Dê-se um refúgio, não um inferno

Serviço Jesuíta aos Refugiados condena veementemente atrocidades que migrantes e refugiados vivem e apela à célere transferência de requerentes e beneficiários de asilo para Portugal ao abrigo do Acordo Bilateral, para que encontrem a paz.

Serviço Jesuíta aos Refugiados condena veementemente atrocidades que migrantes e refugiados vivem e apela à célere transferência de requerentes e beneficiários de asilo para Portugal ao abrigo do Acordo Bilateral, para que encontrem a paz.

As condições degradantes nos campos da Grécia já são vastamente conhecidas por todos. Mais de 56 000 pessoas aguardam uma resposta ao seu pedido de asilo em território grego, em condições humanas indignas e em absoluto estado de desespero. A Grécia já não é mais um porto de esperança. Já não é a porta para uma segunda oportunidade. É um muro que nos impede de ver e de ouvir as histórias que as pessoas trazem e o desespero que as acompanha. Milhares de pessoas aguardam uma resposta solidária e rápida da Europa, que não acontece, vivendo num clima de tensão e incerteza criada pela demora e inércia dos restantes Estados-Membros.

Perante a ausência de uma resposta europeia concertada à recolocação das pessoas em território grego pelo espaço comunitário, apelamos mais uma vez à efetividade do Acordo Bilateral assinado em março entre Portugal e a Grécia para a transferência de requerentes, que poderá revelar-se uma resposta célere a esta tragédia humanitária iminente. Ressalvamos que se tratam de famílias acompanhadas de menores e em situação de particular vulnerabilidade, que fogem de perseguições ou que procuram a Paz que o seu país não lhes consegue garantir.

Segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM), cerca de 13 mil pessoas abandonaram o território turco com destino à Grécia, em resultado da recente abertura das fronteiras turcas. No entanto, a Grécia recusa-se a abrir-lhes as suas portas, prometendo reforçar o controlo das fronteiras e recorrendo ao gás lacrimogéneo para repelir as centenas de famílias que tentam chegar à Europa através do seu território.

Manter um colchão seco depois da chuva, impedir os estragos causados pela lama, proteger os filhos dos escorpiões, dos ratos e das cobras é um problema que poucos, deste lado, conhecem. Porque não veem. Porque não querem ver.

Moria é governada pela desumanidade. Nada é certo, nem mesmo a comida ou a água. Perdem-se vidas em desacatos porque alguém passou à frente numa fila para ir à casa de banho, tal é a tensão vivida. As mulheres vão muitas vezes em grupos para terem alguma segurança ou refugiam-se na própria tenda, recorrendo muitas vezes ao uso de fraldas, por medo de saírem depois do por-do-sol. Manter um colchão seco depois da chuva, impedir os estragos causados pela lama, proteger os filhos dos escorpiões, dos ratos e das cobras é um problema que poucos, deste lado, conhecem. Porque não veem. Porque não querem ver.

Uma das primeiras medidas do novo governo grego foi a revogação do acesso ao sistema público de saúde a requerentes de asilo que chegam à Grécia – o que significa deixar 55 mil pessoas sem cuidados médicos. Muitas delas com traumas de guerra e violência. Muitas delas crianças.

Em janeiro deste ano, foi aprovado um decreto-lei que prevê a requisição de terrenos nas ilhas de Lesbos, Samos e Quios para a instalação de uma rede de novos campos em regime de detenção, em substituição dos campos de processamento e acolhimento de refugiados destas ilhas do Mar Egeu. Deixemo-nos de eufemismos: quando a resposta esperada demora anos, seja qual for a estrutura de acolhimento, tratam-se de autênticas prisões.

Na Grécia, não interessam os sonhos, não interessa o percurso que fazem, pois são muitos. E quando são muitos, deixam de ser pessoas e passam a ser números.

Na manifestação que aconteceu no início de fevereiro em Moria, centenas de migrantes e refugiados protestaram contra a lotação dos campos e contra a nova lei que restringe os direitos dos que chegam à Grécia. Num dos cartazes, lia-se “Chega de prisões para almas humanas no Norte do Egeu”.

O JRS condena veementemente as atrocidades que os migrantes e refugiados vivem e os direitos humanos que são negligenciados no pesadelo e vergonha em que se tornaram estas ilhas. Apela, pois, à célere transferência de requerentes e beneficiários de asilo para Portugal ao abrigo do Acordo Bilateral, para que encontrem em Portugal a Paz que procuram e que sejam finalmente tratados como pessoas, numa Europa que é solidária para com as atrocidades que enfrentam nos seus países de origem.

* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.