O P. Hans Zollner disse ontem que a Igreja tem de assumir os erros que cometeu no que diz respeito aos abusos sexuais cometidos no seio das suas instituições nas últimas décadas e pedir perdão às vítimas desses crimes. Numa intervenção que fez na conferência organizada pela Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais Contra as Crianças no seio da Igreja Católica em Portugal, o jesuíta alemão, que integra a Comissão Pontifícia para a Tutela dos Menores, reconheceu que os bispos e os provinciais das ordens religiosas têm tido dificuldade em assumir esta posição e disse nem sequer compreender a sua resistência que, acrescentou, tem muito pouco de racional. “Porque é que nós, que temos o sacramento da reconciliação, em que confessamos os nossos pecados (pessoais), não confessamos os nossos pecados institucionais?”, questionou, acrescentando que “na cultura católica há algo que, aparentemente, faz com que seja impossível dizer: admito que errei e assumo as minhas responsabilidades”.
No encontro que decorreu durante todo o dia de ontem na Fundação Calouste Gulbenkian, Zollner defendeu que o mesmo processo que leva um crente à confissão, e que passa por olhar a sua vida, arrepender-se, confessar-se e comprometer-se com uma reparação, devia ser seguido pela Igreja enquanto organização, a nível institucional. “Não acreditamos no perdão de Deus?”, questionou, acrescentando: “Precisamos que a Igreja admita, enquanto instituição, que cometeu erros”. O especialista em matéria de abusos sexuais afirmou ainda que esta atitude traria ao público a compreensão de que a Igreja fez o que tinha de ser feito. Hans Zollner lembrou ainda que a Igreja vive uma crise de confiança e considerou que “assumir os erros danifica menos a imagem da Igreja do que continuar a negar que eles existiram”.
“Porque é que nós, que temos o sacramento da reconciliação, em que confessamos os nossos pecados (pessoais), não confessamos os nossos pecados institucionais?”, questionou, acrescentando que “na cultura católica há algo que, aparentemente, faz com que seja impossível dizer: admito que errei e assumo as responsabilidades”.
Na sua intervenção, Hans Zollner afirmou ainda que o confronto com o tema dos abusos sexuais na Igreja exige um processo individual, um caminho que cada um tem que percorrer, e que todos os cristãos estão convocados para a missão da proteção dos menores. “Em todas as conferências episcopais e congregações há pessoas empenhadas e comprometidas em assumir o problema, e pessoas que continuam a negá-lo”, reconheceu, acrescentando, contudo, que esta é uma missão de todos, pois “todos podemos fazer algo para que as vítimas sejam apoiadas e acompanhadas”.
Ao relatar a experiência que foi obtendo ao percorrer mais de 70 países onde ocorreram abusos sexuais no seio da Igreja, assumiu que ele próprio tem aprendido muito nos últimos anos, e vindo a mudar algumas perceções sobre o problema e as soluções para o ultrapassar. Hans Zollner reconheceu, contudo, que a Igreja tem um duplo problema nesta matéria, pois, além de ter registado inúmeros abusos por parte de padres, não fez o que devia ter feito para proteger as crianças e afastar os abusadores. O jesuíta afirmou ainda que em todos os países onde já esteve a falar sobre este problema se verifica o mesmo padrão de comportamento por parte da Igreja, e a mesma dificuldade em admitir que algo correu mal.
Durante a sua intervenção, anterior à do P. Zollner, o presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, D. José Ornellas, apresentou um pedido de perdão às vítimas de abusos sexuais por parte de membros do clero ou em instituições eclesiais. “Quero reiterar o pedido de perdão, por toda a falta de atenção ao vosso sofrimento ou de prevenção das suas causas”, referiu o atual bispo de Leiria-Fátima.
Fotografia: Ricardo Perna
* Os jesuítas em Portugal assumem a gestão editorial do Ponto SJ, mas os textos de opinião vinculam apenas os seus autores.