozino no dia a dia. Pedido esse que não foi nada fácil de aceitar, tendo dado por mim a pensar: “Há com certeza alguém que saberá explicar isto muito melhor do que eu”, “Eu nem sequer estou assim há tanto tempo nos Gambozinos”, “E se ninguém se identificar com o que eu escrever”. Parei, respirei e aceitei este pedido que me foi feito. E nesse momento do meu dia, senti-me um pouco mais gambozino.
Queria começar por lamentar, desde já, não se tratar de um tutorial passo a passo, que todos ansiávamos e precisávamos, de como: Ser um Gambozino no dia a dia. Aquilo que estão prestes a ler não é mais do que a minha ideia acerca da maneira de ser e estar enquanto Gambozino e de que forma e em que alturas a podemos incorporar no nosso quotidiano.
Ora, a maneira mais fácil de ser Gambozino no dia a dia, passa muito por descomplicar as nossas vidas (dentro do possível) e voltar à simplicidade. A simplicidade com que Jesus viveu, a simplicidade em que os santos, que nos inspiram, viveram e a simplicidade que buscamos viver nos campos e atividades. No fundo tentar estar na nossa vida como estamos, ou pelo menos como deveríamos estar num campo, não no sentido de acordar a nossa família e vizinhos com o “Acorda o Sol”, ou de comer massa pizza dia sim dia não, mas no sentido em que procuramos viver os quatro pilares que guiam esta associação, pois é a simplicidade destes elementos que constrói a beleza e a força dos Gambozinos. Estive agora no Minicampo do Sul (foi muito bom) e reparei em vários aspetos e comportamentos que eu e outros animadores adotámos, durante esses cinco dias, que seriam com certeza uma mais-valia para o meu, e quem sabe também para o teu, dia a dia. Como por exemplo: ter o olhar afinado para perceber o que querem e necessitam aqueles que me rodeiam, ter sempre presente o contacto com a natureza, estar disponível para aquilo a que sou chamado, em momentos de maior cansaço ou inquietação saber “animar-me”, compreender os meus limites e deixar-me ser ajudado. Tudo isto são comportamentos e maneiras de pensar e agir que, com mais ou menos esforço, conseguimos incorporar e adaptar para a nossa vida. Talvez à primeira vista possa parecer pouco, mas a verdade é que a diferença reside nos detalhes.
Um dos momentos do Raio que guardo na memória, foi quando à pergunta: “Achas que podes mudar o mundo?” A resposta foi: Sim. Um sim geral (pelo menos aqueles que estavam no meu campo de visão periférico, deram um passo à frente). E aproveitando este ímpeto e vontade que todos temos de viver e de fazer algo maior do que nós mesmos, a proposta que deixo vai mesmo nesse sentido: Tentar incorporar ao máximo aqueles pequenos comportamentos e atitudes que temos nos campos e nas atividades na nossa vida, em qualquer que seja o percurso pelo qual seguimos ou fase que nos encontremos, sem nunca perder esta nossa vontade, tão boa, de mudar o mundo (para melhor, espero eu).
António Lima
13 Abr 2023 | Testemunhos de animadores
Que bom que seria um campo onde os animadores não estão sempre a correr de um lado para o outro, nem preocupados com planos de campo preenchidos que não deixam espaço para respirar. Que bom que seria um campo onde não estivéssemos sempre cansados e houvesse tempo e espaço para cada coisa, onde pudéssemos estar atentos às coisas simples e deixarmo-nos alegrar verdadeiramente com elas!
Há uns anos contaram-me como eram os primeiros campos de férias da Companhia: 5 ou 6 animadores iam com algumas crianças para um terreno com muito pouca coisa planeada. Naqueles dias conversava-se, aprendia-se a tocar viola, rezava-se, cozinhava-se, tomava-se banho no rio… Ali, tinham o tempo e a calma necessários para criar relações verdadeiras e fundadas na rocha.
Tenho-me deixado tocar por este tema da simplicidade e de como é importante voltar um bocadinho às origens.
Os Campos de Gambozinos são uma incrível graça na vida de tanta gente e fazem maravilhas muito grandes, mas acabamos sempre por cair na mesma lógica apressada do dia a dia e isto impede-nos de estarmos inteiros e de conseguir saborear os pequeninos milagres que vão acontecendo.
A estrutura de uma associação é fundamental para que possa crescer e gerar cada vez mais frutos. Mas nunca podemos cair na tentação de ficarmos demasiado presos aos horários, aos planos, ao dinheiro, às logísticas, aos jogos complicados. São tudo coisas importantes, mas quando descentradas do Essencial, acabam por ser impedimento à Ação de Deus.
Estes 10 dias devem ser, em primeiro lugar, espaço de relações. De construir amizades. De aprender a viver na simplicidade. Meio onde percebo como é possível necessitar de pouco e viver muito e onde experiencio a felicidade que vem desta certeza.
Tudo pode mudar, mas o Centro dos Gambozinos nunca pode deixar de ser as relações!
Lanço este desafio para cada um, em especial agora que começamos a sonhar os campos do Verão. Qual a prioridade do plano de campo do campo que vou animar? Ajudar crianças a passar tempo e dar-lhes entretenimento momentâneo? Ou criar relações verdadeiras, com os outros e com Jesus, que os ajudam a serem felizes?
Que nos campos de 2023 não caímos na tentação de viver em contrarrelógio e nos deixemos maravilhar por todos os lugares e momentos onde Jesus se vai revelando!
Teresinha Castel-Branco
16 Mar 2023 | Testemunhos de animadores
Hoje, dia 13 de março, vivemos mais um dia do caminho da Esperança: da Quaresma até à Páscoa. É também o dia de rescaldo após o RAIO: Reunião de animadores interessados em ordenar-se.
Foram dias de grande consolação: de testemunho, amizade, unidade e comunidade; de (re)encontro de uma família tão bonita com várias gerações, com quem tanto tenho crescido e que afeta profundamente e transversalmente a minha vida e o meu olhar para as relações humanas. Isto porque os Gambozinos não é algo a que se “vai”, mas algo que se É ou se procura ser.
No entanto, na correria do dia a dia, há a tendência de se tornar algo que me é externo, como se fosse mais um compromisso na check list. Daí a importância deste fim de semana: foi um voltar à fonte; um reacender de uma missão que nasce e se alimenta da oração (caso contrário, pode cair num voluntarismo) e de um olhar diferente para a humanidade; o renovar de um SIM e o recentrar o coração no que de facto é necessário.
Mas, pessoalmente, foram também dias muito intensos. Não só por algumas preocupações com a preparação e concretização do fim de semana, mas também por dúvidas e incertezas que vieram ao de cima e que me inquietaram em alguns momentos de oração e em conversas importantes que foram surgindo com alguns gambozinos.
Uma imagem muito bonita destes dias foi precisamente uma que conheci na capela da CASA de Santo Afonso em Cernache (local do fim de semana). No retábulo tão colorido, eis que surge, no canto direito, um pedaço negro. No centro dessa escuridão, surgiu ainda uma esfera dourada luminosa: a “luz terna e suave no meio da noite”; aquela que, na incerteza, na dor, na tristeza, na solidão, no vazio, no pecado, “apaga a noite em mim”.
“É assim o coração de Deus: próximo de quem sofre; não faz desaparecer o mal e o sofrimento mas transforma-o habitando n’Ele”- Papa Francisco
Há uns anos uma amiga perguntou-me qual era o sentido do sofrimento, se Cristo já tinha sofrido tanto por nós? Os anos passaram, e hoje percebo que não é por sermos cristãos que a cruz, o sofrimento, a injustiça e as dúvidas, por muito que nos custem ou revoltem, não vão deixar de magicamente ser uma realidade nas nossas vidas e na dos outros.
Compreender isto é importante também para compreender a missão dos Gambozinos. Nas palavras de uma Gambozina Dinossaura, que agora faço minhas, não se trata de salvar ou mudar radicalmente vidas, isso seria um peso e uma frustração gigante. Será antes dar tempo e espaço para criar relações, construir pontes com outros irmãos iguais a mim, que como eu riem, choram, alegram-se e sofrem.
A cruz, seja ela qual for, é uma realidade muitas vezes demasiado dura para que alguma vez a possamos compreender. Podemos revoltar-nos, fugir dela, tornando-a ainda mais pesada…ou podemos rezar a mesma oração de Jesus no monte das Oliveiras e, num salto de fé no Pai, beber o cálice, abraçá-la, entregá-la por amor, tornando-a mais leve, a nossa e a dos outros, como Jesus se entregou na Sua por nós.
“No limiar da vida, não se trata do que ganhamos, mas o que demos: o dom de si mesmo, do serviço. Servir custa, porque significa gastar-se, consumir-se; mas, quem guarda demais a sua vida, perde-a”.
E que bonito saber que “há uma festa no céu” cada vez que ofereço a minha vida, que me coloco nas mãos d’Ele e aceito ser seu instrumento; cada vez que venço a minha autossuficiência e regresso à casa do Pai; cada dia em que Lhe entrego o meu sim, com tudo o que tenho e sou, simplificando-me.
Por muito que me sinta pequenina ou que me custe, Ele faz mesmo maravilhas com a vida de cada um e encarrega-se dos frutos muitas vezes imensuráveis e invisíveis aos nossos olhos.
A meu ver, é isto a Esperança! Não um otimismo vazio e irrealista de que vai correr tudo bem… Mas sim a certeza de que, mesmo quando tudo corre mal e nos deparamos com a Cruz e a incerteza do caminho a escolher/ para onde somos chamados, não estamos sozinhos.
Primeiro, porque Ele vive e vem sempre ao nosso encontro; e segundo, porque há por aí muito Simão de Cirene por aí disposto a partilhar e a tornar mais leve a nossa Cruz, e eu tenho a graça de lhes chamar, além de amigos e irmãos, Gambozinos.
Ana Lisete Miranda
16 Mar 2023 | Testemunhos de animadores
Quaresma, um tempo de mudança
Não é difícil encontrarmos esperança, ela está presente em tudo o que projetamos e de forma tão simples. Se escolho dar um passo, tenho esperança em avançar. Se decido seguir em frente, vivo na esperança de concretizar tudo o que ficou por fazer e todos os desafios que tenho pela frente.
Uma palavra tão impactante traz sentido a tanto e a tantos e pode, tão simplesmente, traduzir-se em: decidir, arriscar, ousar dar mais um passo.
Passo a passo construo um caminho, espero e anseio. É na esperança que assento as minhas decisões. E que caminho seguimos juntos agora? O da Quaresma, é verdade.
Não é difícil criar esta ilusão de que vivemos a Quaresma de forma esperançosa, exatamente por esta possibilidade de ver a esperança como algo que possa parecer “banal”. Este simples seguir em frente, não ficar por aqui. Sendo a Quaresma um tempo de espera e reflexão, não nos custa viver na ideia de que caminhamos porque acreditamos, porque temos em nós a esperança de viver a alegria da Ressurreição, de celebrar a vida, uma esperança que nunca esmorece. Mas muitas vezes estamos só parados à espera e não à procura de novos desafios para crescermos, com esperança, e de celebrarmos a vida em comunhão com Jesus, que nos abriu estes horizontes e nos faz acreditar que vale a pena termos esperança em algo mais, no Seu amor.
Cair nesta ilusão de caminho pode acabar por banalizar mais do que a própria esperança, pode banalizar a Quaresma. Não basta acreditar que Jesus renasce… Posso ver a esperança como a razão e o folgo para dar um passo, mas um passo pode ser muito mais que o levantar de um pé. Um passo é tantas vezes esforço, sacrifício, entrega e todas aquelas pequenas ou gigantes dúvidas que não nos queriam fazer levantá-lo logo de início.
A Quaresma representa o esforço exigido de quem vive na esperança, mas não uma esperança de quem está simplesmente à espera de que algo aconteça. Uma esperança que nos move, uma esperança que faz caminho para receber esta alegria! A esperança não pode ser confundida com um simples e banal prever o que vai acontecer. Acreditar que já sei o que está para vir não podia estar mais longe daquilo que a esperança nos faz sentir – mudança, sentido de seguir!
Não quero, por isso, viver do que as “quase certezas” me trazem, quero viver da incerteza que é a esperança. Tempo de Quaresma é tempo de mudança.
Inês Botelho
14 Fev 2023 | Testemunhos de Gambozinos e Famílias
Olhando para trás, parece que o nosso mundo não existiu sem os GBZ. A sério!
Mal nos lembramos de como era a nossa vida numa casa sem aplausos, sem “aqueles” cânticos, sem os relatos entusiásticos da loucura saudável trazida de uma “tarde fixe”, de um Mini-Campo ou de um campo de Verão. Sem o barulho saltitante das rodas gigantescas, onde sempre cabia mais um, e que enchiam todo o Largo de São João do Souto ou, mais tarde, a Praceta da Faculdade de Filosofia. Sem o afeto colocado nas histórias vividas com aquele outro gambozino, com uma experiência de vida completamente oposta e que muita riqueza traz às nossas vidas, certamente o principal dos tesouros recebidos. Sem a lembrança dos mimos da mamã, dos apelos do animador ou da condução do diretor. Sem o espanto provocado pelo conhecimento das perguntas feitas nos momentos culturais, para resolver a rir problemas que poderiam fazer miúdos chorar. Sem o desafio lançado no BDS e assumido com vontade, alegria e empenho, ou sem a partilha do lavar a louça ou das sornas feitas conversa, cantares ou simplesmente “pa’ estar”. Sem a ida até à “Ilha” ou assistir à “Super-produção”. Sem ter ido de Braga a Cascais sem outra razão que não participarmos, todos, no La Trina.
A sério! Quase não nos lembramos… Nós, que nunca estivemos numa “tarde fixe”, num Mini-Campo ou num campo de verão.
Porque ser Gambozino não é exclusivo dos nossos filhos. É algo que fomos, através deles, trazendo para o centro da nossa mesa, ali onde se cozinha o que de mais importante se vive em nossa casa. Por isso, é fácil para nós fazer desfilar nomes – muitos sem rosto, porque nunca os vimos, – jogos, novelas e imaginários, como se tivessem sido vividos na primeira pessoa. Tudo isso, para nós, se tornou familiar: parte da nossa casa e da nossa família.
É verdade que tudo nos chegou principalmente através dos nossos filhos e dos seus relatos entusiasmados. E deles pode sempre vir tanto ensinamento bom! Mas se no meio de tanto bem recebido tivermos algum mérito – para não dar todo o crédito à sorte – foi o de adotar tudo aquilo como nosso e o de nos permitir, mesmo já sem idade e “à revelia”, fazermo-nos também nós Gambozinos e darmos graças a Deus por isso. Porque numa casa em que todos o somos, há um monte de coisas que se tornam mais fáceis: principalmente a perceção que o mundo é injusto, mas que podemos fazer algo para que o seja menos; a constatação de que a diferença não é para esconder, mas sim para criar possibilidades de cada um ir mais longe, sendo fiel a si próprio, levando os outros nesse caminho de maior riqueza e diversidade; a certeza de que há um Deus que quer bem a cada um, com a sua história particular, carregada de incapacidades e dificuldades, mas também de alegrias e graça que é fundamental reconhecer; a confiança de que a natureza é a nossa casa, que nos acolhe e tudo nos dá, permitindo o descanso reparador e a harmonia silenciosa que nos calibra o corpo, a alma e os sentidos, e que por isso importa tratar com todo o cuidado e a pôr mãos à obra para construir um mundo de ecologia integral.
É assim que olhando para nós, família, percebemos que os Gambozinos foram e são uma parte importante do caminho que nos ajuda a definir e compreender, a cada um e em conjunto. E que olhamos à volta e vemos outras famílias como nós, que também são Gambozinos do primeiro ao último membro, com quem partilhamos este modo de olhar para o mundo. E, no meio de muita loucura e brincadeira, de uma alegria que reconhecemos vir do sítio certo, olhamos e vemos que tudo isto é muito bom.
Porque ser Gambozino é um assunto sério. A sério!
Catarina e Pedro
(Gambozinos adotivos)
14 Fev 2023 | Testemunhos de animadores
Criou o céu, a terra e o mar, criou o sol, a lua e as estrelas, criou as plantas, os animais e criou-nos a nós.
De certeza que podia ter continuado e criado grandes estradas que nos guiassem a cidades gigantes com enormes monumentos feitos para si.
No entanto viu como era belo o jardim e descansou.
Atualmente é difícil sequer imaginarmo-nos a viver nesta simplicidade. Vivemos apressadamente e de forma complicada, em selvas de betão, onde são raros os vestígios do jardim.
Pediu-nos para tomar conta dele e limitámo-nos a tomar conta de nós.
Sendo por isso, na minha opinião, o nosso pilar da Natureza cada vez mais relevante.
Nos campos de verão temos a oportunidade de deixar os telemóveis e tudo o que nos desliga do essencial para trás e, durante 10 curtos dias, viver a simplicidade e alegria de um contacto enorme com a Natureza.
Tomar banho num rio frio, caminhar sob o sol escaldante, dormir debaixo dum céu estrelado, rastejar na lama, comer numa roda simples e escutar a Sua palavra enquanto o pôr do sol se faz refletir no rio.
É nesta nossa réplica do jardim que conseguimos semear a missão dos Gambozinos, neste ambiente de simplicidade é fácil vermos as semelhanças que nos unem e criar amizades que não seriam evidentes lá fora.
E quando voltamos ao dia a dia, devemos tentar vivê-lo com o olhar renovado, parar e apreciar quem nos rodeia e o que nos rodeia. Sentir a Sua presença num passeio sozinho, num café com amigos, a ler encostado a uma árvore ou a ouvir música no autocarro, porque por mais difícil que por vezes seja encontrar vestígios do jardim, eles irão aparecer a quem os procura.
Vicente Lima